Mais uma quarta-feira, mais um Webinar APM. Como tem sido comum, centenas de médicos prestigiaram, no último 22 de julho, mais uma edição dos seminários on-line da Associação Paulista de Medicina, transmitidos no canal da instituição no YouTube, que têm discutido a Covid-19 e suas repercussões nas mais diversas especialidades médicas. Desta vez, o tema foi “Diagnóstico e tratamento ambulatorial do paciente com Covid-19”.
Quem moderou o debate foi Adauto Castelo Filho, Professor Associado de Infectologia na Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM/Unifesp). “Estamos vivendo um momento delicado do ponto de vista da Saúde e da desinformação. Quiçá da desinformação. Então, vamos tentar trazer evidências que embasam nossa conduta. Acho que o encontro tem esse objetivo maior”, introduziu.
Guilherme Bricks ficou responsável pela primeira apresentação da noite. O doutor em Infectologia pela Unifesp iniciou a sua intervenção falando sobre a definição de pacientes suspeitos de terem sido infectados pelo coronavírus. “Vivemos um momento de alta incidência, temos que ter um alto nível de suspeita. O principal sintoma da Covid-19 é febre. Mais de 80% dos doentes têm. Depois é tosse, em mais de 60%. Geralmente ela é seca. Mas há outros sintomas mais ou menos comuns, como calafrios, dores no corpo, dispneia, fadiga e dor de garganta.”
O debatedor indicou que mais de 80% dos casos são considerados leves, sem necessidade de internação, normalmente assintomáticos ou com pequenas manifestações. A maioria dos casos, inclusive, se resolve espontaneamente em menos de uma semana. Alertou, porém, que a partir dos sete dias de sintomas, os pacientes podem progredir para formas moderadas, graves ou críticas.
“Quando a Covid-19 deixa de ser leve? Quando há dessaturação e quando ocorre a síndrome respiratória aguda grave (SRAG)”, explicou Bricks. Nesses casos, os pacientes devem ser internados para receber maior vigilância e suporte adicional. Sinais francos de desconforto respiratório ou piora nas condições clínicas de doença de base também são indicativos de piora no quadro.
O especialista da Unifesp, ao entrar nas estratégias de tratamento, ressaltou que – para os casos leves – o recomendado é isolamento domiciliar, repouso, eventualmente medicamentos sintomáticos para dor ou febre e constante vigilância com agravamento. “E o principal sinal de gravidade é mesmo a dessaturação. Nesse sentido, um oxímetro em casa pode ser muito benéfico.”
Bricks mencionou ainda que o momento é de muita discussão sobre as estratégias de tratamento, com possibilidades e níveis distintos de evidências. Antes de finalizar sua palestra, fez um apanhado dos principais medicamentos – como cloroquina, dexametasona, ivermectina, nitazoxanida, azitromicina etc. – e as pesquisas que os envolvem até agora.
Infecção na gestação
O segundo debatedor convidado foi Jorge Senise, médico da disciplina de Infectologia da EPM, que abordou como a Covid-19 se relaciona com as mulheres grávidas. O especialista começou mostrando que em São Paulo, em 22 de julho, na faixa etária considerada como “de gestantes” (de 20 a 39 anos), para mulheres quem não têm fatores de risco, a mortalidade não passa de 1,5%. E quando o estado considera as mortes com fator de risco, 0,1% foram de mulheres grávidas e 0,1% de puérperas.
Na sequência, abordou um estudo com dados do Ministério da Saúde, que acompanhou 978 gestantes com síndrome respiratória aguda, entre 26 de fevereiro e 18 de junho. Desse grupo, 207 foram encaminhadas à Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Entre este grupo, tratado intensivamente, 73 mulheres morreram. “Chama atenção que 18 mulheres não receberam nenhum suporte ventilatório. Isso é grave. É uma sensação ruim de tratamento não adequado. O resultado precisa ser bem avaliado para tentar entender o que houve.”
O infectologista também destacou uma pesquisa conduzida em Nova Iorque (Estados Unidos), que tratou de 241 gestantes infectadas em hospitais. Destas, 148 procuraram o serviço por motivos obstétricos e eram assintomáticas na admissão. “Durante a internação, 26,5% delas tiveram quadro leves, 26,1% evoluíram para severo e 5% para crítico. Do total, 17 foram à UTI e 9 foram entubadas – sem óbitos”, relatou.
Senise indicou que, nessa coorte, os quadros que foram mais graves eram de mulheres com índice de massa corporal (IMC) maior do que 30. “Também chamou atenção a evolução muito rápida da gravidade da infecção.”
Debate
Após as apresentações, houve espaço para perguntas da plateia, com participação, inclusive, do diretor Científico da APM, Álvaro Nagib Atallah. Foi ele, inclusive, quem mencionou um estudo recente em que há indicação de queda na incidência mundial de prematuridade a partir do momento que as sociedades passaram a adotar quarentenas e medidas de isolamento e distanciamento social.
O especialista no tema, Jorge Senise, indica que é provável que a quarentena tenha diminuído a infecção das pessoas em geral, que se encontram isoladas e em casa. A tendência, porém, é que o pós-quarentena reflita a realidade anterior. “Com mais pessoas na rua e mais vírus, teremos mais jovens infectados, provavelmente. Como ocorreu nos Estados Unidos após as manifestações [pelo assassinato] do George Floyd. Acho que irá aumentar as gestantes infectadas que podem ter mais prematuridade por conta da Covid-19.”
Antes do encerramento, o presidente da APM, José Luiz Gomes do Amaral, destacou a mais recente pesquisa conduzida pela Associação sobre a percepção dos médicos acerca do momento de crise que vivemos. “Observamos que ainda há um considerável número de colegas que não se sentem plenamente capacitados para tratar do doente com Covid-19 em todas as fases. É algo até certo ponto esperado, uma vez que nos segmentamos em diferentes especialidades”, comentou.
Ele ressaltou que a série de webinars que a instituição tem feito, inclusive, tem por objetivo qualificar os médicos, capacitando-os para que possam atender os doentes que os procuram nessas diferentes fases da infecção pelo novo coronavírus. “Também os pacientes que não estão afetados pela doença e procuram por outras questões, mas que invariavelmente vão lhes perguntar: ‘E em relação à Covid-19?’.”
“Portanto, sinto que o webinar de hoje contribuiu muito para que os médicos se sintam cada vez mais qualificados para enfrentar o momento. Temos, hoje, considerando-se plenamente qualificados quase 30% dos médicos, o que parece um progresso interessante a partir do que tínhamos registrado em abril. Temos que caminhar nessa direção. A pandemia não dá sinais de interrupção, temos um longo percurso pela frente e muito o que fazer por nossos pacientes”, concluiu Amaral.
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