Tertúlia Acadêmica: Como esta pandemia poderá ser lembrada daqui a 1.000 anos?

Nesta quarta-feira (10), a Tertúlia da Academia de Medicina de São Paulo voltou a ocorrer, de forma virtual, e teve Jairo Tabacow Hidal como palestrante

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Nesta quarta-feira (10), a Tertúlia da Academia de Medicina de São Paulo voltou a ocorrer, de forma virtual, e teve Jairo Tabacow Hidal como palestrante. Hidal já foi responsável pelo núcleo brasileiro do American College of Physicians e atualmente é médico assistente da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo. Ele falou sobre o tema “Como esta pandemia poderá ser lembrada daqui a 1.000 anos?” para os mais de 70 médicos que acompanharam o tradicional evento, desta vez pela plataforma Zoom.

A Tertúlia foi mediada pelo presidente da Academia e da Associação Paulista de Medicina, José Luiz Gomes do Amaral: “Esta deve inaugurar uma série de reuniões do tipo. Provavelmente quando voltarem as atividades presenciais, ainda teremos a oportunidade de realizar outras complementares a distância, permitindo que alguns colegas que estão longe possam participar também. Em um momento como este, temos que acrescentar a solidariedade, porque sem ela não conseguiremos dar um próximo passo e encontrar uma solução definitiva”.

De acordo com Jairo Tabacow Hidal, para entender quais serão os reflexos deixados pela pandemia no futuro – pensando tanto em curto quanto em longo prazo – primeiramente é necessário conhecer o passado e saber de que forma ele contribuiu para definir a vida na sociedade atual. “Há uma série de eventos trágicos ocorrendo no Planeta. Além da pandemia, temos pragas de gafanhotos em algumas regiões da África, prejudicando a agricultura e o ecossistema e vulcões entrando em erupção. Então, pensando em um cenário em que não deixamos registros, como podemos explicar para as próximas civilizações todos esses acontecimentos caso tudo desapareça?” questiona.

História

Como forma de responder à indagação e explicar a importância de recursos históricos, o médico contou sobre a Civilização Minoica, caracterizada por ter sido uma das mais importantes e uma das primeiras do continente europeu, alcançando seu apogeu entre 1.900 e 1.500 a.C, tendo um declínio abrupto após este período e desaparecendo completamente por volta do ano 1.100 a.C.

“O fim do apogeu Minoico ocorreu por conta de uma das maiores erupções vulcânicas já registradas. Estima-se que seu impacto matou mais de 40 mil pessoas, acalentou uma considerável queda na temperatura em todo o Planeta e espalhou uma nuvem de fumaça por boa parte da Europa e da Ásia”, descreve.

Por conta do impacto da erupção, foram inúmeros os efeitos deixados no meio ambiente. Exemplo disso foi a liberação de resíduos, como sulfato ferroso, no fundo dos rios e lagos, deixando as águas desprovidas de oxigênio e ocasionando a morte dos peixes que viviam na região e a migração de sapos e rãs, uma vez que o lugar agora era inóspito para a sua habitação. Perto dali, existia a Ilha de Thera, uma civilização importante, com um rei autoritário e empreendedor que viu sua população ser dizimada por conta da proliferação de insetos e larvas que não eram mais consumidos pelos animais que migraram daquela localização.

O palestrante da Tertúlia continuou detalhando como efeitos da natureza são fundamentais para a percepção de acontecimentos históricos. “Há uma coisa chamada cinturões de fogo, que são conexões entre uma série de vulcões e, por causa disso, existe um acúmulo de gases tóxicos que podem causar tremores. Pensando que estamos falando da região do Egito antigo, em uma época em que esses fenômenos naturais causavam morte e intoxicação de muitas pessoas, pode-se dizer que o povo escravizado se aproveitou disso para fugir e é a partir daí que acontece a travessia do Mar Vermelho, devido aos atos da natureza”, conta.

Hidal mostra que outra teoria para o acontecimento se caracteriza pela movimentação das placas tectônicas que ajudaram a passagem do povo hebreu. “Existem evidências que provam tudo isso, como estátuas e utensílios usados pelo povo da época. É possível que o Egito tenha sofrido os efeitos da erupção minoica citada anteriormente e isso explica como as conhecidas ‘pragas do Egito’ foram ocasionadas, através de ações da natureza e mudanças climáticas”.

O especialista conclui que é importante entender como a humanidade compreende diferentes fatos que, na maioria das vezes, acabam não sendo baseados na ciência, e sim em criaturas míticas. “Cada sociedade ao redor do Planeta vai criar teorias sobre um contexto histórico de acordo com seus interesses e com aquilo em que mais acreditam. No entanto, é preciso tomar cuidado, porque quando a gente tem uma sociedade que vai usando dos seus recursos de uma maneira que não é correta, algo de errado mais tarde irá acontecer”, destaca.

Por fim, ele disse possuir esperança de que a pandemia do novo coronavírus contribua para todos se tornarem melhores enquanto seres humanos, sendo possível ajudar aqueles que vivem em situação de vulnerabilidade. “Acho que não vamos conseguir conviver moralmente com essa situação, então acredito que sairemos dessa como pessoas melhores.”

Texto: Julia Rohrer (Sob supervisão de Giovanna Rodrigues)

Fotos: BBustos Fotografia