Nesta quarta-feira, 16 de setembro, a 18ª edição do Webinar APM, transmitida via YouTube, foi voltada ao Setembro Amarelo, mês de combate ao suicídio. Dessa forma, a entidade convidou Guido Arturo Palomba, diretor Cultural da Associação Paulista de Medicina e um dos mais renomados psiquiatras forenses do Brasil, para tratar da “tragédia do século XXI”. O encontro também teve a participação de José Luiz Gomes do Amaral, presidente da APM, e Álvaro Atallah, diretor Científico.
O palestrante iniciou relembrando os motivos que fizeram com que setembro se tornasse o mês de prevenção ao suicídio. Tudo começou em 1994, quando Mike Emme, um jovem dos Estados Unidos, tirou a própria vida dentro de seu Mustang 1968 amarelo, que ele mesmo havia restaurado e pintado.
A partir da tragédia, a família distribuiu cartões com fitas amarelas, em homenagem ao carro de Mike, com mensagens de apoio àqueles que estivessem passando pelo mesmo sofrimento de seu filho. A campanha, ao passar dos anos, ganhou corpo, cruzou fronteiras e hoje faz parte do calendário de todos os países.
Guido Palomba, de início, também foi categórico: “Todo suicídio, sem exceção, é uma doença mental – pelo menos naquele momento”. Segundo o palestrante, os seres humanos têm um instinto primordial de preservação, bem como os animais e até as plantas. Deste sentimento, derivam os outros instintos, como o sexual, o gregário, o de alimentação, o de defesa, o medo etc.
“Quando sentimentos medo, secretamos hormônios justamente para por o corpo em posição de defesa. Voltar-se, pois, contra esse instinto primordial é sempre um momento de doença mental”, reforçou.
Antes de aprofundar nas causas do suicídio, Palomba apontou que de 70% a 90% dos suicídios são evitáveis e mostrou dados epidemiológicos. Por ano, são 800 mil suicídios no mundo – o que representa um a cada 40 segundos. A proporção é de três casos em homens, para um em mulheres. Ele é 2ª maior incidência de morte em jovens de 15 a 27 anos, perdendo apenas para acidentes automobilísticos, e volta a crescer para a população maior de 65 anos.
Suicídios exógenos
“Por que as pessoas se matam?” refletiu o convidado. Em seu entendimento, o jovem que tira a própria vida não quer morrer, mas está em uma situação que julga intransponível e resolve interromper esse cenário. “Ele quer matar a situação, não a si mesmo. Mas acaba cometendo suicídio.”
Outro motivo exógeno que é muito percebido é a tentativa de deixar alguém culpado. Por conta de um estreitamento de consciência ou de um estado de perturbação mental grave, um individuo pretende deixar alguém que conhece culpado para o resto da vida. Segundo Palomba, isso ocorre, muitas vezes, por brigas entre casais e familiares. “Além disso, tem o suicida que acredita em vida após a morte e resolve ir reencontrar alguém querida”, adicionou.
Ele também apontou que o suicídio a partir dos 65 anos cresce por motivos exógenos como a solidão, a desesperança, a consciência da decadência física e mental. Bem como por patologias como canceres, a AIDS e certas doenças neurológicas.
Suicídios endógenos
Estes, segundo Palomba, são os casos em que os médicos podem e devem atuar mais incisivamente. Aqui, estão por exemplo os delírios. “Há certos destes que fazem as pessoas acreditaram que têm asas. Que podem pular de uma determinada altura e nada vai acontecer. São doenças mentais graves.”
O psiquiatra relatou o caso, para exemplificar, de um indivíduo esquizofrênico que acreditava já estar morto. Dessa forma, ele corria em disparada e tentava atravessar paredes, frequentemente se lesionando em decorrência dos impactos, tendo falecido ao se jogar de uma escada, acreditando que nada aconteceria.
“A toxicomania também está na raiz do suicídio. E não é um motivo exógeno, pois é preciso ter potência orgânica física para ser toxicômano. Bem como o alcoolismo. Ninguém se torna alcoolista por ‘relaxar’ ou ser ‘vagabundo’. Sim porque tem essa potência. E alcoolismo e toxicomania levam à incidência de suicídio.”
Casos sui generis
O palestrante abordou, ainda, os casos de suicídios que tem características particulares, não se encaixando exatamente nos de motivações exógenas ou endógenas. Como o caso de samurais japoneses, que para preservarem a sua honra diante de situações intoleráveis do ponto de vista rígido de suas formações, cortavam seus próprios ventres utilizando um punhal – ritual conhecido como seppuku.
Caso também dos camicases, pilotos japoneses da Segunda Guerra Mundial que cumpriam missões suicidas, atingindo alvos inimigos diretamente com o avião que pilotavam. “Eles faziam aquilo como se fossem salvar a honra da nação. Hoje vemos os terroristas e os homens-bomba. Há pessoas que defendem que são pessoas normais. Eu me coloco ao lado dos que dizem que eles têm alguma perturbação da saúde mental, pois vão contra o próprio princípio de preservação.”
Na sequência, Palomba tratou de um dos casos mais intrigantes da psiquiatria forense, os suicídios “por outra mão”. Segundo seu relato, nestes longos anos de atuação e especialização na área, ele só lidou com um destes. Mais especificamente uma mulher, mãe, que fez três seguros de vidas.
“Como os seguros não pagam o dinheiro em casos de suicídio, ela contratou dois assassinos e pediu para lhe matarem com dois tiros, para não levantar suspeitas. Eles foram pegos e mesmo assim não assumiram e as seguradoras pagaram. Uma, porém, desconfiou por ter visto algumas cartas e atitudes pregressas da mulher em questão, me contatando para realizar uma perícia póstuma do caso”, relembrou.
Ao observar os detalhes, Palomba notou o horizonte curto desta mulher, que em cartas aos filhos dizia que estava bem de saúde, mas já deixava diretivas para caso ela morresse. Além disso, ela emancipou uma filha que tinha 17 anos e quatro meses. “Em uma das cartas, ela dizia que se um dia morresse, pretendia estar com uma roupa quente e uma botinha. Fui ao IML, pedi os laudos e lá dizia que – apesar do dia quente de sua morte – ela estava com um casaco e a botinha mencionada.”
Por fim, o psiquiatra também lembrou de casos de suicídio coletivo. O maior deles, ocorrido em 1978, em território da Guiana, entre uma seita fundada pelo pastor Jim Jones. Foram 918 mortos, a maioria deles por beber veneno misturado a um ponche de frutas.
Perdeu algum dos nossos webinars passados? Acesse a playlist completa aqui.