Medicina baseada em evidências e Covid-19 na última tertúlia acadêmica do ano

Na última quarta (8), a Academia de Medicina de São Paulo (AMSP) realizou a última tertúlia acadêmica do ano, com debate do tema “A pandemia de Covid-19 e a Medicina baseada em evidências”. Com apoio da Associação Paulista de Medicina, o evento ocorreu de forma híbrida, com parte dos convidados de forma presencial e transmissão ao vivo pelo Zoom.

Últimas notícias

Na última quarta (8), a Academia de Medicina de São Paulo (AMSP) realizou a última tertúlia acadêmica do ano, com debate do tema “A pandemia de Covid-19 e a Medicina baseada em evidências”. Com apoio da Associação Paulista de Medicina, o evento ocorreu de forma híbrida, com parte dos convidados de forma presencial e transmissão ao vivo pelo Zoom.

O palestrante responsável pelo tema foi Álvaro Nagib Atallah, professor Titular e chefe da Disciplina de Medicina Baseada em Evidências da Escola Paulista de Medicina/Unifesp e diretor de Economia Médica e Saúde Baseada em Evidências da APM.

Ao iniciar sua exposição, o especialista contou sobre o conceito e evolução da prática ao longo dos anos. “Inicialmente, esse assunto chamava-se epidemiologia clínica, que é a junção do conhecimento da metodologia de epidemiologia com os conhecimentos fisiopatológicos e clínicos da Medicina. Essas duas coisas acabaram gerando a epidemiologia clínica e, posteriormente, passaram a se chamar Medicina baseada em evidências.”

De acordo com ele, a prática nada mais é do que um elo entre a melhor Ciência disponível e a melhor prática clínica possível: “Obviamente, esse processo de busca de evidências visa à redução das incertezas em relação às tomadas de decisão, buscando a redução do número de erros e aumento de possíveis acertos”.  

História

Aprofundando-se sobre o início da prática, Atallah não deixou de citar James Lind, cirurgião escocês que servia na marinha britânica, e que acreditava que o escorbuto (doença atualmente rara, causada pela falta grave de vitamina C), não era uma doença contagiosa. Após muitos estudos, realizou em 1747 o que hoje é considerado o primeiro ensaio clínico da história da epidemiologia.

“Lind fez o que praticamos hoje na Medicina baseada em evidências, realizou uma revisão sistematizada sobre o assunto. Com isso, percebeu que a doença era tratada com água do mar, suco de limão, azeite e vinagre. Em meio às dúvidas, resolveu fazer o comparativo entre esses possíveis tratamentos, e verificou que suco de lima e de limão curava totalmente o escorbuto. Infelizmente, o tratamento só foi aceito 50 anos após sua descoberta”, explicou.  

Ele ainda destaca que a Medicina baseada em evidências não deixa de ser uma luta entre racionalidade, isenção, imparcialidade, emoção, interesse e fantasia. “Implementar os resultados da Ciência na prática é um grande desafio, vivemos isso ainda hoje com a Covid-19, assim como em outras situações de atitudes preventivas, terapêuticas e prognósticas. Esse estudo do Lind foi tão importante que mudou a história do Brasil. Dom João VI veio para o País em 1812, trazendo 12 mil pessoas escolhidas na elite intelectual portuguesa, e ninguém veio a óbito por escorbuto, pois já se sabia o melhor tratamento para a doença.”

Mesmo com a descoberta de Lind em 1747, apenas em 1948 foi realizado o primeiro estudo comparativo de qualidade – por meio de planejamento adequado, envelopes selados e avaliações cegas de raio-x – por dois radiologistas independentes e um clínico. “Foram quase 200 anos para descobrir um bom desenho de pesquisa clínica, que hoje é a base principal para a tomada de decisão terapêutica baseada em evidências.”

Covid-19

Em relação à doença, o palestrante ressalta que é preciso ter certo conhecimento de cálculo amostral, pois quanto maior o tamanho da amostra, maior o poder de detectar pequenas diferenças e defeitos. “Na Covid-19, cerca de 1% dos pacientes que realmente se contaminam com a doença morrem. Para reduzir esse número, é preciso fazer um estudo detalhado, analisar sete mil casos em cada grupo, detectando frequências em assintomáticos, redução de internação, pacientes em UTI e mortalidade.”

Conforme o presidente da EPM, tudo irá depender também do comportamento do próprio vírus. “Sabemos que a não-vacinação na África, por exemplo, facilitou a apresentação de mutantes e variantes de preocupação, e fico torcendo para que existam variantes de despreocupação, menos lesiva e mais atenuada, como aconteceu com a varíola.”

O especialista também informa que na prática de Medicina baseada em evidências, existe um desafio diário, pois há muitos questionamentos feitos tanto pelos pacientes quanto pela imprensa, sobre dados de eficácia, efetividade, eficiência e segurança. “As decisões de Saúde pedem essas informações e, aos poucos, estão sendo incorporadas em toda literatura médica.”

Outro importante passo para a tomada de decisões baseada em evidências é levar em consideração os seguintes tópicos: revisão sistemática, ensaio clínico randomizado, prospectivo-coorte, casos e controles, série de casos e opinião de especialistas. “Os médicos criam as perguntas e, com isso, fazem a Medicina se desenvolver. Trabalhando com experiência, começam a desconfiar de alternativas promissoras. Isso gera uma pergunta, que é respondida com inúmeros ensaios clínicos e, com a soma dos resultados, é realizada a revisão sistemática, abrindo caminho para a melhor tomada de decisão.”

Comentários

Ao final da apresentação, José Luiz Gomes do Amaral, presidente da APM e da AMSP, fez suas reflexões sobre o tema abordado. “Nesta edição, pudemos apreciar o potencial e a cultura da Medicina baseada em evidências. No cenário atual, vivendo a pandemia de Covid-19, é preciso reavaliar os problemas associados a todos os estudos que se sucederam depois do início da pandemia e tentar ajustá-los, não só em relação ao número de pacientes incluídos nos estudos, mas também a outros aspectos metodológicos, que muitas vezes nos induzem a conclusões não assertivas.”

Amaral também lembrou que, “após os estudos, tivemos uma oportunidade importante de refletir sobre a autonomia médica, que é algo mal utilizado, principalmente quando discutimos medicamentos que não estão contemplados nas indicações correspondentes. E para exercermos a autonomia e aplicarmos tais intervenções, precisamos ter evidência. Autonomia isolada, sem evidências, não faz qualquer sentido”.

Inscreva-se no canal da Academia de Medicina de São Paulo no YouTube e ative as notificações para não perder nenhum conteúdo!

Notícias relacionadas:
12/11/2021 – Carmen Escobar Pires é homenageada na tertúlia acadêmica de novembro
14/10/2021- Tertúlia acadêmica recebe Gyorgy Miklós Bohn
10/09/2021 – Tertúlia acadêmica de setembro debate Medicina Fetal no Brasil
16/08/2021 – Tertúlia acadêmica recebe Nelci Zanon, da ABMM
15/07/2021 – AMSP: Tertúlia discute avanços na área da Oftalmologia
10/06/2021 – Tertúlia Acadêmica recebe palestra de Giovanni Cerri
14/05/2021 – Tertúlia Acadêmica debate aprendizados com as pandemias com Margareth Dalcolmo
19/04/2021 – Tertúlia acadêmica debate a Revolução Digital da Saúde
11/03/2021 – Grandes avanços na Cardiologia são tema da tertúlia acadêmica
11/02/2021 – Tertúlia acadêmica: Edivaldo Utiyama fala sobre experiência do HC na pandemia