Para instigar médicos e outros profissionais da Saúde e da Tecnologia sobre as discussões mais recentes que envolvem a Telemedicina e a Saúde Digital, no dia 18 de agosto, a Associação Paulista de Medicina promoveu o I Telemedicine Update. Coordenado por Chao Lung Wen, chefe da Disciplina de Telemedicina da FMUSP, o evento teve debates sobre ética e responsabilidade digital.
“O maior problema hoje é a privacidade. Devemos ter muita precaução em compartilhar dados no mundo digital, como fotografias e informações médicas, além do uso das redes sociais. Ressalto, a base democrática é garantir a segurança e a privacidade dos usuários. Em outras palavras, não adianta termos eficiência e sermos logisticamente ágil se não tivermos ética. Por isso, como primeira atividade do nosso Congresso, apresentamos este tema”, explica Wen.
O I Telemedicine Update faz parte das atividades do Global Summit Telemedicine & Digital Health, que ocorre de 4 a 6 de abril de 2019, no Transamerica Expo Center. Segundo Jefferson Gomes Fernandes, presidente Científico do Congresso e do Conselho de Curadores, a proposta visa esmiuçar todo o ecossistema que envolve a Telemedicina e a Saúde Digital: indústria, academia, hospital, sociedades, entidades, médicos e profissionais do ramo.
“É uma oportunidade para nos apropriarmos ainda mais desse segmento. A tecnologia não tem caminho de volta, é uma ferramenta que complementa o nosso cuidado e a atenção ao paciente. Por isso, é fundamental conhecermos o que está acontecendo para sermos protagonistas deste momento”, afirma Fernandes.
Palestras
Nesse sentido, o palestrante Claudio Cohen, especialista em Ética Médica e em Bioética Clínica e Direito, traçou um panorama sobre as mudanças valorativas de diversas definições entre os séculos XX – sob viés mais objetivo e racional – e XXI – com uma visão mais subjetiva -, para uma compreensão dos princípios da responsabilidade digital.
“A ética é algo de dentro do indivíduo (dever com); a moral é imposta pela sociedade (tenho que respeitar as normas); somos julgados pelas atitudes (o que fazemos, o que optamos); e essa atitude será sua responsabilidade (responder por ela). Assim, a moral digital tem como finalidade melhorar a sociedade, trazendo inovações, otimizando processos, possibilitando vantagens e até melhorando a qualidade de vida. Sem esse propósito, seu uso não é ético”, destaca.
“Tudo o que fazemos no ambiente virtual gera consequências reais. Independente do efeito, gera responsabilidade”, acrescenta Cristina Moraes Sleiman, sócia da empresa Peck Sleiman EDU. Ao citar os códigos de Ética Médica e Penal, sobre a penalidade em expor alguém, a especialista pontuou alguns exemplos comportamentais dos profissionais frente a esses meios. “Devemos tomar cuidado ao compartilhar e curtir algum conteúdo. Em se tratando de um paciente, não posso simplesmente filmar ou fazer foto, a não ser que haja uma autorização prévia. Mesmo assim, as imagens devem ser oficiais e providenciadas pelo hospital”, alerta.
O Conselho Federal de Medicina permite a utilização de grupos de discussão por meio de aplicativos, desde que seja fechado e acessado apenas por equipe médica. “Entretanto, deve-se evitar diagnósticos e prescrições por WhatsApp ou redes sociais e informar ao paciente, durante a consulta, que este meio de comunicação não é utilizado profissionalmente. Lembre-se sempre que as mensagens trocadas estão sob a guarida do sigilo”, reforça Cristina.
Silvio Eduardo Valente, presidente da Comissão de Direito Médico da OAB-SP, fez uma breve análise das resoluções recentes do CFM que definem Telemedicina, uso de WhatsApp, regras para a digitalização de prontuários médicos, transmissão dos exames de telerradiologia, aplicativos em Medicina e avaliação pericial por videoconferência, além da portaria do Ministério da Saúde e a ABNT ISO 1331, que definem os serviços de telessaúde.
“A declaração de Tel Aviv sobre responsabilidades e normas éticas na utilização da Telemedicina é similar ao que nossa Constituição representa em relação à Legislação Ordinária, norteando os princípios éticos de consentimento e confidencialidade, implicando na responsabilidade médica de competência, recursos tecnológicos e qualidade da informação”, ressalta.
“Vimos que vamos tratar pessoas cada vez mais virtualmente, dada a velocidade de acesso. Cabe a nós nos adaptarmos às normas e estabelecermos regras para a utilização dessas ferramentas”, completa Valente.
Nova resolução
O Conselho Federal de Medicina tem estabelecido uma nova resolução em Telemedicina, no intuito de atender as demandas recentes da área. A previsão é de os eixos serem submetidos em plenárias entre agosto e setembro deste ano. “As resoluções e regulamentações da área precisam ser reavaliadas a cada três anos, devido à avalanche tecnológica. Precisamos de uma estrutura que garanta autenticidade, segurança e evite vazamento de dados”, reforça o professor da FMUSP.
Na segunda roda de debates, Eduardo Cordioli, gerente médico de Telemedicina do Hospital Israelita Albert Einstein, apresentou de forma prática um projeto piloto aplicado em Unidade de Pronto Atendimento virtual da instituição para funcionários, iniciado no final de 2016, com sala de teleconferência e plataforma de acesso gratuito. Já na terceira fase, a ampliação do atendimento de 800 funcionários para 26 mil, incluindo familiares, garantiu 99,95% de eficiência assistencial por meio da Telemedicina.
“Acreditamos que este é o futuro do atendimento médico de baixa complexidade. Quando falamos de sustentabilidade, inclui desospitalização e economia para os usuários que não precisam se deslocar fisicamente para o atendimento. É uma verdadeira democratização em saúde quando quebra-se a barreira geográfica, tornando mais acessível a assistência.”
Em consonância, o diretor médico da Omint, Marcos Roberto Loreto, reforçou que o projeto estrutural da Telemedicina, devidamente registrado no Conselho, contribui para o “aumento da experiência do cuidado, a melhora da saúde da população, a diminuição no custo per capita e a ampliação da experiência na prestação do cuidado.”
Para fechar, a especialista em Direito Médico e doutoranda em Saúde Pública Sandra Regina Franco Lima fez uma síntese do sigilo profissional tecnológico em instituições de Saúde.
Fotos: Marina Bustos