No último sábado, 3 de dezembro, o Instituto de Ensino Superior da Associação Paulista de Medicina (IESAPM) realizou a primeira edição da Jornada de Gestão Hospitalar. O evento foi um grande sucesso e ocorreu no formato híbrido, reunindo participantes no auditório da APM e pela plataforma Zoom, contando com mais de 230 inscritos.
De acordo com o gerente comercial do Instituto, Cesar Viana, a Associação tem uma grande influência no que se entende por gestão hospitalar. “A APM sempre foi fiel aos médicos, defendendo a classe. Hoje, ela está com uma nova visão, abrindo as portas para a educação continuada, não só aos médicos, mas ao público geral e à formação multidisciplinar. Dentro do hospital, precisamos do enfermeiro, do gestor, do fisioterapeuta, do radiologista, assim como as diversas profissões que exercem as funções dentro de uma comunidade hospitalar.”
Quem deu início às apresentações do dia foi o coordenador e professor da graduação do IESAPM, João Luiz de Souza Lima. Conforme relembrou, o curso que deu origem à graduação do Instituto é focado em gestão hospitalar e havia sido solicitado por uma série de médicos, que detectaram haver falha de gestão nas organizações de Saúde. Sendo assim, foi proposto ao Ministério da Educação o curso em questão, que tem o total de 2.160 horas e disciplinas eletivas focadas nas áreas de gestão e finanças – pois as maiores adversidades nos hospitais brasileiros estão diretamente relacionadas à má gestão das finanças.
Dentre os diferenciais, está a ideia proposta na Lei de Diretrizes de Bases da Educação, que corresponde ao curso superior colocar o acadêmico no mercado de trabalho o mais rápido possível. Por isso, o IESAPM criou algumas certificações intermediárias, que são obtidas no decorrer da formação, por exemplo no final do terceiro semestre, em que o aluno sai com uma certificação em viabilidade econômica hospitalar, tendo em vista a carga de finanças, contabilidade, economia e métodos quantitativos que ele terá.
Ao fim do quinto semestre, o estudante receberá o certificado de gestor sanitário, pois um dos grandes problemas do setor corresponde à questão da infeção hospitalar. Então, terá aulas de arquitetura hospitalar, para entender a estrutura do hospital, além de outras disciplinas ministradas por pessoas com formações nas áreas de Química, Bioquímica, Biologia e Medicina, para auxiliar e nortear a percepção acerca desses assuntos. Além disso, ao concluir o sexto semestre, o acadêmico sairá diplomado como tecnólogo em gestão hospitalar.
Teoria e prática
“Relatei um pouco do perfil do curso que vai permitir a esse acadêmico ir para o mercado para desenvolver habilidades de criar e implementar planos estratégicos, estáticos e operacionais, inclusive inferiores da pirâmide organizacional, que já não existe mais. O curso contribui para desenvolver habilidades nos serviços de Saúde, criar projetos de modelagens e estrutura organizacional. É preciso saber pegar uma organização que tenha algum distúrbio e a modelar do ponto de vista estrutural, para assim, aplicar e entender resultados”, explicou o coordenador.
Lima pontuou também que o curso permitirá identificar e aplicar decisões estratégicas nas situações em que seja necessário, definindo metodologias de trabalho, aplicando e entendendo processos de auditoria, já que é através dessa estratégia que será estabelecido um processo, checando se ele está sendo cumprido. Não obstante, raramente há entidades de classe no Brasil que montam uma faculdade, e a APM, com toda a sua bagagem histórica em prol da Saúde nacional, é um dos grandes diferenciais – pois através de professores com larga experiência em gestão, está focada em fornecer educação de qualidade e mudar o cenário atual.
Ademais, conforme o coordenador da graduação do IESAPM relembrou, pesquisas do DataFolha destacam que alunos saem mal preparados das instituições. Por isso, o objetivo da instituição é ligar teoria e prática. O curso, apesar de pertencer à Saúde, vai ser certificado e ter o diploma chancelado pelo Conselho Federal de Administração, através dos conselhos regionais, que darão a carteira de identidade profissional dos acadêmicos, visto que o curso é sobre gestão, contando com uma aprendizagem interdisciplinar com novas tecnologias. “Estamos usando a nossa expertise para fazer parcerias com empresas de fomento na área da Saúde e já temos várias envolvidas nisso.”
Finalizando a apresentação, Lima relembrou o valor que os alunos têm para a entidade. “Harvard fez um estudo para dizer se o aluno era aluno ou se ele era um cliente da sua instituição de ensino, e chegaram à conclusão depois de vários estudos de que aluno sempre será aluno”.
Competências e Habilidades
A gerente de atendimento do Seconci-SP, Valquíria Linhares, foi responsável pela apresentação da palestra “Quais as principais competências e habilidades do Gestor Hospitalar?”, destacando que apesar das dificuldades no Sistema Único de Saúde, é possível obter experiências exitosas através do bom desempenho. Sendo assim, ela evidenciou que o papel do gestor hospitalar é o gerenciamento geral do sistema, com a função de unir todos os processos.
Do mesmo modo, este também é o objetivo da gestão hospitalar, que visa estimular pessoas a trabalharem e realizarem suas funções com sucesso. Além disso, o gestor precisa ser assertivo, e no contexto do SUS, isso representa um desafio muito grande, de modo que é a experiência que vai demonstrando como obter mais acertos nas práticas.
Por isso, é fundamental incentivar líderes a ampliarem a consciência de liderança, trazendo a importância da boa vontade e da sede por buscas – algo que, de acordo com a especialista, é falho dentro da administração do SUS. Desta forma, destaca as sete competências que todo administrador hospitalar deve ter: visão estratégica, habilidades analíticas, capacidade de liderar e inspirar pessoas, criatividade e comunicação, gestão de pessoas, conhecimento técnico da administração e compromisso social.
A visão estratégica corresponde a entender o meio externo, conhecendo toda a parte demográfica e a geografia de cada região em que se irá trabalhar, entendendo que cada local possui costumes completamente diferentes que precisam ser respeitados, trazendo isso para a tomada de decisões e a atuação profissional. “Tenho que conhecer quais são as metas e recursos que tenho, desde RH até equipamentos, para poder processar em cada unidade, saber fazer essa análise e chegar em um denominador comum. É aí que o administrador hospitalar entra, fazendo o planejamento da sua unidade”, declarou.
A habilidade analítica, por sua vez, corresponde a tudo que deve ser analisado dentro da empresa, ou seja, todas as necessidades – o que é esperado, as normatizações, a estrutura organizacional, a direção que é preciso dar para a empresa, o controle e as avaliações. Atualmente, há diversos recursos que contribuem para fazer este controle e a tecnologia é uma grande aliada neste sentido. “Temos que trabalhar em equipe, juntando todas essas informações para que o trabalho possa ser efetivo.”
Sobre a capacidade de liderar e inspirar pessoas, a palestrante relembrou que é possível realizar esta ação por meio de ética, justiça e afeição. Os líderes precisam estar abertos a negociações e conversarem com pessoas que vão desde o operacional até a superintendência, da mesma maneira. Esta é uma forma de facilitar o trabalho, conhecer a equipe e saber o que ela é capaz de proporcionar. Além disso, é preciso buscar treinamentos e atividades para que a equipe possa estar inteiramente integrada e todos almejem o mesmo objetivo, que é a ascensão da organização.
No que se entende como criatividade e comunicação, no SUS, estas ferramentas são muito poderosas, principalmente no contexto da pandemia de Covid-19, em que o sistema e todos os profissionais que o constituem tiveram que se reinventar diante de um cenário desconhecido e estarrecedor. Valquíria Linhares salientou que o acontecimento foi um grande ensino de criatividade em todos os sentidos, relembrando que um gestor hospitalar precisa lidar com contratempo, se adequando às melhores situações possíveis.
Já a gestão de pessoas está cada vez mais difícil, já que as pessoas sabem cada vez mais, mas ouvem cada vez menos. “Precisamos saber engajar essas pessoas e como podemos fazer com que elas façam o que precisa ser feito? Temos que sugerir, levar para uma mesa de discussão, ouvir opiniões. Eu levo o problema, conduzo aquela mesa de reunião com toda a equipe multiprofissional para que tragam sugestões voltadas àquilo que quero que façam. Não posso impor, porque aquilo já chega como um sistema de autoritarismo”, reforçou.
O conhecimento técnico da administração está voltado para a parte de finanças. O gestor administrativo precisa conhecer o processo todo, pois isso traz muita informação para ser trabalhada, permite discussões com os profissionais da Saúde para saber de fato quais são as diferentes necessidades e os pontos. Sendo assim, o gestor precisa conhecer o hospital, andar em todas as áreas, porque é apenas desta forma que conseguirá ter o poder do conhecimento e fazer essa relação de comunicação dentro da unidade.
Por fim, o compromisso social é algo fundamental, uma vez que os gestores têm um compromisso com a Saúde, a pesquisa e a educação. “Coloco que a gestão hospitalar é o amor à Saúde. Eu gosto de trabalhar na gestão do SUS, no pronto-socorro, junto com a equipe. Tenho um carinho muito grande pelo Sistema Único de Saúde. Quando nos empenhamos, chegamos a esse objetivo, que é trabalhar com amor e conseguimos alcançar todos os benefícios e metas que almejamos”, complementou a palestrante.
Administração em Saúde
Dando continuidade às palestras do dia, a Jornada recebeu Antônio Eduardo Fernandes D’Aguiar, presidente da Associação Brasileira de Medicina Preventiva e Administração em Saúde (Abrampas) e membro da Governança do Programa Compromisso com a Qualidade Hospitalar, mantido pela Associação Paulista de Medicina. Ele falou sobre o tema “Administração em Saúde, uma especialidade médica”.
De acordo com o palestrante, um erro muito comum cometido pelas pessoas é acreditar que só porque o profissional é um bom médico especialista automaticamente será um excelente gestor, diretor clínico ou diretor técnico. Na realidade, isso não indica nenhum resultado positivo, já que durante a faculdade de Medicina, não há nenhuma disciplina que auxilie a ter qualquer noção básica sobre administração.
Desta maneira, o palestrante relembrou a sua própria experiência enquanto estava na universidade, pontuando que se formou em 1985, antes do desenvolvimento do SUS, e em um cenário em que a gestão não era humanizada – e não havia o mínimo para se conhecer a respeito de convivência social em termos de trabalhar com outras profissões, pois o foco era apenas o médico e a relação multidisciplinar não era considerada útil naquele período.
“Se você convida um médico para assumir uma diretoria técnica no futuro, deve se perguntar se ele tem formação para isso e se está sendo cobrado dele um título de especialidade na área. Estamos com uma proposta no IESAPM de um MBA em gestão de Saúde voltado exatamente para isso. Além de passar o conteúdo teórico, vamos ter visita aos hospitais. E apesar de ser um MBA da Associação Paulista de Medicina, não é só voltado para médicos, é sempre com uma abordagem multiprofissional e multidisciplinar”, destacou.
Conforme D’Aguiar, quando falamos em competência individual, a primeira coisa é o autoconhecimento, porque muitas vezes, para trabalhar em equipe, é preciso saber claramente quem somos. “Vamos buscar, nessa formação, ter habilidades, atitudes, aptidões, entregas, trabalhos com complexidade no espaço ocupacional, responsabilidade e ética”, informou.
Outro ponto fundamental para a execução efetiva da administração hospitalar é a percepção de que tudo deve ser discutido a partir do ponto de vista do paciente e não de uma classe social ou categoria profissional. Além disso, também é substancial habilitar médicos que já tenham alguma formação e alguma especialidade em outra área para administrar hospitais com nível técnico de excelência, valorizando os princípios éticos e humanistas.
O palestrante destacou que os programas de residência médica em Administração de Saúde possuem uma demanda proporcionalmente muito menor às demais especialidades. Na região Sudeste, há apenas 24 vagas, que muitas vezes acabam não sendo totalmente preenchidas, uma vez que o tipo de profissional médico que se encaminha para esse tipo de situação muitas vezes é aquele que já está no mercado.
Sobre o CQH, relembrou que ele utiliza o modelo de gestão da Fundação Nacional da Qualidade. englobando cerca de 80 hospitais participantes através de sua metodologia de abordagem multiprofissional e multidisciplinar. E salientou que o programa é um estímulo à boa gestão em Saúde, especificamente hospitalar, abordando critérios como liderança, planejamento estratégico, gestão de pessoas e de processos, resultados e informações de conhecimento, que contribuirão para a condução do futuro.
“O hospital é uma instituição extremamente regulamentada. Temos em torno de 150 categorias trabalhando dentro de um hospital, é um enorme desafio. A Enfermagem é que dá o tom da assistência. Acho que é uma metodologia bacana porque traz para o gestor uma visão sistêmica de como é que funciona aquela organização e ajuda, inclusive, na tomada de decisões, auxiliando para olhar o coletivo e não apenas as necessidades próprias”, disse ao concluir a apresentação.
A I Jornada de Gestão Hospitalar também contou com a apresentação dos temas “Direito Aplicado à Área da Saúde”, ministrado por Reinaldo Zychan de Moraes; “Gestão ciclo da receita hospitalar e o impacto de glosas”, apresentado por Leandro Ribeiro da Conceição; e “Importância da Gestão Financeira na Área da Saúde”, que teve Silvio José Moura e Silva como palestrante.
Fotos: BBustos Fotografia