Apneia obstrutiva do sono é tema de Webinar APM

A Associação Paulista de Medicina promoveu mais uma edição de seu webinar em 12 de maio. Transmitido via YouTube, teve o tema “Apneia do sono: um mal subestimado?”

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A Associação Paulista de Medicina promoveu mais uma edição de seu webinar em 12 de maio. Transmitido via YouTube, teve o tema “Apneia do sono: um mal subestimado?”. O encontro foi apresentado pelo presidente da APM, José Luiz Gomes do Amaral, e moderado pelos diretores da entidade Paulo Pêgo Fernandes (Científico) e Álvaro Atallah (Economia Médica e Saúde Baseada em Evidências).

O primeiro palestrante da noite foi Geraldo Lorenzi Filho, Professor Associado de Pneumologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Ele introduziu o tema lembrando por que a apneia obstrutiva do sono (AOS) ocorre. “A língua é um músculo enorme dentro da cavidade oral e a região posterior da faringe é muito estreita. Quando vamos dormir, a musculatura relaxa e com frequência obstruí a cavidade. Causando o ronco, que é uma manifestação clínica da apneia.”

Entre os sintomas da AOS, estão, principalmente: ronco alta, paradas observadas, sono fragmentado e não-reparador – todos eles de difícil percepção para quem dorme sozinho. Também há sintomas diurnos, como: sonolência e perda de produtividade, memória, libido e qualidade de vida, além de sintomas depressivos, sobretudo nas mulheres pós-menopausa.

“O diagnóstico clássico da apneia é feito pela polissonografia, em que um indivíduo dorme monitorado com fios, eletroencefalograma, sinais de fluxo aéreo e cinta toráxica. É um exame bonito para vermos a fisiologia do sono e todos os sinais integrados”, declarou Lorenzi Filho, que também é diretor do Laboratório do Sono do Instituto do Coração (InCor).

Conforme o especialista, o que interessa nas polissonografias, em termos de AOS, é observar o fluxo aéreo, onde estão os episódios de hipopneia e apneia e o tempo de duração. O exame mostra, ainda, as quedas cíclicas de saturação de oxigênio e as oscilações da frequência cardíaca.

Em relação à prevalência da condição, Lorenzi Filho mostrou um estudo feito em São Paulo pela Universidade Federal de São Paulo, em que o Instituto DataFolha convidou mais de mil pessoas para realizarem polissonografias.

“Observando o índice de apneia e hipopneia (IAH) maior do que cinco eventos associado a sintomas ou maior que 15 eventos, temos um índice de 33% da população com AOS. Um em cada três indivíduos adultos, portanto. Até os 50 anos, é mais comum a condição em homens. Depois da menopausa, a prevalência das mulheres alcança a dos homens e sobe, apresentando índices próximos a 90%, por exemplo, para indivíduos entre 70 e 80 anos. Números parecidos com hipertensão arterial. Grande problema é que a apneia segue sem diagnóstico normalmente.”

Como tratamento da condição, o especialista listou algumas alternativas, como: perda de peso; exercício físico; exercício orofaríngeo; dormir de lado; elevar a cabeceira; desobstrução nasal; algumas cirurgias; placa de avanço mandibular; e o CPAP (aparelho de fluxo de ar).

Condições cardiovasculares e dor
Na sequência, foi a vez de Luciano Ferreira Drager, Professor Associado do Departamento de Clínica Médica da FMUSP, realizar sua apresentação, focando na relação frequente entre a apneia obstrutiva do sono e as doenças cardiovasculares. Essa ligação ocorre, aproximadamente, em até 80% das vezes para pacientes com hipertensão, doença coronariana, acidentes vasculares e arritmias.

“Parte desse problema é que muitos fatores de risco que levam à apneia, são fatores de risco cardiovasculares também. Como a idade, o peso e o fato de ser homem. O que contribui para que seja um número alto”, detalha o especialista, que também dirige a unidade de hipertensão do Hospital das Clínicas da FMUSP.

Um ponto relevante ao qual Drager direcionou a sua atenção foi ao uso do índice de apneia e hipopneia como parâmetro na hora de investigar essa relação. Ele mostrou a comparação entre dois pacientes com IAH em 30 episódios por hora, mas um deles com saturação do oxigênio três vezes maior.

“Será que o IAH é o melhor parâmetro e ambos têm o mesmo risco? As evidências mostram que provavelmente não. O paciente com maior carga de hipoxemia apresenta pior prognóstico cardiovascular mesmo quando levamos em consideração os índices de apneia e hipopneia”, completou o palestrante.

A seguir, assumiu a palavra Andrea Cecilia Toscanini, que faz parte do Comitê Científico de Dor da Associação Paulista de Medicina. Como introduziu, em linhas gerais, a relação entre transtornos do sono e dor sempre foi pensada como bidirecional, com o sono piorando as dores, e as dores piorando o sono em um círculo vicioso. Leitura corroborada pelo fato de que, no mínimo, metade dos pacientes com dores possuem transtornos do sono.

“Quando manipulamos o sono, privando em laboratório o sono de ondas lentas ou o sono REM, a gente consegue provar que a piora do sono reflete em um quadro doloroso piorado. Ou mesmo o surgimento de dores em condições que não deveriam existir. Até meados dos anos 2000, acreditávamos muito nisso”, relembrou.

O que ocorreu a partir desse momento até os dias atuais foi o surgimento de estudos longitudinais com novas ideias. Com eles, ficou provado que o sono de má qualidade, nos pacientes, veio antes das dores, mostrando que essa relação não é tão bidimensional como imaginado antes.

“Primeiro, há piora no padrão de sono. Depois, desenvolvo síndromes dolorosas. Concluímos nos últimos trabalhos que o sono de má qualidade é um fator mais importante para a piora da dor que vice-versa e que a melhora do sono resulta em melhora das dores. Também vimos que o sono, potencialmente modificável por meio de alterações comportamentais, é um alvo viável e seguro para reduzir intensidade das dores”, adicionou Toscanini.

Debate
Após as palestras, houve espaço para discussões acerca das apresentações dos especialistas, com participação dos moderadores e do público virtual. Pêgo Fernandes iniciou: “o título do webinar foi muito bem escolhido, pois vocês mostraram quão subestimada é a apneia e os seus malefícios. Durante muito tempo o ronco era considerado normal, não tinha atenção nenhuma. O diagnóstico e o tratamento têm crescido muito nos últimos anos graças a pesquisadores como vocês, que investigam e publicam sobre o assunto”.

Geraldo Lorenzi Filho, questionado por Álvaro Atallah acerca do tema, disse que os estudos populacionais mostram que a maioria dos que possuem AOS apresentam quadros moderados e leves. Cerca de 10% a 15% dos apneicos são graves, segundo o especialista.

“É uma pergunta muito boa, pois o que chamamos de apneia grave pode se modificar com o tempo. Como vimos com o Luciano [Drager], a dessaturação talvez seja mais importante que o próprio índice de apneia e hipopneia. A gravidade também tem relação com os sintomas. Tem gente com índices considerados graves, mas com pouca dessaturação e poucos sintomas”, adicionou o Professor Associado da FMUSP.

“No consultório, acabamos distribuindo pacientes em tratamentos mais leves. Alguns respondem bem desde a fonoaudiologia, sobretudo os mais idosos com questões musculares. Quando vamos indicar uma terapêutica levamos em conta não só o IAH e a dessaturação, mas a estrutura craniofacial, a fase em que os eventos ocorrem no sono, a posição em que dormem etc.”, afirmou Toscanini, questionada por Atallah acerca das maneiras de tratar uma apneia.

Sobre o assunto, Lorenzi Filho adicionou que é impressionante como o aparelho CPAP é extremamente benéfico para os pacientes que possuem apneia considerada grave, com sonolência associada.

O presidente da APM também participou o debate. José Luiz Gomes do Amaral levantou a questão da Covid-19, que tem deixado muitos doentes com sequelas importantes. “Vemos que alguns se recuperam bem, mas grande número apresenta condições. Penso que a reabilitação deva ser a ciência das próximas décadas. Que impacto acham que a Covid-19 terá nos estudos do sono?”, questionou.

Lorenzi Filho lembrou que os fatores de risco para Covid-19, como obesidade, diabetes, sedentarismo e hipertensão, comumente já estão em pessoas que possuem apneia obstrutiva do sono. “Estamos estudando no InCor os pacientes pós-Covid e impressiona que há um grupo de pacientes com sequelas relevantes. Muitos dormem mal e têm problemas motores. Um colega, que teve a doença em forma leve, relatou muitas dores após se recuperar. Levantaram a ele a suspeita de apneia e ele realmente tinha, em forma grave. Com o uso do CPAP, a sua situação melhorou. Então, ainda há muita coisa para estudarmos”, exemplificou o especialista.

Antes de encerrar o encontro, Gomes do Amaral agradeceu a participação do público, dos palestrantes e dos moderadores. “Muito obrigado por essas apresentações. Vimos tudo que vocês têm feito para qualificar a Medicina brasileira, muito bem ilustrado aqui nas publicações e trabalhos que vocês desenvolvem. É um prazer ouvi-los”, finalizou.

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