A Associação Paulista de Medicina foi palco do V Encontro das Academias de Medicina, evento que aconteceu no último sábado, 9 de dezembro, na sede da entidade e com transmissão on-line. A solenidade reuniu as Academias de Medicina de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul em uma manhã repleta de congregação entre os seus membros e muitas trocas de conhecimento.
O presidente da Academia de Medicina de São Paulo, Helio Begliomini, relembrou as edições passadas, destacando o crescimento gradativo do evento. “Interessante que a partir da terceira edição, passou a agregar a Academia do Paraná e a partir do ano passado, a Academia de Medicina de Santa Catarina. Esta iniciativa é muito boa e serve para nos irmanar.”
A presidente da Academia Sul-Rio-Grandense de Medicina, Miriam da Costa Oliveira, também esteve presente e fez as suas considerações. “Tem sido um evento de sucesso, não só em termos de conhecimento médico, mas também em função da confraternização entre vários estados. Então, eu agradeço muito ao companheirismo e estamos prontos para mais uma realização.”
Jurandir Marcondes Ribas, presidente da Academia Paranaense de Medicina, demonstrou a sua satisfação em estar ao lado de notáveis autoridades médicas. “Estive no primeiro encontro, que foi espetacular, associado à História da Medicina. Gostaria de agradecer a Academia de São Paulo e do Rio Grande do Sul por nos acoplar e recepcionar nesta reunião de academias do Sul e Sudeste. Eu me sinto duplamente honrado, pois agora também sou membro honorário da AMSP.”
Representando a Academia de Medicina de Santa Catarina, o presidente Luiz Alberto Silveira expressou as suas observações. “Trata-se da possibilidade de uma cooperação. Nossos confrades e confreiras catarinenses se sentem honrados e diferenciados de poder participar deste encontro. Estar presente, poder ouvi-los e acrescer aos conhecimentos e às experiências nos é bastante gratificante.”
José Luiz Gomes do Amaral, ex-presidente da Academia de Medicina de São Paulo e vice-presidente da Associação Paulista de Medicina, coordenou a mesa e finalizou as falas iniciais do grupo, relembrando como surgiu a ideia de realizar os encontros entre as Academias, advinda de uma parceria entre ele e o ex-presidente da Academia Sul-Rio-Grandense, Gilberto Schwartsmann. “Eu entendi que aquilo seria um ganho fantástico para todos. O pessoal recebeu a ideia com entusiasmo e as reuniões foram se sucedendo.”
Primeiras apresentações
As palestras do dia foram divididas entre oito acadêmicos que relataram diferentes pontos de vista sobre temas fortemente relevantes à classe médica. A primeira apresentação foi ministrada por Sérgio Libonatti, abordando “Luiz Pereira Barreto e o positivismo em São Paulo”. Ele relembrou alguns dos principais positivistas que passaram pelo estado – destacando que, destes, a grande maioria não era paulista de nascença – e pontuou a atuação de Pereira Barreto neste sentido.
“Ele foi tudo e completo em tudo que fez. Escreveu muito, fez apresentações, realizou manuais de atendimento médico. Estudou “Humanidades” na França, em que descobriu o positivismo e se formou em Medicina na Bélgica, retornando para o Brasil. Para poder trabalhar aqui, teve que passar pelo Exame de Revalidação – demonstrando que não é de hoje esta questão, ela é bem antiga. Dentre as suas realizações, está a fundação da Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, atual Academia de Medicina de São Paulo”, relembrou.
“O positivismo e a Medicina no Rio Grande do Sul” foi o tema apresentado pela palestrante Leonor Schwartsmann, reforçando que a criação da Faculdade de Medicina de Porto Alegre foi um balizador para controlar diplomas e, assim, monitorar quem poderia ou não exercer a profissão. “Nós tivemos no Rio Grande do Sul uma grande quantidade de médicos europeus que vieram se estabelecer no estado. A Faculdade de Medicina, que foi a terceira do País, foi um locus contra a liberdade profissional que estava tendo.”
Paulo Roberto Prates, membro da Academia Sul-Rio-Grandense de Medicina, ministrou uma palestra sobre “A origem do barbeiro cirurgião”. Durante a apresentação, Prates relembrou que no período da Idade Média, a Medicina não era bem-vista em Roma e só chegou por lá após a conquista da Grécia, já que, até então, os cristãos consideravam as doenças como dádivas divinas. “Os monges eram quem ajudavam os doentes, e como eram aconselhados a se barbear, isso fez com que os barbeiros desenvolvessem técnicas cirúrgicas, pelo seu conhecimento em manusear navalhas.”
Em seguida, José Luiz Gomes do Amaral falou sobre “As origens do Sistema Único de Saúde”, fazendo um contexto histórico da Medicina na Europa até a sua chegada no Brasil e quais foram as consequências que levaram ao desenvolvimento do SUS. “Ele iniciou-se nas caixas de aposentadorias do trabalhador e uma preocupação secundária era a Saúde, o restante dos habitantes do País não estavam incluídos neste sistema previdenciário. Na década de 1970, o Ministério da Previdência e Assistência Social foi criado e dentro dele, talvez, tenha sido o primeiro passo para estender a assistência pública àqueles que não fossem segurados.”
Continuidade
Dando segmento às apresentações, o acadêmico da Academia de Medicina do Paraná, Dagoberto Requião, trouxe o tema “Novas drogas e suas complicações” para discussão. O especialista apresentou o Relatório Mundial sobre Drogas, indicando que em 2021, mais de 296 milhões de pessoas fizeram uso de entorpecentes, representando um aumento de 23% em relação à década anterior.
Requião relembrou a droga mais recente do momento, o K9, demonstrando como a substância age no organismo dos indivíduos. “Iniciado o uso em penitenciárias, ele é disseminado na sociedade, com o consumo aumentando em 93% em 12 meses. São substâncias sintetizadas anualmente, não se para de produzir, o que, obviamente, torna a apreensão policial praticamente impossível. Por isso, a identificação e o controle são muito complexos”, relatou.
Seguindo este gancho, José Alexandre de Souza Crippa, da Academia de Medicina de São Paulo, deu continuidade às palestras, falando sobre “Maconha”. Conforme o especialista, é fundamental saber a diferença entre os canabinoides e a maconha utilizada para uso recreativo – que traz consequências no uso crônico, como alterações cognitivas.
“O canabidiol tem efeito ansiolítico na ansiedade social, no Parkinson e na epilepsia. Se por um lado temos benefícios imensos e estudos clínicos que podem trazer vantagens para milhares de pessoas, o argumento que se tenta confundir, de uma forma mais ampla, é dizer que canabidiol é maconha. Isso acaba trazendo mais desinformação e mais problema.”
Ainda sobre vícios, Sérgio de Paula Ramos, do Rio Grande do Sul, falou sobre “Alcoolismo: a doença que pouco se diagnostica”. Em uma apresentação repleta de gráficos e dados, o especialista fomentou que o alcoolismo é uma doença que atinge todos os níveis de escolaridade e todas as classes econômicas de forma muito semelhante.
“O jovem brasileiro bebe cada vez mais cedo. No último levantamento, demonstrou-se que era a partir dos 13 anos de idade, o que só vai agravar o problema. De acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde, a prevalência do consumo abusivo de bebidas alcoólicas na população brasileira, em 2013, era 13,1%; e em 2019, era 17,1%. Eu não sei se tem algum outro transtorno tão prevalente quanto dependência química no País.”
Finalizando as palestras, Luiz Alberto Silveira apresentou reflexões acerca do tópico “O ser humano no mundo”. “Fazendo uma contextualização, hoje nós somos cerca de oito bilhões de pessoas que vivem a experiência terrestre, mas 110 bilhões de pessoas já passaram pelo planeta Terra. Nós somos consequência de comportamentos, palavras, diálogos, pensamentos, vivências e experiências de cada uma delas. Nós somos uma geração pós-guerra e isso também tem influência em nossas vidas. Tudo passa, se modifica e vai virando passando. Nós evoluímos pela reflexão ou pela dor.”
Texto: Julia Rohrer
Fotos: Alexandre Diniz