APM sedia e organiza 14ª edição do Neurão, principal Congresso da Sonesp

O congresso, que está em sua 14ª edição, aconteceu nos dias 16 e 17 de junho – com pré-congresso nos dias 14 e 15, na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo – reunindo alguns dos mais renomados especialistas da Neurocirurgia brasileira

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Pela primeira vez, a Associação Paulista de Medicina organizou e sediou o maior evento da Associação dos Neurocirurgiões do Estado de São Paulo (Sonesp), o Neurão. O congresso, que está em sua 14ª edição, aconteceu nos dias 16 e 17 de junho – com pré-congresso nos dias 14 e 15, na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo – reunindo alguns dos mais renomados especialistas da Neurocirurgia brasileira.

Na sexta-feira (16), os auditórios da APM estiveram repletos de especialistas buscando aprimorar os seus conhecimentos. Responsável pela cerimônia de abertura, o presidente da Sonesp, Koji Tanaka, relembrou que a pandemia de Covid-19 foi responsável por mudar completamente a realização de eventos científicos no Brasil e no mundo.

De acordo com ele, a Neurocirurgia foi uma das pioneiras na realização de reuniões e congressos on-line, no entanto, pontuou que os eventos presenciais continuam sendo primordiais para o contato pessoal e o networking entre profissionais.

No contexto das boas-vindas, Tanaka demonstrou boas expectativas em relação à parceria com a APM. “Já faz algumas gestões que a sede da Sonesp veio para a Associação Paulista de Medicina. Nós somos os representantes diretos da Neurocirurgia na cidade de São Paulo, então é muito importante essa união. Este evento é o pontapé inicial para verificar a viabilidade e a utilização da estrutura muito profissional da equipe da APM, instituição que também realiza grandes eventos de outras especialidades. Queremos que com a Neurocirurgia seja a mesma linha, para cada vez fazermos eventos de maior magnitude.”

Técnicas eficientes

Entre as muitas atividades científicas da programação, a primeira palestra internacional da sexta foi com Jacques Morcos, professor de Neurocirurgia no Departamento de Cirurgia Neurológica e Otorrinolaringologia da Universidade de Miami. O especialista apresentou o tema “Cirurgia de Bypass para Isquemia, Moyamoya e Aneurismas Complexos: Lições da Fisiologia de Fluxo e Técnicas Cirúrgicas”.

Ele iniciou a aula destacando o seu apreço pelo assunto, indicando que tentaria trazer novos conceitos por meio de materiais e pesquisas recentes. De acordo com o médico, o seu intuito era aprender com técnicas já realizadas anteriormente por colegas de profissão para, assim, analisar os diversos conceitos existentes em diferentes abordagens. “Eu tento deixar de um jeito simples quando faço bypass em casos de isquemia. Não faço uma larga craniotomia, mas mantenho um direcionamento puro para quem vai receber o procedimento.”

Apresentando casos de pacientes, Morcos demonstrou como a aplicação do bypass funciona na prática, exibindo vídeos de cirurgias em que a utilização do método foi bem-sucedida. Para que o procedimento, de fato, tenha êxito, é preciso que os profissionais reúnam dados dos pacientes prospectivamente no decorrer dos anos, de modo que, ao final da utilização do bypass, devem almejar por resultados altos – caso o número seja baixo, isso indicará que houve um erro técnico na anastomose ou que o paciente nunca precisou ser condicionado a esta intervenção, o que implicaria em um risco desnecessário.

“Eu tive um paciente de 76 anos que sofria de uma série de sintomas agudos, e casos assim se configuram como um desafio, pois não entram tipicamente nos estudos. Como vocês sabem, os testes podem ter uma excelente intravalidade, mas não uma extravalidade, o que significa que os resultados não representam pacientes que vemos diariamente. No entanto, após fazer a amostra 1D1R bypass neste paciente, ele não apresentou mais nenhum sinal suspeito depois da cirurgia. Ele morreu aos 86 anos, de um ataque cardíaco, ou seja, passaram-se 10 anos e ele não teve mais nenhum derrame. Isso demonstra que não preciso de centenas de pacientes para comprovar o ponto de que o bypass ajuda muito em indivíduos previamente selecionados”, explicou.

Neste sentido, o professor salientou os procedimentos por ele realizados no decorrer dos anos, indicando que os resultados foram se aprimorando com o tempo. Entre 1999 e 2006, o médico realizou 14 cirurgias com bypass; de 2007 a 2013, o número de operações saltou para 41; ao passo que, entre 2014 e 2020, as cirurgias efetuadas pelo especialista alcançaram a marca de 107. “Números demonstram que o especialista pode melhorar a sua técnica e ficar cada vez mais eficiente nela.”

Jacques Morcos pôde comprovar que bypasses diretos são muito eficientes em reduzir derrames em casos de Moyamoya sintomática e para pacientes com doença oclusiva aterosclerótica. Há uma alta taxa de patência imediata, e oclusões tardias a longo prazo são, em grande maioria, assintomáticas. Por este motivo, medições de fluxo intraoperatórias, juntamente com uma análise pré-operatória de padrões de perfusão angiográfica, podem ajudar a orientar a técnica exata de bypass, mas não parecem se correlacionar com eventos de oclusão tardia.

“Seria um grande erro abandonar a cirurgia de revascularização por isquemia cerebral. Para ser um micro neurocirurgião vascular, é preciso ser um dançarino, para coreografar os passos ao clipar um aneurisma; um guerreiro, para traçar estratégias e táticas nos procedimentos; um arquiteto, para desenhar e construir bypasses complexos; um atleta, para conseguir lidar com a longa jornada das cirurgias; e um jogador de poker, para conseguir realizar seus blefes”, concluiu.

Inovação

Na segunda atividade internacional do primeiro dia de evento, o médico Luís Henrique Pimenta foi responsável pela palestra sobre “Evolução da cirurgia anterior da coluna”. O neurocirurgião também atua como professor associado da Duke University, em Durham, e da Universidade da Califórnia, em São Diego, local onde atualmente reside, além de já ter presidido uma série de sociedades com foco em coluna espinhal.

Para o especialista, é fundamental que ao se falar sobre a evolução histórica da cirurgia moderna, se dê destaque à inovação – que se configura como a mudança de um produto, de um processo ou de um serviço a fim de que coisas se tornem mais eficientes e, assim, haja uma vantagem no procedimento. “Inovação requer teste e medida do que você conseguiu, e na sequência, saber utilizar as falhas. Uma coisa que eu sempre falo é que só aprendemos com os erros que fazemos, não com o sucesso, você só lembra mesmo dos seus erros, quantas vezes você falha.”

Ele apresentou dados do que representa a cirurgia mais antiga da área moderna, o Alif, que de início era aberto e passou a ser realizado por meio do método transperitoneal. Apesar de ser considerado “antigo”, o procedimento passou a ser realizado apenas nos anos 1990. “A evolução do Alif começou se transformando em uma cirurgia menos invasiva, ainda transperitoneal. Passou a ser retoperitoneal, e dos cages rosqueados e cilíndricos, foi para cages de maior superfície e de titânio”, relembrou.

De acordo com o neurocirurgião, quando se fala no termo de “cirurgia moderna” é porque no passado, todas as técnicas que se faziam eram de acesso posterior, inclusive as artrodeses. “No início, nós tínhamos um procedimento endoscópico em que evitávamos estruturas críticas e mantínhamos os músculos de estabilização da coluna intactos. Mas, o que aprendemos com o futuro foi, ao invés de realizar uma cirurgia minimamente invasiva endoscópica, usar uma técnica ainda menos invasiva, permitindo o acesso 3D, ou seja, com afastadores e luzes para permitir montantes bem maiores.”

Dentre os desafios vividos, Pimenta relembrou que a operação de escoliose degenerativa esteve entre uma de suas maiores dificuldades, uma vez que acreditava não ter capacidade e nem técnica como cirurgião. No entanto, após seis meses morando em São Diego, pôde aprender conceitos de deformidade, passando até mesmo a ser reconhecido por colegas que atuam nesta área.

Finalizando a apresentação, ele destacou que houve uma pequena melhora na área das complicações neurológicas. No que diz respeito à possibilidade de ter lesões, como invasão do peritônio, abertura da alça intestinal e complicações quanto a grandes vasos, a porcentagem é aproximadamente a mesma, indicando que não existe uma grande diferença entre a realização de acesso crono e lateral. Por fim, o especialista exibiu o vídeo da simulação de uma cirurgia que assegura a realização do procedimento em cinco minutos, o que será um pontapé para revolucionar ainda mais a área.

O Neurão prosseguiu ao longo de todo o sábado (17), trazendo alguns dos principais temas relacionados à Neurocirurgia, com palestras nacionais e internacionais que contribuíram para elucidar de forma eficiente a abordagem de diferentes assuntos.

Fotos: Alexandre Diniz