Na última quarta-feira, 11 de novembro, a Associação Paulista de Medicina transmitiu a 23ª edição do Webinar APM, com o tema “Covid-19 prevenção: EPIs e circulação de ar em interiores”. O encontro foi apresentado pelo presidente da entidade, José Luiz Gomes do Amaral, e moderado pelo diretor Científico, Álvaro Nagib Atallah.
“Esse é um dos temas que esperei ansioso, já que é um assunto que vai se avolumando em termos de evidências. Os fatos vão progressivamente se confirmando. Ontem mesmo saiu uma pesquisa em que os pacientes foram seguidos pelo celular e verificou-se que em ambientes fechados de restaurantes em áreas pobres houve maior transmissão”, introduziu Atallah.
O primeiro convidado da noite foi Eduardo Medeiros, professor Associado e Livre-Docente da disciplina de Infectologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM/Unifesp). Já são cerca de 11 meses de convívio com a Covid-19, lembrou o especialista, que reforçou que a transmissão da doença se dá, sobretudo, por gotículas.
“Daí a importância do uso de máscaras, que não deixam as gotículas passarem. Se elencássemos as medidas de controle do vírus, certamente a máscara estaria no topo.” Medeiros também lembrou que o coronavírus pode ser transmitido por meio dos aerossóis, que podem ser transportados pelo ar em distâncias superiores a 1,5 metro. Em sua visão, essa transmissão é mais forte em ambientes fechados e mal ventilados.
“Há, ainda, outra forma de transmissão: os fômites. São as pequenas gotículas que se sedimentam em superfícies como teclados, telas, ou qualquer ambiente próximo. Se alguém está falando, as gotículas chegam a cerca de 1,5 metro. Se fala alto ou canta, até 2 metros. Nesses casos, o vírus pode permanecer viável por horas. Em algumas condições, em tempo superior a 20 horas”, explicou Medeiros.
Ele ressaltou que a transmissão do vírus é agravada em ambientes com ar recirculado, sem troca com o meio externo, e má ventilação. Para exemplificar, Medeiros – que também é presidente da Sociedade Paulista de Infectologia – mostrou o caso de três famílias almoçando junto, em um restaurante, em que 10 pessoas sentadas em uma mesma mesa foram contaminadas.
Qualidade do ar
Para falar justamente da importância do ar na transmissão do vírus, outro convidado foi Oswaldo Bueno, engenheiro consultor da Associação Brasileira de Refrigeração, Ar-Condicionado, Ventilação e Aquecimento (Abrava). Ele iniciou sua apresentação mostrando
cartas, escritas pelo padre jesuíta José de Anchieta, no século XVI, no Brasil Colônia, que indicavam como já naquela época os indivíduos se preocupavam com a qualidade do ar, tanto em ambientes externos, quanto internos.
O engenheiro também mostrou indicações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do Ministério da Saúde que tratam sobre filtros de ar-condicionado. A pasta do Executivo indica: verificar e eliminar sujeira, danos e corrosão, medir diferencial de pressão, verificar e eliminar frestas dos filtros e limpar ou substituir quando necessário. Já a Agência recomenda limpeza mensal ou, em caso de filtro descartável, o uso até a sua obliteração, com máximo de três meses.
Mais especificamente relacionado à Covid-19, a Abrava, como apresentou o engenheiro, tem indicações que podem reduzir os riscos de contaminação. A entidade define como recomendável, por exemplo, utilizar filtros com maior eficiência que possam ser instalados sem alteração na estrutura e que, durante o uso em modo ventilação, aumentem de forma significativa a renovação de ar dos ambientes.
Também são recomendações da Associação: aumentar a frequência das inspeções de manutenção, verificando a necessidade de substituição do filtro e higienização dos equipamentos; abrir o registro de ar externo e portas externas que permitam o aumento de renovação de ar. E, sublinha: não deve haver atividades com permanência de pessoas em ambientes sem aberturas para o exterior e sem renovação de ar natural (portas e janelas).
Debate
Após as exposições, os especialistas e os anfitriões, com participação dos espectadores, discutiram os principais temas abordados durante o webinar. Álvaro Atallah, por exemplo, questionou se a diferença de altura de crianças e adultos tem, realmente, papel preponderante nos baixos níveis de transmissão entre os pequenos e seus responsáveis.
“A criança ainda é uma grande interrogação e a grande maioria é assintomática. A ideia que temos é que elas tenham diminuição dos receptores do vírus. De toda forma, o que se vê nas crianças – e isso é um pouco controverso – é que elas têm menor carga viral. Então, a transmissibilidade delas é menor do que a pessoa sintomática com doença em atividade, em que o vírus está sendo multiplicado em grande quantidade”, respondeu o infectologista Eduardo Medeiros.
O presidente da APM, por sua vez, afirmou que algumas das discussões o farão repensar práticas adotadas como rotina na profissão. “Na Escola Paulista de Medicina, operamos pacientes no primeiro horário da manhã em uma sala não utilizada durante a noite, livre de anestésicos (que podem causar doenças como a hipertermia maligna, quando inalados). Essa rotina, porém, talvez não seja tão eficiente. Porque percebi que o número de horas que precisamos de ventilação, em um centro cirúrgico, ultrapassa as 12 horas de um período noturno. Acho que temos que rever isso e nos debruçar com mais atenção sobre esse hábito”, avaliou José Luiz Gomes do Amaral.
Ele também refletiu se, daqui para a frente, haverá modificações significativas na sociedade. “Penso que aprendemos muito com a pandemia, como a gripe espanhola em sua época nos ensinou. Será que vamos levar isso adiante? Precisamos colocar em prática o que temos aprendido, pois a vacina não chegará até o Natal. Espero que até o Natal do ano que vem chegue, mas não será suficiente para nos reposicionar socialmente. Vamos ter que levar mais a sério as evidências que aqui foram levantadas”, resumiu Amaral.
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