Pesquisa traça origem de paralisia facial congênita

Dois cientistas brasileiros fazem parte de um time internacional de pesquisadores que encontrou de forma inédita uma mutação relacionada à paralisia facial congênita hereditária, um tipo de malformação rara que leva o bebê a nascer com perda da movimentação e da sensibilidade de músculos da face

O que diz a mídia

Dois cientistas brasileiros fazem parte de um time internacional de pesquisadores que encontrou de forma inédita uma mutação relacionada à paralisia facial congênita hereditária, um tipo de malformação rara que leva o bebê a nascer com perda da movimentação e da sensibilidade de músculos da face. O estudo que detalha a descoberta foi publicado ontem na revista Nature Genetics, uma das mais prestigiosas na área.
A ideia do trabalho teve início há 2 7 anos, quando cientistas holandeses investigaram 20 pessoas com o diagnóstico na mesma família e localizaram alterações em uma região genética do cromossomo 3. Na época, eles mapearam 25 potenciais genes que poderiam carregar uma mutação que seria associada à doença.
Porém, mais de duas décadas depois, algo que até então imaginava-se que seria mais simples tornou-se um desafio. Isso porque nenhum dos genes identificados foi ligado com sucesso ao diagnóstico. Foi então que uma equipe de pesquisadores se juntou para analisar 14 famílias com a paralisia, uma delas brasileira.
Entre eles, nomes da Universidade de Harvard, de Yale, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), da Escola de Medicina do Mount Sinai e do Instituto Nacional para Pesquisa do Genoma Humano, todos nos Estados Unidos. Do Brasil, participaram os médicos Salmo Raskin, diretor do Laboratório Genetika, em Curitiba, e Mário Teruo Sato, professor de oftalmologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
FORADOSGENES Após uma extensa análise dos pacientes, comparando aqueles com e sem a paralisia, eles confirmaram que a região do cromossomo 3 estava ligada à doença, mas descobriram que as alterações não estavam nos genes mapeados, e sim em locais de fora dos genes que regulam suas funções.
—Um gene é uma sequência do DNA que dá origem a uma proteína. No nosso DNA, 1% é composto por genes (exoma), e o resto por regiões que regulam suas funções. No início, diziam que essa parte de fora era até “lixo genético”, mas recentemente descobrimos que esses outros 99% na verdade têm funções muito importantes. Existem genetocistas que consideram até mesmo mais importante que os próprios genes — explica Raskin, um dos autores do estudo e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Genética Médica.
Eles observaram que as variantes genéticas estavam situadas próximas a um gene chamado GATA2, e regulavam a sua função, acentuando ou silenciando a sua produção. Esse gene atua em mecanismos críticos no desenvolvimento embrionário, um deles sendo a produção de neurônios motores branquiais faciais. São eles que dão origem ao nervo facial, responsável pelo estímulo nervoso que chega aos músculos e fazem a expressão do rosto.
No caso da família brasileira, por exemplo, foram identificadas 26 mil bases nitrogenadas (partes do DNA) duplicadas na região, o que desregulou a produção do gene GATA2. Com isso, a formação dos neurônios foi afetada, e o indivíduo desenvolveu a paralisia. O geneticista explica que, nos pacientes com o diagnóstico, o número dessas células motores varia entre 280 e 1.680, enquanto o ideal é uma quantidade que vai de 5.030 a 8.700.
Além disso, por se tratar de uma mutação dominante, o estudo mostrou que apenas um dos genitores ter a alteração já é suficiente para uma chance de 50% de o filho nascer com a paralisia. O trabalho envolveu ainda camundongos geneticamente modificados para apresentarem a disfunção no GATA2, o que confirmou a hipótese.
O especialista conta que esse entendimento sobre o papel das regiões do DNA que regulam os genes, anteriormente descartadas, é algo novo na ciência, por isso levou quase três décadas para que o trabalho iniciado na Holanda fosse concluído.
—Durante quase duas décadas o foco da ciência foi nos genes. Não estava errado, isso esclareceu a causa de milhares de doenças genéticas, mas chegamos num momento em que boa parte do que ainda precisa ser respondido não vai ser encontrado ali —explica Raskin.

Fonte: O Globo