Há 10 anos, o Sistema Único de Saúde (SUS) oferece para crianças e adolescentes o imunizante contra o HPV (sigla em inglês para papilomavírus humano), a principal forma de prevenir contra a infecção sexualmente transmissível (IST) mais comum no mundo, associada ao desenvolvimento da maioria dos cânceres de colo de útero, entre outros tumores. Apesar da importância da vacinação para o combate à doença, dados no Ministério da Saúde mostram uma diminuição na cobertura vacinal em geral, especialmente entre os meninos.
Entre 2014 e 2023, 70,9% das meninas brasileiras receberam a primeira dose, enquanto apenas 54,3% delas foram imunizadas com a segunda dose. No caso dos meninos, o índice é ainda pior: 45,3% receberam a primeira dose, e apenas 27,7% a segunda.
É importante ressaltar que a cobertura vacinal contra HPV não é calculada anualmente, como acontece com os demais imunizantes, pois a vacinação é feita em duas doses, sendo que a segunda pode ser aplicada no ano seguinte ou em outro momento. Por isso, os números do Ministério da Saúde são calculados pela soma das doses aplicadas desde a introdução da vacina até o ano vigente.
A vacina disponível no SUS previne contra os tipos 6, 11, 16 e 18 do vírus, os mais frequentes na população entre os mais de 200 tipos capazes de infectar a mucosa oral, genital e anal de homens e mulheres.
“A vacina quadrivalente está disponível gratuitamente nos mais de 38 mil postos de vacinação para meninas e meninos de 9 a 14 anos, pessoas com imunossupressão, o que inclui as que estão vivendo com Aids, transplantadas e pacientes oncológicos de 9 a 45 anos também podem ser imunizados. No ano passado, a vacina foi incluída também para as vítimas de abuso sexual de 9 a 45 anos, homens e mulheres”, diz Draurio Barreira, diretor do Departamento de HIV/Aids, Tuberculose, Hepatites Virais e Infecções Sexualmente Transmissíveis do Ministério da Saúde.
A vacina é produzida com proteínas que fazem parte da cápsula viral, ou seja, apenas com uma parte do vírus que age estimulando a imunidade e a produção de anticorpos para cada tipo de HPV. Assim, ela é uma vacina inativa e que, por isso, não é capaz de produzir doenças.
“Ela comprovadamente tem impacto na prevenção dos principais subtipos de alto risco de infecção, especialmente o 16 e o 18, que podem resultar em cânceres, especialmente o de colo de útero”, afirma Barreira, que também explica que a vacinação contra o HPV deve acontecer durante a infância, porque é importante que o jovem esteja imunizado antes de iniciar a vida sexual.
As infecções provocadas pelos tipos 16 e 18 representam cerca de 70% dos casos de câncer de colo de útero no mundo. Pesquisas feitas no Reino Unido e na Suécia mostraram ainda que a vacina quadrivalente foi capaz de reduzir esse tipo da doença em mais de 80%. O Estudo Epidemiológico sobre a Prevalência Nacional de Infecção pelo HPV (POP-Brasil), realizado pelo Hospital Moinhos de Ventos, no Rio Grande do Sul, e financiado pelo Ministério da Saúde, revelou que o subtipo 16 é de alto risco e é o mais prevalente no Brasil.
Campanha de multivacinação
Para tentar aumentar a cobertura vacinal, o governo federal lançou a campanha de multivacinação que inclui o imunizante contra o HPV. Desde o início de 2022, uma série de esforços está sendo colocada em prática para a recuperação das altas coberturas e da cultura da vacinação no país. O intuito do Ministério da Saúde é resgatar na população a confiança nos imunizantes, evitar o retorno de doenças erradicadas e que o Brasil possa voltar a ser referência mundial no tema.
“A prioridade do Ministério da Saúde atualmente é aumentar as coberturas da vacina quadrivalente. A queda da cobertura vacinal contra o HPV nos últimos anos representa uma ameaça concreta à saúde de milhões de jovens brasileiros e pode levar a um aumento dos casos de infecção e cânceres evitáveis no futuro”, diz Barreira.
Quando se trata da rede privada de saúde, a vacina está disponível para todos os públicos de 9 a 45 anos de idade. “Em alguns casos, como uma mulher de 50 anos que acabou de se separar e vai começar a se relacionar com outras pessoas, o imunizante também pode ser recomendado”, diz a ginecologista, obstetra e sexóloga do Hospital Israelita Albert Einstein, Renata Bonaccorso Lamego.
O serviço particular de saúde também oferece a versão nonavalente. “Ela foi aprovada em 2018 pelo FDA (agência reguladora ligada ao departamento de saúde dos Estados Unidos), mas só chegou ao Brasil em março de 2023 por causa da pandemia. Ela é indicada para o mesmo público e tem o acréscimo da proteção de mais cinco tipos do vírus, o que elevou a proteção contra o câncer de colo de útero de 70% para 90%”, explica a médica.
Maioria das mulheres sexualmente ativas tem HPV
O HPV é um grupo de vírus que infecta a pele e as mucosas, principalmente, através de contato sexual, seja pelo contato da pele com pele ou pele com mucosa. Por isso, o contágio pode acontecer mesmo com o uso do preservativo, o que faz com que mudanças comportamentais no que diz respeito às relações sexuais e a vacinação sejam muito importantes.
De acordo com o Ministério da Saúde, cerca de 80% das mulheres sexualmente ativas serão infectadas por um ou mais tipos de HPV em algum momento de suas vidas. A maioria delas costuma ser transitória e é eliminada naturalmente pelo sistema imune, com regressão entre seis meses e dois anos, após a exposição, sem causar maiores problemas. Em alguns casos, no entanto, surgem verrugas na região genital e na boca.
Se a doença não for tratada adequadamente, pode desencadear lesões que são precursoras de câncer, principalmente o de colo de útero. Ao contrário do que muita gente imagina, o HPV também pode afetar homens.
“Nesse caso estima-se que a prevalência seja de 30% e o contágio está associado a câncer de pênis, ânus, boca e orofaringe”, conta a ginecologista do Einstein. Nas mulheres, além do câncer de colo de útero, ele pode estar por trás de câncer de vulva, vagina, boca e orofaringe.
Além da vacinação, as mulheres devem fazer o papanicolau, exame ginecológico preventivo, para identificar as lesões precursoras do câncer do colo do útero. Inicialmente, o exame deve ser feito anualmente. Após dois exames seguidos (com um intervalo de um ano) apresentando resultado normal, o preventivo pode ser feito a cada três anos.
Fonte: AGÊNCIA EINSTEIN