Estudantes de Medicina cresceram 71% em seis anos, e residentes apenas 26%, destaca estudo

Como consequência, o País tem atualmente mais de 210 mil médicos generalistas que não concluíram residência nem obtiveram título de especialista

Notícias em destaque

Nos últimos anos, o Brasil registrou um aumento significativo na oferta de novos cursos de Medicina, que resultou no crescimento do número de profissionais formados que ingressam no mercado. No entanto, as vagas para Residência Médica (RM) não acompanham o mesmo ritmo, contrariando a Lei do Mais Médicos, que determina a oferta de vagas de RM equivalente ao número de egressos dos cursos de graduação do ano anterior.

Panorama da Residência Médica: Oferta, Evolução e Distribuição de Vagas (2018-2024), realizado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e pela Associação Médica Brasileira (AMB), destaca os riscos associados a essa defasagem.

No período analisado, o número de estudantes de Medicina no Brasil aumentou 71%, enquanto o de médicos residentes cresceu apenas 26%. Como consequência, o País tem atualmente mais de 210 mil médicos generalistas que não concluíram residência nem obtiveram título de especialista por meio de uma sociedade de especialidade filiada à AMB — as duas únicas modalidades de titulação reconhecidas pela legislação.

Redução de vagas em especialidade cirúrgicas
De 2018 a 2024, observou-se um aumento nas vagas de primeiro ano (R1) na maioria das 55 especialidades médicas reconhecidas no País, com destaque para Medicina de Família e Comunidade, Clínica Médica, Medicina Intensiva e Ginecologia e Obstetrícia. No entanto, o coordenador do estudo, Mario Scheffer, alerta para a redução de vagas em 14 especialidades, incluindo várias cirúrgicas, como Cirurgia Oncológica e Radioterapia, que são importantes para o tratamento do câncer.

Sudeste concentra 50% das vagas
Apesar da concentração geográfica desigual de vagas, com mais da metade dos residentes localizados nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, a pesquisa destaca como um “achado positivo” a expansão da oferta nas demais regiões do País, ainda que em ritmo insuficiente. 

“Ainda serão necessárias novas iniciativas e políticas para que essa distribuição mais equitativa de residentes resulte, no futuro, em uma melhor distribuição de médicos especialistas nos serviços ambulatoriais e hospitais do SUS, especialmente nas áreas distantes dos grandes centros,” afirma Scheffer.

20% de vagas de RM estão ociosas
Se, por um lado, faltam oportunidades de formação, por outro, a pesquisa revela que, em 2024, cerca de 20% das vagas de residência médica credenciadas pela Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM/MEC) ficaram desocupadas. Para Scheffer, solucionar essa desocupação exige maior financiamento, formação de preceptores e uma compreensão mais aprofundada dos motivos que levam à baixa procura ou desistências em determinados programas.

O diretor Científico da AMB, José Eduardo Dolci, levanta uma outra questão preocupante. Nos últimos anos, uma nova e polêmica modalidade tem crescido: a pós-graduação em Medicina, com cursos de 360 horas oferecidos por instituições privadas. “Em apenas um ano, o residente tem mais de 2.880 horas em serviço”, cita Dolci como comparação.

A qualidade da residência é insubstituível, alerta, também sobre o alarmante aumento na abertura de faculdades de Medicina no País nos últimos anos e sobre o baixo interesse dos médicos recém-formados em fazer a residência médica, algo que vem preocupando as entidades do segmento.

Olhar para o futuro
O coordenador da pesquisa destaca a urgência de estabelecer a real capacidade e as condições necessárias para a expansão da Residência Médica no País. “Esperamos que nossa pesquisa possa contribuir para a gestão, o planejamento e a tomada de decisões,” conclui.

O presidente da AMB, César Eduardo Fernandes, lembra que o País está formando 40 mil médicos por ano e dentro de poucos anos serão 1 milhão de médicos em atividade. “Por habitantes, nós temos mais médicos que os Estados Unidos e a França. E para piorar, temos médicos que estão saindo com muitas deficiências dessas escolas. Não por culpa deles, mas por culpa do aparelho formador. Por isso, achamos que é preciso exigir um exame de proficiência dos médicos, para que eles atestem qualidades que os permita trabalhar para a assistência à população, como já acontece com os advogados”, explica. E conclui. “Entendemos que o problema do Brasil não é falta de médicos. O ponto é: qualidade”.

Panorama da Residência Médica
Os resultados do estudo fazem parte da pesquisa Demografia Médica no Brasil, coordenada desde 2010 por Mário Scheffer, da FMUSP, e apoiada atualmente pela AMB, pelo Ministério da Saúde, pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Os dados sobre Residência Médica utilizados no estudo foram fornecidos pela Secretaria de Educação Superior (Sesu) do Ministério da Educação (MEC), por meio do Serviço de Acesso a Dados Protegidos (Sedap) do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).

Para acessar o conteúdo completo do estudo, clique aqui.

Com informações e imagem da AMB