Yussif Ali Mere Jr – É necessário ver valor na parceria com o setor privado

“Precisamos que o Ministério da Saúde veja valor em pagar mais barato em um procedimento que pode ser mais resolutivo para o cidadão”, diz o presidente do Sindhosp

Entrevistas

Yussif Ali Mere Jr é nefrologista e presidente da Federação e do Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Laboratórios do Estado de São Paulo (Fehoesp/Sindhosp). Na avaliação que faz abaixo, elogia o que há de positivo no SUS, como os tratamentos oncológicos e de AIDS, mas tem ressalvas quanto ao financiamento. Em sua visão, o caminho para um sistema que funcione pode estar nas parcerias público-privadas.

MOTIVO DE ORGULHO

É muito positivo que o SUS, desde sua implantação, tenha o princípio da universalidade no atendimento. É uma coisa que precisamos manter, não podemos viver em uma sociedade sem assistência para todos, ainda que tenha de existir alguma modificação. Foram muitos avanços, nós podemos nos orgulhar do sistema. O aspecto epidemiológico, com aumento da vacinação, é fantástico. Como também é o tratamento da AIDS e os transplantes. Temos que focar nos bons exemplos do SUS. O aumento de pacientes fazendo uso de hemodiálise também é notável.

“Não se pode dar tudo, para todos, a qualquer tempo. Em nenhum país do mundo isso acontece.”

FINANCIAMENTO É ENTRAVE

Precisamos de algum imposto que financie a Saúde – não estou falando de aumentar a carga, mas sim que o Governo precisa definir exatamente de onde virá o dinheiro. Também temos que melhorar a qualidade do gasto público. A parte política, por exemplo, gasta muito, com verbas para cada parlamentar. Nesse setor há dinheiro para financiar a Saúde, não podemos tirar mais da população. Precisamos definir para onde vai o dinheiro que arrecadam de nós. Temos que dar importância à qualidade do gasto público: ver o bolo de dinheiro disponível e definir adequadamente a sua aplicação.

NIVEL PRIMÁRIO

Hoje, a atenção básica que temos custa caro e não traz a solução necessária. Precisamos resolver esse problema não só com verba, mas com um programa eficiente, com uma Estratégia de Saúde da Família (ESF) adequada. O médico faz o diagnóstico e prescreve, mas não acolhe o paciente. Esse acolhimento é muito mais barato que pagar um médico, já que é feito por agentes comunitários de saúde. Precisamos de mais destes. Também temos que fazer com que os pacientes enxerguem valor quando entram no sistema. Ele preferiria ir a uma Unidade Básica de Saúde (UBS) se soubesse que lá estaria um médico que o conhecesse. Resolver os problemas da atenção básica é, consequentemente, ajudar muito o SUS.

INFRAESTRUTURA SOCIAL IMPORTA

Não apenas em rincões que faltam médicos, mas em cidades médias e nas periferias das grandes cidades. É um problema de infraestrutura que deve ser atacado. Não só a infraestrutura médica, mas social. Como é o bairro que o médico irá? Tem policiamento adequado? Tem equipamentos sociais? É esse o ponto. O médico não irá para um lugar em que não tenha condição de viver com sua família, por maior que seja o salário.

MINISTÉRIO DA SAÚDE

Entre a saída do Alexandre Padilha e a entrada do atual ministro Ricardo Barros, a Saúde ficou numa negociação como qualquer outro ministério. Um erro, já que a pasta depende de políticas horizontais, não verticais, com um quadro estável de servidores. O Ministério da Saúde não pode depender da política de cada governo. Também precisamos de um presidente que enxergue a Saúde como investimento, e não como gasto.

MUDANÇAS

O SUS tem que ser reformulado. A começar pela integralidade, que é uma letra morta. Quem consegue ter tudo do SUS, a qualquer tempo, é quem tem bons advogados e recursos. A população em geral não obtém o mesmo, tanto que temos óbitos em filas. Não defendo o fim da universalidade, mas se eu tenho e opto por um plano de saúde, creio que deveria recorrer a ele, e não ao sistema público. Na Inglaterra se discute uma série de limitações, enquanto no Canadá já existe fila para atendimento de idosos. Creio que o SUS precisa avançar nas parcerias público- privadas. A iniciativa privada executa os serviços com mais eficiência e menos custos. Precisamos que o Ministério da Saúde veja valor em pagar mais barato em um procedimento que pode ser mais resolutivo para o cidadão.

YUSSIF ALI MERE JR
ESPECIALIDADE Nefrologia
CARREIRA Presidente da Associação Brasileira dos Centros de Diálise e Transplante (2016 a 2018)
OCUPAÇÃO Presidente da Federação e do Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Laboratórios do Estado de São Paulo (Fehoesp/Sindhosp)

Entrevista publicada na Revista da APM – edição 696 – janeiro/fevereiro 2018