Natural de Rondônia, José Hiran da Silva Gallo se formou em Medicina pela Universidade do Estado do Pará e se especializou em Ginecologia e Obstetrícia. Concluiu doutorado em Bioética e Ética Médica pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, em Portugal, e pós-doutorado em Bioética na instituição, onde atua como docente voluntário.
Além de membro da Academia de Medicina de Rondônia, foi presidente do Conselho Regional de Medicina do estado e, desde abril de 2022, é presidente do Conselho Federal de Medicina. Na entrevista a seguir, ele fala sobre as recentes decisões sobre a abertura de vagas e faculdades de Medicina. Ele também foi entrevistado no APMCast, que pode ser conferido no site da APM, YouTube, Spotify e Deezer, falando sobre sua trajetória pessoal e profissional.
Como avalia a decisão do ministro Gilmar Mendes, que determinou que os novos cursos devem seguir as regras do programa Mais Médicos, seguindo o modelo de chamamento público?
A expansão de vagas sem parâmetros e pressupostos que garantam qualidade à formação dos médicos preocupa o CFM. O Conselho atua em defesa da qualidade da formação e luta pelo rigor de critérios técnicos. Há muitos anos, a autarquia se posiciona contra a abertura de novos cursos de Medicina sem o preenchimento mínimo de critérios técnicos, por entender que o País já dispõe de uma grande quantidade de faculdades. Por isso, a decisão do ministro de determinar que a abertura de novos cursos na área deve ocorrer somente após chamamento público, além de exigir infraestrutura adequada no município que vai sediar a escola médica, é positiva.
Os chamamentos públicos definem, por exemplo, os locais onde devem ser abertos os cursos para, em tese, atender lacunas como a falta de médicos. Sabendo que cidades remotas sofrem com a falta infraestrutura, como é possível pensar em qualidade de ensino?
O ideal para que haja qualidade do ensino é que os municípios que sediam as escolas médicas ofertem, pelo menos, um hospital de ensino. E, para cada aluno ingressante, ofereça pelo menos cinco leitos de internação hospitalar efetivamente ocupados, determinados como exclusivos em contratos entre as instituições de Saúde e de ensino, e que tenha no máximo três alunos para cada equipe da saúde da família.
Acredita que a nova regra para a abertura de cursos pode ser positiva de alguma forma?
Acreditamos que a decisão do ministro é positiva porque, além de exigir o chamamento público, ainda leva em conta, por exemplo, a relevância e a necessidade social da oferta de curso de Medicina no local, assim como os critérios de qualidade da instituição de ensino superior – se há infraestrutura adequada, entre outros pontos.
O que acredita ser necessário no Brasil para resolver a questão das escolas médicas?
Para evitar a abertura desordenada e sem critérios de escolas médicas no Brasil, acreditamos que as portarias do Ministério da Educação (MEC) 2/2013 e 13/2013, que trazem recomendações sobre o número ideal de profissionais e de hospitais de ensino, por exemplo, sejam restabelecidas e atualizadas. Em março, encaminhei ofício ao MEC no qual pedi a criação urgente de um grupo de trabalho, com o objetivo de definir critérios objetivos para a autorização de funcionamento de novos cursos de Medicina no País. A proposta de iniciar a discussão, com o intuito de regulamentar esse processo, foi feita pelo próprio ministro da pasta, Camilo Santana,
em reunião com representantes do movimento médico.
Como seria a atuação desse grupo de trabalho?
Esse grupo de trabalho, já prometido pelo ministro, contaria com a participação de representantes do MEC, do Ministério da Saúde e das entidades médicas para definir parâmetros de regulamentação de abertura e aumento de vagas em cursos de Medicina. A medida contemplaria o fluxo, os procedimentos e o padrão decisório dos atos de autorização, reconhecimento e renovação para o seu funcionamento, bem como seus aditamentos. Defendemos que os municípios que sediam as escolas médicas têm de ofertar um hospital de ensino. Para cada aluno ingressante, têm de oferecer pelo menos cinco leitos de internação hospitalares efetivamente ocupados, determinados como exclusivos em contratos entre as instituições de saúde e de ensino; e terem no máximo três alunos para cada equipe da saúde da família.
É a favor de exames do progresso e de proficiência para os formados em Medicina no Brasil?
O Conselho Federal de Medicina é a favor de exames de progresso a cada dois anos do curso. Com isso, não seria necessário, por exemplo, exames de proficiência.
Como entende que possa ser resolvida a falta de médicos em locais distantes dos grandes centros?
Defendemos o financiamento adequado da Saúde, permitindo a melhoria e a implementação da nossa rede de atendimento nos níveis primário, secundário e terciário, além de uma política salarial mais justa, inclusive prevendo a criação da carreira de médico como carreira típica de Estado, para que se possa assegurar uma assistência mais digna à população brasileira. Para viabilizar a adesão do maior número de profissionais possíveis no interior, o CFM recomenda que o Estado proporcione condições adequadas de atendimento, por meio da instalação de Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) e de laboratórios de análises clínicas; monitoria (presencial e a distância) vinculada a programas de extensão de escolas públicas de Medicina; acesso a insumos e equipamentos de diagnóstico e terapia; apoio de equipe multiprofissional; e rede de referência e contrarreferência (leitos, exames e outros procedimentos). Todos são itens fundamentais para conseguir fixar os médicos nas regiões mais distantes.
Publicada na edição 739 – Agosto/Setembro de 2023 da Revista da APM
Foto: Divulgação CFM