Linamara Rizzo Battistella e Marilene Rezende Melo – Representação feminina

Linamara Rizzo Battistella e Marilene Rezende Melo compõem a nova diretoria da Academia de Medicina de São Paulo

Entrevistas

Professora Titular de Fisiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, criadora da Rede de Habilitação Lucy Montoro e presidente do Conselho Diretor, Linamara Rizzo Battistella foi secretária estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência de SP, diretora Científica da APM e acaba de tomar posse como vice-presidente da Academia de Medicina de São Paulo.

Marilene Rezende Melo, primeira tesoureira da instituição, já presidiu a Associação Brasileira de Mulheres Médicas e a Associação Mundial das Sociedades e Laboratórios de Patologia, além de ter sido diretora da APM e da AMB em várias gestões. Em entrevista à Revista da APM, as médicas falam sobre a participação feminina em entidades representativas e o papel da Academia para a profissão e a sociedade.

REVISTA DA APMComo resumem a importância da Academia de Medicina de São Paulo?
LINAMARA: As Academias têm um papel muito relevante na construção dos conceitos que a sociedade abraça, porque não representam as especialidades e não têm interesses pontuais em ações que possam significar relação com a indústria ou fontes pagadoras. Elas reúnem cérebros, especialistas e experiências que vão se materializando na forma de novos conceitos e refletem o modelo em que a sociedade vive e as perspectivas para o futuro. Por isso, são relevantes nessa prospecção dos caminhos que a Saúde, a Medicina, os médicos e os estudantes devem seguir.
MARILENE: A Academia de Medicina de São Paulo, que tem 124 anos, é uma grande instituição, com professores e médicos gabaritados, com cargos mundiais e grande produção científica e, principalmente, éticos.

Como a instituição contribui na prática para a profissão?
LINAMARA
: Cada um de nós sai dos eventos e reuniões da Academia com o desejo de inovar e é da somatória destas experiências que se traduz a proposta de mudança. O que nos falta, talvez, seja um mecanismo mais consistente de comunicação com a sociedade em temas relevantes que fazem parte do cotidiano e que precisam estar atrelados à saúde e ao desenvolvimento humano. Cito como exemplos as questões do meio ambiente, que envolvem mudanças climáticas ou defensivos agrícolas; e as da mobilidade, que podem levar a maior número de acidentes ou significar mais conforto e tempo livre para o lazer e entretenimento. Tudo isso tem significado na Saúde. O que significa hoje qualidade de vida na doença crônica? O que significam os novos fármacos dentro do sistema de custo x eficiência dentro do estado? A Academia tem de trazer esses temas, discutir e ajudar o Governo e a sociedade como um todo a se posicionar.
MARILENE: Precisamos, inclusive, participar do momento atual brasileiro, dando enfoque a vários pontos importantes de discernimento da saúde pública, com a nossa opinião oficial. Não podemos apenas observar o que acontece, temos de ter uma participação mais ativa, principalmente sobre os desafios na área da Saúde. Creio que vai ser uma diretoria muito atuante.

Hoje, as mulheres já são maioria na Medicina, mas ainda minoria nas entidades representativas. Qual a avaliação de vocês sobre isso?
LINAMARA:
  A Medicina, a Saúde, os médicos e as entidades representativas ainda não abraçaram a causa da igualdade entre as pessoas. Se abraçassem a causa das diferenças que compõem os organismos femininos e masculinos e dos direitos igualitários entre homens e mulheres, teríamos avançado muito – como nossa sociedade fez no conhecimento da Aids e do câncer nas últimas duas décadas, por exemplo. Se abraçarmos a causa da igualdade dentro da vida associativa, certamente levaremos isso para a assistência à Saúde, pesquisa e modelo social. Falta uma posição diferente das nossas instituições. Vejo pessoas que fizeram a diferença em inúmeras áreas, mas ainda não vejo uma voz forte garantindo o direito de todos.
MARILENE: Infelizmente, a participação feminina ainda é baixa nas entidades representativas. Como vice-presidente da Associação Brasileira de Mulheres Médicas, sempre defendi a bandeira de colocar mais mulheres nas instituições. E a mulher médica precisa aprender a falar, a brigar e a defender suas opiniões.

O que pensam sobre o ensino médico atualmente?
LINAMARA: Temos ilhas de excelência no estado de São Paulo, mas em alguns locais do País temos problemas gravíssimos, sobretudo nas fronteiras, onde há uma pletora de faculdades sem hospital ou corpo clínico adequado, com custos elevadíssimos. Eu diria que é necessário acompanhamento judicial, porque as pessoas não estão sendo formadas, estamos vendo-as serem enganadas, e também o serão os pacientes. Se esses problemas não estão em São Paulo, eles não deixam de chegar aqui, porque médicos formados em qualquer parte do País podem atuar em nosso estado. Portanto, temos alguns problemas para discutir e para influir, precisamos ter uma posição mais contundente. Existem situações com as quais não podemos ser contemplativos e muito menos negociar. Temos que mostrar nosso descontentamento com essas escolas que não ensinam, com alunos que não se formam e com médicos que não farão uma boa assistência.
MARILENE: Mesmo tendo muitas escolas médicas de referência no estado de São Paulo, como a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, a Escola Paulista de Medicina e a Santa Casa, entre outras, temos que estar atentos à questão pois recebemos profissionais e pacientes de todos os estados brasileiros.

Publicado na edição 708 da Revista da APM – março/2019