Graduado pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM/Unifesp) em 1976, especialista em Anestesiologia e Medicina Intensiva. Ex-presidente da Associação Médica Brasileira e da Associação Paulista de Medicina por dois mandatos, onde ocupa atualmente a posição de diretor Cultural adjunto, além de membro das Academias Nacional e Paulista de Medicina, Amaral conta com extensa atividade associativa no currículo, tendo acumulado grande experiência nos últimos 40 anos. Nessa entrevista à Revista da APM, ele faz seu diagnóstico acerca dos cursos oferecidos pelas escolas médicas brasileiras e sobre proposições de avaliações terminais, entre outros assuntos.
PANORAMA DA EDUCAÇÃO MÉDICA
Hoje, existem no Brasil 271 escolas médicas. Número esse incerto face às notícias de que, a qualquer momento, dezenas de outras sejam autorizadas. Neste quesito, portanto, as cifras brasileiras ultrapassam quase todos os países do planeta. [De acordo com o site escolas médicas, perdemos apenas para a Índia, que tem população superior a 1,2 bilhão de pessoas e 381 escolas médicas, e estamos à frente da China, com mais de 1,3 bilhão de habitantes e 150 faculdades de Medicina.]
MÉDICOS INSERIDOS NO SISTEMA DE SAÚDE
A Medicina atual insere-se no sistema de saúde, estrutura que agrega instalações e recursos materiais, bem como a multiplicidade de valências em recursos humanos, organizados no sentido de facilitar o acesso das populações à atenção. Assim, o número de médicos tem de ser proporcional às dimensões do sistema de saúde e este, apropriado ao número e à distribuição dos habitantes do país.
DISTRIBUIÇÃO DOS PROFISSIONAIS
O sistema de saúde, por sua vez, depende de investimento e boa gestão. Investe-se muito pouco e mal em saúde pública, assim temos uma atenção à saúde limitada e ineficiente. Consideradas as limitações do sistema brasileiro tem-se hoje excedente de médicos. A má distribuição, no que concerne à relação médicos por habitantes, em determinadas áreas reflete apenas ausência ou presença de saúde suplementar. A educação médica exige campo de prática. Não há espaço, nem qualidade de prática para materializar suficiente formação para tantos alunos. [Conforme pode ser observado no mapa da pág 13, no Distrito Federal e no estado do Rio de Janeiro, por exemplo, a relação de médicos por mil habitantes é de 4,28 e 3,75, respectivamente, acima do preconizado pela Organização Mundial da Saúde e damédia da Europa, EUA, Canadá e Japão. Por outro lado, no Maranhão (0,79) e no Pará (0,91), o índice fica abaixo de países como Vietnã e Guatemala.]
PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA
Se o objetivo do Governo Federal de ter tantos novos médicos fosse fortalecer o Programa de Saúde da Família, o único caminho viável seria valorizar este profissional [por exemplo por meio de Carreira de Estado semelhante a de juízes e promotores]. Nunca subsidiar o programa com profissionais inexperientes e mal valorizados, sobretudo destinando a ele médicos importados sem aferir sua qualificação, por meio da revalidação dos diplomas.
QUALIDADE PROFISSIONAL
Vivemos em um período recente de aviltamento da profissão do médico, refletido não apenas na informalidade dos postos de trabalho oferecidos, mas também pela contínua desmoralização da figura do médico, a quem se imputou a desassistência ao povo. A qualidade na formação médica foi preterida em favor da diplomação em massa. Os resultados serão sentidos profundamente nas próximas gerações. Diplomamos, em 2016, mais de 25 mil médicos, que exercerão a Medicina durante 40 anos ou mais. O impacto do malformado em 2016 será sentido mais ou menos até 2056, a um custo inaceitável de vidas brasileiras.
EXAME TERMINAL
Tenta-se impingir a ideia que um exame terminal penalizaria os alunos. É falso. O exame salvaguarda o interesse do paciente. A Medicina tem como premissa a ética, colocando em primeiro lugar o direito da população. Por outro lado, impedir que um aluno despreparado seja lançado na atividade clínica o defende da má prática, dirigindo-o de volta à escola para que melhore ou, ainda, para uma profissão em que ele possa ter real êxito. Ao redor do mundo, há países que não apenas realizam estas avaliações ao fim dos cursos, mas que também têm crescente preocupação com a atualização e revalidação periódica dos médicos.
OPORTUNIDADE FINANCEIRA
No Brasil, prevalecem os interesses comerciais de grupos escolares, muitas vezes financiadores de campanhas políticas, em detrimento à qualidade da assistência da população. Acrescente-se, ainda, motivações individuais, incluindo médicos e professores em busca de empregos no florescente mercado que hoje representa o ensino médico. [Ainda de acordo com o site escolas médicas, a mensalidade de algumas escolas médicas brasileiras privadas ultrapassa R$ 9 mil mensais, como é o caso da Faculdade São Leopoldo (Mandic), em Campinas (SP); da Universidade de Marília (Unimar), também no estado de São Paulo; e da Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal (Uniderp), no Mato Grosso do Sul. As mais baratas têm mensalidade em torno de R$ 3 mil por mês.