Às vezes, somos tentados a julgar pessoas menos pelo discurso integral ou conjunto de suas ações e mais por palavras ou atos isolados. Isso ocorre sobretudo quando as palavras ou os atos nos atingem diretamente, seja no sentido positivo, seja no negativo. Corre-se então o risco de desconsiderar as várias faces da realidade, as consequências de tais julgamentos e os possíveis contextos futuros.
Como médico, senti-me brutalmente atingido ao ver, ao longo de tantos tristes anos, minha profissão agredida pela ação nociva de grupos autodenominados “progressistas” brasileiros: fomos, os médicos, excluídos do Conselho Nacional de Saúde, desfigurados na “Lei do Ato Médico”, banalizados pela irresponsável multiplicação de escolas médicas e injustamente apontados culpados pelas mazelas decorrentes da gestão corrupta e encharcada de ideologia do nosso sistema público de saúde.
Se alguma esperança restava, dissipou-se ela totalmente com o Programa Mais Médicos, que degradou a formação e desmoralizou a imagem do profissional de Medicina. Sob esse prisma, enquanto médico, não posso esconder profunda ojeriza aos que assim nos trataram e à saúde da nossa população.
Seria esta uma visão parcial, influenciada pela dor de tantas feridas recentes e ainda abertas, não fosse a ubiquidade da corrupção institucionalizada. O “aparelhamento” do Estado e o envenenamento das representações da sociedade chegam a tal extensão que não paira a menor dúvida da monstruosidade do conjunto de ações perpetradas pelos últimos (des)governos.
Alguns dos principais agentes de tal descalabro encontram-se parcialmente imobilizados, mas, com todas as letras, prometem reincidir. Dar-lhes poder será fatal, pois voltarão com violência ainda maior.
A oportunidade que se nos apresenta é afastá-los, e definitivamente. Não os queremos. Estamos cansados deles.
O bambu é sempre lembrado por sua resiliência e flexibilidade. Tais qualidades, as vejo plasmadas na sociedade brasileira. Entretanto, por mais flexível que seja o bambu, ultrapassados seus limites, ele se quebra. Sabe-se que, ao vergá-lo, cria-se condições para que, liberado, ele retorne com energia e ultrapasse o ponto de repouso. Impõe-se atentar para essa eventualidade.
Cabe-nos impedir que se quebre o bambu, tirando-o das mãos dos que o deformaram. É tempo de ação e atenção.
José Luiz Gomes do Amaral, presidente da Associação Paulista de Medicina