No dia 23 de junho deste ano, os cidadãos britânicos foram às urnas decidir o status de sua participação na União Europeia. Com 51,9% dos votos, a maioria da população decidiu pôr fim em uma relação complicada desde o início. Optou-se, porém, por um futuro incerto, que permanece longe de ser definido.
A entrada da Grã-Bretanha (Inglaterra, País de Gales e Escócia) no processo de integração europeu ocorreu apenas em 1973, duas décadas após a criação da primeira “Comunidade Europeia”. Ao longo destes mais de 40 anos, a participação da Grã-Bretanha como membro da União Europeia (UE) foi marcada pelo conflito de interesses entre as vantagens econômicas e comerciais que o mercado único oferece e o preço de uma integração política e social que nunca agradou aos britânicos. De fato, as campanhas pró e contra o chamado BREXIT (“British- Exit”), como ficou conhecido o plebiscito, foram polarizadas justamente em torno deste conflito de interesses.
O resultado a favor da saída foi inesperado, já que as pesquisas apontavam para o cenário oposto. Surpreendente também foi a renúncia do primeiro ministro no dia seguinte às votações. O referendo fora promessa de sua campanha de reeleição de 2013, mas Cameron se eximiu da complicada tarefa de conduzir o processo de retirada da Grã-Bretanha do bloco. A árdua tarefa está agora nas mãos de Theresa May, a nova primeira ministra.
A regra estipulada pela União Europeia é clara: dois anos para a conclusão total do processo. Entretanto, existem três grandes problemas. O primeiro é que este prazo passa a contar a partir do momento em que o governo britânico entregar comunicação oficial a Bruxelas (capital da UE) informando sua saída, o que ainda não ocorreu. A segunda questão é que não se sabe como ocorrerá complicado processo. O terceiro problema é a indefinição do novo caráter da relação entre a Grã-Bretanha e a União Europeia.
Atualmente, mais de 45% das exportações britânicas são destinadas ao mercado europeu, enquanto 53% de suas importações são oriundas do bloco. O mesmo vale para investimentos diretos estrangeiros, com 46,5% do capital aplicado no mercado britânico sendo provenientes dos demais estados membros da União. Em contrapartida, a Grã-Bretanha é um ator de peso nas instituições europeias, tanto pelo tamanho de sua representatividade quanto em termos de influência na agenda do bloco. Há ainda de se ressaltar a integração social, com atualmente cerca de 2,7 milhões de cidadãos europeus residindo no Reino Unido e mais de 1,2 milhão de britânicos na Europa continental.
A indefinição destas questões impacta não apenas nas relações entre os dois parceiros, que agora se divorciam, mas em todos os países que mantêm vínculos importantes tanto com a Grã-Bretanha quanto com a União Europeia. Na perspectiva brasileira, muito se tem especulado sobre o efeito comercial e financeiro, não tanto em nosso mercado, mas no futuro das empresas e investidores que até então utilizavam a Grã-Bretanha como uma porta de entrada para os demais 27 mercados da União Europeia. Por outro lado, aumenta-se o poder de barganha do Brasil nas negociações econômicas e comerciais, visto que diminuem as assimetrias entre os dois atores.
O desfecho dado ao BREXIT também poderá impactar de modo diferente na vida dos brasileiros residentes em território britânico. Por um lado, estes já vêm sofrendo com a linha dura da política de imigração adotada desde o primeiro mandato de Cameron e encabeçada por sua então secretária de interior, Theresa May, agora primeira ministra. A possibilidade, porém, é que maiores restrições sejam colocadas aos cidadãos europeus que residem e trabalham na Grã-Bretanha, o que pode ser relativamente favorável aos brasileiros que lá estão. Isto porque se diminuiriam as diferenças em termos de requisitos legais entre os dois grupos, equilibrando as regras de competição no mercado de trabalho entre os estrangeiros das mais diversas origens.
CAROLINA PAVESE é coordenadora do Curso de Graduação em Relações Internacionais da PUC-MG/Campus Poços de Caldas
Por: Carolina Pavese