A importância da Medicina no futebol

O futebol é uma área altamente rentável, mas o Brasil demorou a enxergar este potencial econômico na modalidade. Quando há gestões profissionais e transparentes, há oportunidade para todos os profissionais, incluindo médicos e demais áreas da saúde.

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O futebol é uma área altamente rentável, mas o Brasil demorou a enxergar este potencial econômico na modalidade. Quando há gestões profissionais e transparentes, há oportunidade para todos os profissionais, incluindo médicos e demais áreas da saúde.

Na Federação Paulista de Futebol, onde atuo como Vice-presidente de Integração com Atletas desde 2015, costumamos brincar que, quando convocamos os departamentos jurídico, médico ou de comunicação de um determinado clube, quem aparece é o próprio presidente. Muitas vezes, é precária a estrutura dos clubes.

Em 1994, quando disputei a Copa do Mundo nos Estados Unidos, no meu entendimento os médicos atuavam com o tratamento em cima de contusões. Não havia este processo de prevenção praticado atualmente, incluindo diferentes cargas de trabalho. Aos 20 anos, eu já havia feito três cirurgias. Antes, um preparador físico empolgado queria mostrar serviço e nos fazia treinar muito além da necessidade. Como resultado, surgiam lesões.

Atualmente, no que se referem ciência, informação e tecnologia, as grandes evoluções passam pelos treinamentos, a carga de trabalho, recuperação e prevenção. A participação da Medicina é mais intensa, com maior conhecimento para tomada de decisões. Deste modo, é possível antecipar as lesões e poupar os atletas. Exemplo do desenvolvimento médico no futebol é Zé Roberto, atleta que atuou em altíssimo nível até os 43 anos.

A comemoração do gol de Neymar em amistoso contra a Croácia, agradecendo ao médico Rodrigo Lasmar após uma recuperação consistente, mostra a importância da Medicina no futebol atual. Por vezes, os clubes possuem uma visão míope. Investem muito em atletas e, muitas vezes, não planejam um departamento médico estruturado para que suas estrelas estejam mais vezes em campo. Quando custa para um clube perder Neymar em alguns jogos por ano? Sem uma gestão profissional, pode haver dificuldades.

Carlos Alberto Parreira, técnico com quem fomos campeões do mundo em 1994 e meu amigo pessoal, costuma dizer que difícil é tirar o caminhão da inércia: depois disso, ele anda. Quero crer, pelo que tenho visto e vivido na Federação Paulista de Futebol, que o Brasil começou a sair dessa inércia. Tanto no âmbito esportivo quanto no político, vivemos um momento de transição e transformação.

Voltando ao Comitê Médico: aproximar-se dos profissionais que vivem o dia a dia dos clubes tem nos auxiliado a entender o que acontece lá dentro. Assim, temos mapeado lesões, investido em parcerias, oferecemos testes gratuitos na pré-temporada e também sugerimos mudanças em itens como os regulamentos das competições.

A todos os clubes das Séries A1, A2 e A3 do Campeonato Paulista, fornecemos malas médicas com aparelho desfibrilador para atendimento em campo. Os times são obrigados a carregarem consigo o material, sob fiscalização do delegado da partida.

Outra evolução que acompanho dentro da FPF é a exigência de qualificação para os treinadores atuarem, que valerá a partir do ano que vem. O Brasil tem hoje 200 milhões de treinadores. Qualquer pessoa pode pegar o boné e ir a campo. Se quero ser advogado, estudo Direito, se quero ser médico, estudo Medicina. Então, para ser treinador é preciso estudar. E para jogar, também!

Em minha carreira de 11 anos de seleção brasileira e 13 anos de Europa, acumulei conhecimentos. Mas será que tenho aptidão na parte pedagógica? Será que sei transmitir minhas experiências? Não dá para virar treinador no dia seguinte. Essa é uma qualificação significativa: é muito difícil treinar um clube de futebol com pouca formação. O treinador precisa entender, entre outras coisas, tudo o que um médico pode fazer por um atleta. Uma formação mais ampla e consistente é muito importante.

Em minha carreira, aprendi também que é necessário vencer com méritos. No futebol, muitas vezes deixamos isso de lado. Queremos políticos éticos, mas acreditamos que no futebol podemos enganar o árbitro, fazer um gol de mão. Precisamos mudar nossa mentalidade.

Espero que o futebol siga sempre evoluindo. Ele é um instrumento maravilhoso de transformação e inclusão social, e vai muito além dos três pontos que se ganha ou se deixa de ganhar a cada domingo. Podemos dar melhores exemplos através dele.

Mauro Silva é Vice-Presidente de Integração da FPF e campeão mundial com a seleção brasileira em 1994