Na última quarta-feira, 22 de setembro, a Associação Paulista de Medicina realizou mais uma edição de seu webinar. O tema escolhido para debate foi “Cuidados para a volta às aulas”. O evento foi apresentado por José Luiz Gomes do Amaral, presidente da APM, e moderado pelos diretores Paulo Manuel Pêgo Fernandes (Científico) e Álvaro Atallah (Economia Médica e Saúde Baseada em Evidências).
Desenvolvimento Infantil
O primeiro palestrante a apresentar foi Marun David Cury, pediatra e diretor de Defesa Profissional da APM. Em sua exposição sobre o tema, falou sobre os impactos da pandemia na saúde e no desenvolvimento infantil. “O confinamento pela pandemia tem um grande impacto na população infantil, principalmente pelo fechamento das escolas, pois é o principal local de interação entre crianças e adolescentes”, disse.
De acordo com pesquisas, mais de 80% dos alunos do ensino médio e fundamental estão matriculados em escolas públicas e mais de 5,1 milhões de crianças e adolescentes não tiveram acesso à educação no Brasil no ano de 2020. “Observamos repercussões do confinamento em diversos âmbitos na criança, o aprendizado em relação à comunicação, inserção social e convivência, saúde física e mental foram afetados”, explicou Marun.
O especialista ainda ressaltou que o distanciamento social acentuou ou fez criar dificuldades funcionais e comportamentais nas crianças. “Segundo pesquisas, 36% das crianças desenvolveram dependência excessiva dos pais, 32% desatenção, 21% problemas de sono, 18% falta de apetite, 14% pesadelos e 13% desconforto e agitação.”
Outro ponto importante levantado em sua exposição foi a saúde física das crianças durante a pandemia, já que muitas delas apresentaram aumento do sedentarismo, obesidade, queda na cobertura vacinal, retrocesso da fala e aumento de acidentes domésticos, além das questões relacionadas à saúde mental.
“Com relação à repercussão da saúde mental, uma pesquisa feita pela Sociedade Brasileira de Pediatria apontou que 8 em cada 10 crianças apresentaram alterações no comportamento durante o isolamento social. Crianças e adolescentes que apresentam sinais ou sintomas de tristeza, apatia, irritabilidade e agressividade, entre outros, se não tiverem a devida atenção e cuidado, poderão evoluir para quadros de depressão e transtornos mais graves”, ressaltou.
Marun Cury ainda destaca que o confinamento prolongado aumenta os casos de maus tratos e violência contra crianças e adolescentes, sendo física, psicológica e sexual. Com resultados obtidos através de estudos da Universidade de Calgary, no Canadá, 1 em cada 6 jovens no mundo apresentou algum transtorno mental durante a pandemia. No Brasil, 1 em cada 4 crianças e adolescentes apresentou ansiedade ou depressão durante o período.
Sobre os impactos da pandemia na saúde e no desenvolvimento infantil, o pediatra ressaltou que é preciso voltar a atenção à violência familiar, vulnerabilidade social e interrupção prolongada das atividades escolares presenciais, que trará reflexos nos próximos anos e danos psicológicos cognitivos (medo, luto, ansiedade e resiliência).
Concluindo, ele explica que, quanto mais tempo crianças e adolescentes permanecerem fora da escola, menor a probabilidade de voltarem e, os transtornos que surgem durante esta fase são relevantes para a sociedade porque afetam indivíduos normalmente saudáveis, em plena fase de desenvolvimento psíquico e emocional.
Cuidados e prevenção
Em seguida, Eduardo Medeiros, professor associado da EPM/Unifesp e presidente da Sociedade Paulista de Infectologia, trouxe em sua apresentação formas de transmissão do vírus da Covid-19 no ambiente escolar e medidas de proteção. “Precisamos lembrar que é uma doença fundamentalmente transmitida por gotículas, e as nossas ações precisam ser muito dirigidas a isso”, disse.
Entre as medidas de prevenção no retorno às atividades escolares, o palestrante destacou a higiene das mãos e da estrutura, distanciamento entre as mesas e cadeiras, uso de máscara e capacitação dos profissionais, manutenção dos ambientes e escalonamento no horário de entrada e saída dos alunos e nos intervalos entre as turmas.
“Além de todas essas medidas, também é necessária uma mobilização do trabalho administrativo, usar de forma escalonada as áreas comuns como biblioteca, parquinhos, pátios ou quadras e evitar o uso coletivo e o compartilhamento de materiais, o que é um enorme desafio, principalmente com crianças”, destacou.
Medeiros também ressaltou sobre ações que devem ser feitas caso for identificado um aluno com sintomas de síndrome gripal. “Eventualmente, se o aluno for mais velho e estiver de máscara, assim como todos os alunos da sala, pode alertar os pais e afastar-se das atividades escolares. Mas, se surgirem mais casos na própria sala, já demonstra uma transmissão neste ambiente e provavelmente as atividades terão de ser suspensas.”
O palestrante ainda explicou que o guia de orientação para a volta às aulas implantado pelo Ministério da Educação é muito bem escrito, com medidas adequadas e importante referência. “Muitos estados e municípios criaram seu próprio guia, e a partir deste ponto tivemos um problema, porque as coisas não são homogêneas. Vaporizações com antissépticos foram realizadas em salas de aulas, levando risco de um produto químico ser mais importante do que a situação que merece. É um problema, desde o início da pandemia esse foi nosso maior ponto, a informação.”
Medeiros ainda salientou que agora com a vacinação, o mundo anda a passos largos, pois a população brasileira tem atingido um número significativo de pessoas vacinadas e, junto com o número grande de pessoas que foram contaminadas pelo vírus, tem determinado o cenário epidemiológico de hoje. “O momento em que vivemos é o de desaceleração da pandemia, o que torna o retorno um pouco mais seguro.”
Ainda ressaltou que, o mais importante é que as escolas criem suas diretrizes, orientações, protocolos e apliquem as informações que já estão disponíveis, trabalhando uma retomada gradual e segura das atividades presenciais. “Neste retorno, é preciso ter uma equipe estruturada, em que o conhecimento seja a base do processo, além de medidas de prevenção e, principalmente, a comunicação entre professores, pais e demais colaboradores.”
Por fim, apresentou três processos fundamentais para maior controle da pandemia. “Não sairemos a curto prazo. As estratégias de prevenção foram muito bem aplicadas e seguraram a pandemia por um período; com o aumento da vacinação, estamos um pouco mais seguros nesta situação; além de precisarmos de uma terapêutica eficaz, que provavelmente teremos somente no segundo semestre de 2022”, finalizou.
Pesquisas
Finalizando as apresentações, Clóvis Francisco Constantino, professor de ética médica e bioética da Unisa e coordenador da unidade de São Paulo da International Chair in Bioethics, abordou em sua palestra estudos sobre a Covid-19 e os efeitos e consequências causados na área da Educação. “Já sabíamos que o que aconteceria com crianças e adolescentes ao serem afastados do ambiente escolar não seria nada agradável, do ponto de vista do crescimento e desenvolvimento.”
O palestrante ressaltou que os impactos gerados pela pandemia na infância, abordados nas apresentações anteriores, continuarão acontecendo, principalmente em países como o Brasil, com desigualdades socioeconômicas. “Do ponto de vista de conteúdo, as famílias com melhor situação financeira obviamente têm, ou tiveram, condições de manter uma certa rotina de conteúdo com seus filhos de forma on-line. Por outro lado, a maioria de nossos cidadãos não tem esse privilégio de contar com dispositivos de boa qualidade e redes de internet. E sabíamos que o que iria acontecer com essas crianças e adolescentes seria algo realmente desastroso”, complementou.
Segundo o especialista, a volta às aulas era um assunto discutido com muita frequência pelas instituições de Saúde, principalmente no segundo semestre de 2020. “Com isso, as escolas estão efetivando sua abertura gradualmente. Os documentos publicados tiveram uma característica crescente, uma vez que o conhecimento foi sendo acumulado”, explicou.
A partir de estudos e conhecimentos gerados ao longo dos quase dois anos de pandemia, Constantino trouxe algumas conclusões em relação aos cuidados na retomada das atividades escolares. “As crianças e adolescentes precisam frequentar o ambiente escolar presencial, e isso deve ser feito de maneira controlada. Infelizmente em nosso País, com as já citadas desigualdades sociais, também temos desigualdades nas unidades escolares. Algumas bem equipadas e preparadas para o retorno e outras que não têm condições de elaborar planos para a segurança dos alunos.”
O especialista finalizou sua exposição sobre o assunto ressaltando a importância do diagnóstico e afastamento da criança caso tenha sintomas de Covid-19. “Nosso alerta para a rede de ensino e atendimento primário é que crianças interceptadas com sintomas respiratórios devem ser imediatamente afastadas do ambiente escolar e, se possível, realizar a coleta do RT-PCR, tendo em vista a transmissão da Covid-19 e de outras síndromes.”





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