O webinar da Associação Paulista de Medicina desta quarta-feira, 10 de julho, teve como tema “Transtorno do Espectro Autista – Impacto Econômico e Assistencial”. A diretora Científica adjunta da APM, Marianne Yumi Nakai, agradeceu a presença de todos e falou que este é um tema que, sem dúvida, precisa ser muito ser debatido. “Falta ainda muita capacitação de quem faz o diagnóstico e prescreve as terapias, além de toda a problemática em relação à sustentabilidade.”
Paulo De Conti, diretor adjunto de Economia Médica e Saúde Baseada em Evidências da entidade, moderou o encontro e comentou que este assunto foi escolhido no intuito de abordar os aspectos e impactos econômicos tanto no serviço público quanto no privado. “Existem estudos da ABRAMGE (Associação Brasileira de Planos de Saúde) que mostram que 9% dos gastos das operadoras de planos de saúde correspondem às terapias do TEA – número superior a 8,7% referente aos gastos oncológicos. O principal objetivo é chamar a atenção para o diagnóstico precoce do TEA e, também, para a necessidade do acolhimento destas famílias. O problema não é gastar muito, mas sim gastar bem por meio de terapias efetivas alicerçadas em bases científicas.”
Entre os palestrantes convidados para o webinar, participaram Mauro Couri, médico pediatra pós-graduado em Gastroenterologia e Hepatologia Pediátrica e superintendente operacional da Federação das Unimeds de São Paulo; Jorge Sayum Filho, diretor adjunto do Cochrane Brasil e pós-doutorado da Escola Paulista de Medicina; e Álvaro Nagib Atallah, diretor de Economia Médica e Saúde Baseada em Evidências da APM e professor Titular de Medicina de Urgência e MBE da EPM/Unifesp.
Mauro Couri iniciou sua apresentação falando dos impactos econômicos e assistenciais do TEA, sobretudo, o que compete às operadoras de planos de saúde, ou seja, a saúde suplementar no Brasil diante de todo regramento existente. O Transtorno do Espectro Autista é um distúrbio do neurodesenvolvimento caracterizado por prejuízos em dois domínios centrais: déficit na comunicação e interação social; e padrões repetitivos e restritos de comportamento, interesses e atividades. “É um transtorno complexo, pervasivo e heterogêneo, com muitas manifestações diferentes”, explicou.
O médico destacou que pessoas até a faixa etária dos 19 anos representam 90% de demandas dentro da operadora de plano de saúde. “O TEA sofreu muitas mudanças desde 1952, com alterações de critérios e diagnósticos e continua mudando ao longo do tempo.”
Jorge Sayum complementou dizendo que o diagnóstico do TEA é baseado nos critérios do DSM V – 5ª edição do Manual do Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Academia Americana de Psiquiatria. Segundo ele, este diagnóstico é exclusivamente clínico, ou seja, baseado na descrição de sinais, sintomas e na história de vida do paciente. “Portanto, não existem exames que possam detectar o transtorno autista.”
De acordo com o CDC (Center For Disease Control), aproximadamente 1 em cada 54 crianças nos Estados Unidos é diagnosticada com TEA. Entre os principais sintomas estão dificuldades na interação social e na comunicação verbal e não verbal, comportamentos repetitivos e interesses restritos, podendo variar em intensidade.
Sayum reforça que é importante uma abordagem personalizada. “A eficácia das intervenções pode variar significativamente entre indivíduos, portanto, uma abordagem personalizada e adaptativa é crucial.”
Álvaro Nagib Atallah complementou que uma evidência começa com a definição do problema e da população – pessoas com autismo variam de quase imperceptível até uma criança incapaz de falar. “Qualquer intervenção precisa ser bem feita, e nós temos uma carência de ensaios clínicos controlados.”
Custos com TEA no Brasil
Entre 2019 e 2023, as despesas com terapias tiveram aumento de 165%, representando um valor de R$ 3.803.586.609,00. Em relação à quantidade de procedimentos, referente ao mesmo período, o aumento foi de 120%, totalizando R$ 67.190.564.
No caso do atendimento ambulatorial, entre 2019 e 2023, as sessões de Terapia aumentaram 51%, Fonoaudiologia 71%, Psicologia 134% e Terapia Ocupacional 290%. “Hoje eu pago muito mais para os psicólogos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e nutricionistas do que para os profissionais com doutorados, mestrados e bem formados. Não quero fazer juízo de valor, mas precisa haver um equilíbrio. Os honorários médicos estão restritos aos reajustes que podem ser fornecidos pelas operadoras de planos de saúde e que seguem os reajustes da ANS, mas é impossível fechar a conta do jeito que está”, complementou Couri.
Principais desafios
- Pouco conhecimento sobre o TEA, estando restrita a alguns profissionais, geralmente especialistas;
- Prescrições médicas não embasadas em Práticas Baseadas em Evidência (PBE) e distorção do conceito de urgência nas liminares. Prescrições contemplando apenas o ambiente de saúde;
- Prestadores não aceitando o credenciamento, preferindo a informalidade e ausência de documentações. Pouca dedicação ao treinamento parental;
- Aumento exponencial dos casos de dificuldade para encontrar novas vagas para os pacientes, dentro dos prazos regulatórios;
- Ausência de regulamentação do analista do comportamento, com precarização dos profissionais assistentes e falta de profissionais para terapias convencionais.
O superintendente operacional da Federação das Unimeds de São Paulo prosseguiu dizendo que o percurso assistencial do autismo compreende a suspeita diagnóstica, confirmação diagnóstica, avaliação médica junto da equipe transdisciplinar, construção do Plano Terapêutico Individualizado (PTI) e operadora de Planos de Saúde. “Na saúde suplementar, este processo dura em torno de 40-60 dias. No SUS (Sistema Único de Saúde) pode durar até 1 ano. Já na operadora ocorre até 12 dias, após entrada do pedido.”