O livro Panteão Médico Riograndense: síntese cultural e histórica – progresso e evolução da Medicina no Estado do Rio Grande Sul, publicado em 1943 e coordenado pelos estudiosos Álvaro Franco e Sinhorinha Maria Ramos, traça um panorama histórico sobre instituições hospitalares, biografias de médicos e artigos na área da Saúde, entre outros temas, relacionados à prática médica no estado gaúcho.
O acadêmico Germano Mostardeiro Bonow abriu os trabalhos do I Encontro das Academias de Medicina de São Paulo e do Rio Grande do Sul com conferência sobre a obra, na manhã do dia 26 de outubro, na sede da Associação Paulista de Medicina.
“Fizemos uma reedição do livro. No entanto, a nossa primeira dificuldade foi chegar aos autores que organizaram a obra. Identificado como Álvaro Ramos, era oficial do exército em 1944, durante a ditadura de Getúlio Vargas, trabalhava no serviço farmacêutico e foi reformado em maio de 1964. Ramos produziu diversas obras e um dicionário inglês-português, reeditado 26 vezes, entre as décadas de 1940 e 1950. Já Sinhorinha foi educadora, jornalista, fez parte do Instituto Nacional do Livro, relações exteriores, trabalhou no jornal O Globo, além de ter recebido diversos prêmios em Literatura, palestrou em vários países da América do Sul, nos Estados Unidos, na Ásia e Europa”, relata Bonow.
A história da Medicina, a formação médica, o progresso da cirurgia, o ensino da Pediatria, as origens da assistência a psicopatas, as grandes organizações hospitalares, a assistência a mulheres grávidas indigentes e a roda dos expostos, o problema médico social do câncer e da lepra e biografias são alguns dos capítulos abordados nas 588 páginas da obra, que tem como pano de fundo o estado do Rio Grande do Sul.
“Temos inclusive a história da fundação, em 1898, da primeira Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, sendo a terceira no Brasil. Os trabalhos acadêmicos da instituição foram retomados em 1924. E hoje, quase chegando ao centenário de ensino, símbolo para as 20 faculdades de Medicina no estado, o prédio está deteriorado. Precisamos manifestar e reportar essa nossa preocupação aos ministros da Educação e da Cultura do nosso País”, alertou.
Fluxos migratórios históricos e exercício médico
Em outra perspectiva, a acadêmica Leonor Scwartsmann abordou a situação dos médicos estrangeiros no Brasil. No início do século 20 até a Segunda Guerra Mundial, o Brasil recebeu populações médicas, sobretudo, de alemães e italianos.
“Em São Paulo, muitos médicos trabalharam em hospitais e laboratórios, principalmente exercendo a docência. Eles tiveram uma cooperação importante para o desenvolvimento da Medicina brasileira. Já no Rio Grande Sul, houve uma integração autônoma. Eram profissionais muito qualificados, mas não foram absorvidos pela Faculdade de Medicina do Rio Grande do Sul”, compara a especialista. Os médicos italianos contribuíram ainda para a construção de casas de saúde, hospitais, clínicas, pavilhões e enfermarias.
A historicidade do câncer de mama
Por que tanta publicidade em torno do câncer de mama? Partindo dessa pergunta, o presidente da Academia Sul-Rio-Grandense de Medicina, Carlos Henrique Menke, explica: “O simbolismo da mama faz parte da estética corporal da mulher. Além desse valor imenso, integra parte importantíssima da vida sexual e é responsável pela manutenção da espécie humana por meio do aleitamento. Qualquer ameaça a esse órgão desencadeia um processo emocional imenso, disseminando pela família e sociedade de maneira geral.”
De acordo com levantamento do Instituto Nacional de Câncer (Inca), em 2019, o País apresentou 59.700 novos casos. Especificamente no Rio Grande Sul, houve 12.500 ocorrências de câncer e em Porto Alegre, 5.800. “Sabemos que na Região Sul, a longevidade é maior, mas as pessoas consomem muita carne vermelha, mulheres priorizam a carreira em detrimento dos filhos ou amamentam mais tarde. São algumas explicações multifatoriais para entender essa alta incidência no estado.”
No decorrer histórico riograndense, o manejo da doença passou por significativas transformações, conforme descrito por Menke. Em 1965, houve o primeiro rastreamento mamográfico; dois anos depois, a primeira mamografia. Em 1981, aconteceu a primeira cirurgia conservadora e em 1990, a expansão da primeira cirurgia reconstrutiva. Já em 2000, o primeiro procedimento cirúrgico oncoplástico, com o início da era molecular.
“Hoje, dificilmente uma mulher fica sem a mama, não há necessidade de removê-la. Temos a lipoenxertia – técnica de cirurgia plástica que usa a gordura do próprio corpo da paciente para preencher, definir ou dar volume a certas partes do corpo. Esse refinamento cirúrgico é uma grande transformação e revolução histórica no tratamento”, acrescenta o acadêmico.
Em 1972, o câncer era detectado com 3,6 centímetros; em 2006, com 1,5 centímetro, em razão dos avanços em prognósticos. “Hoje, a Medicina terapêutica usa o critério da personalização, com a análise da classificação genômica, alvo, a assinatura genética e testagem do BRCA1/2 para orientar o tratamento”, conclui.
Texto: Keli Rocha
Fotos: Marina Bustos