Na última quarta-feira, 18 de outubro, a Associação Paulista de Medicina realizou mais um dos seus webinars, novamente com o tema “Impacto do uso e dependência do álcool na Saúde das pessoas”, dando continuidade ao debate da semana anterior.
Como de praxe, o evento foi apresentado pelo presidente da APM, José Luiz Gomes do Amaral, e moderado pelo epidemiologista psiquiátrico Jair de Jesus Mari. Para ministrar a palestra, foram convidados os psiquiatras José Carlos Galduróz e Ricardo Amaral.
Neurobiologia
De início, José Carlos Galduróz explicou a diferença entre as drogas psicoativas e psicotrópicas. Segundo ele, ambas podem afetar o humor, comportamento e cognição. No entanto, as psicotrópicas têm a característica de efeito reforçador, ou seja, possuem maior potencial de provocar dependência.
Fornecendo explicações relacionadas ao circuito de recompensa, a partir de estudos realizados em animais de laboratório, o profissional salienta: “O nosso sistema de recompensa nasce na área tegmental ventral, projeta para o núcleo accumbens, afetando todo o sistema límbico, saindo da área tegmental ventral e indo para o córtex pré-frontal. Esta área, quando estimulada com um eletrodo, faz o animalzinho negligenciar todas as suas atividades, buscando por esse prazer”.
Conforme Galduróz, para liberar dopamina (substância conhecida como um dos hormônios da felicidade e prazer) em pessoas não dependentes, o hipotálamo secreta beta-endorfina que, por sua vez, bloqueia os neurônios gabaérgicos. A partir deste momento, há a liberação da dopamina, o que é considerado um padrão comum. Já em usuários dependentes, o etanol libera a ação de endorfinas, e isso bloqueia de forma exacerbada o sistema gabaérgico, proporcionando maior sensação de prazer.
“Por que as pessoas dizem que o álcool é uma droga suja? O álcool, por ser uma molécula fácil de diluir em água ou em tecidos gordurosos, passa por todas as nossas barreiras. Ele diminui a ação dos neurotransmissores excitatórios, aumentando a função desse sistema, sendo este o mais inibitório que temos. Mas ele atua também nos receptores da serotonina, da acetilcolina, e mais especificamente na cana do tipo L”, especifica o especialista.
Finalizando a apresentação, o psiquiatra falou sobre a síndrome de abstinência. De acordo com ele, quando o dependente químico para de usar o álcool de uma vez, o sistema entra em hiperfuncionamento, causando calafrios, sudorese, tremores, hipertermia, alteração de humor, ansiedade, depressão, dores, vômito, insônia e diarreia; podendo evoluir para uma condição extrema e causar a morte.
Tratamento
Segundo Ricardo Amaral, um dos protocolos de tratamento para o uso abusivo de álcool é a intervenção precoce ou intervenção breve. Nesse processo, que pode ser feito em unidades básicas de saúde, aplica-se um teste que, a partir das respostas, o profissional fará uma devolutiva para o paciente, estabelecer algumas metas com o indivíduo e aconselhar. Ele orienta ainda que a relação entre médico e paciente, neste caso, deve ser de muita empatia.
“Esse tratamento reflete na redução do uso de álcool em 27%. É um tratamento econômico, bastante barato. Revertendo esses padrões de uso mais pesado e danoso, o profissional pode orientar a pessoa em um processo de longo prazo. No entanto, existem outras formas de tratamento, mas é necessário analisar o contexto e a possibilidade de oferta”, destaca o especialista.
Em relação ao tratamento farmacológico, mais especificamente sobre a Naltrexona, o psiquiatra argumenta que a recomendação deste medicamento é para pacientes que fazem o uso excessivo de bebidas alcoólicas, visto que essas pessoas têm um apelo no prazer adicional nos níveis de beta-endorfina.
“É sempre bom lembrar que, nestes casos, a Naltrexona pode ser indicada em 50 mg por dia, e que esse efeito não acontece de forma imediata, podendo levar de 4 a 6 semanas para começar. Além disso, não deve ser usada em pacientes com doenças hepáticas”, revela.
No tratamento não farmacológico, o palestrante aponta alguns meios psicoterapêuticos que podem ser eficazes para a diminuição da dependência química alcoólica. “Na psicoterapia, indicaremos principalmente a terapia cognitivo-comportamental, mas também há o modelo de prevenção de recaídas. Neste caso, não podemos esquecer de dar atenção para a família, envolver esses familiares e estimular a participação em grupos de autoajuda”, explica.
Concluindo o raciocínio, o palestrante declara que a internação fica reservada para os pacientes que usam a droga compulsivamente e não conseguem obter resultados no tratamento ambulatorial. Além disso, é necessário analisar os riscos de suicídio, heteroagressividade e psicose que possam acometer o indivíduo.
Fotos: Reprodução Webinar APM