III Congresso Paulista de Dor engloba aula sobre “Conceitos Iniciais”

Dando continuidade à terceira edição do Congresso Paulista de Dor, nesta sexta-feira, 29 de setembro, a Associação Paulista de Medicina realizou o segundo dia de evento

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Dando continuidade à terceira edição do Congresso Paulista de Dor, nesta sexta-feira, 29 de setembro, a Associação Paulista de Medicina realizou o segundo dia de evento. Dentre os diversos temas e oficinas que compuseram a programação, esteve a palestra sobre “Conceitos Iniciais”, coordenada pela presidente do Congresso e do Comitê Científico de Dor da APM, Telma Zakka, e moderada por Marina Buldrini Filogonio.

Além de coordenadora, Telma Zakka também foi a primeira palestrante da mesa, apresentando os “Conceitos de Dor para o Clínico Geral”. Segundo a especialista, fatores de risco contribuem para o desenvolvimento de dor crônica, tais como idade, ser do sexo feminino – cientificamente, mulheres sentem mais dores que homens, até por uma questão hormonal –, o tipo de trabalho realizado, obesidade, alcoolismo, tabagismo, sedentarismo e deficiência de vitamina D.

A especialista explicou como são classificados os tipos de dor. “Primeiro, dividimos o tempo. Aguda, até três meses, e crônica quando é mais de três ou seis meses, dependendo da literatura. Também analisamos a dor de acordo com a sua fisiopatologia, se é nociceptiva, nociplástica ou neuroplástica. Além da intensidade, que pode ser leve, moderada ou forte. É uma avaliação que precisa ser bem criteriosa, pois a dor é única e muito pessoal.”

A solicitação de exames complementares deve ser feita apenas em situações que vão, de fato, contribuir para o diagnóstico e para a melhoria do tratamento. Por isso, uma boa anamnese é fundamental, já que permite analisar indícios e detalhes sobre diferentes casos que podem ter passado despercebidos por outros especialistas. Não obstante, conversar com os pacientes sobre violência física ou sexual também pode ser uma medida substancial para entender a dor daquele indivíduo e como lidar com ela.

“A satisfação do paciente é o resultado de conversarmos com ele sobre expectativas. O ponto de vista do paciente e do médico sempre será diferente e nós, enquanto seres humanos, temos uma tendência de subvalorizar a dor do outro, por isso, é indispensável avaliar criteriosamente o paciente com dor, individualizar o tratamento – que não pode ser igual para todo mundo –, avaliar riscos e benefícios de fármacos prescritos, respeitar o intervalo terapêutico dos medicamentos, prescrever uma dose adequada para aliviar a dor e, sempre que possível, utilizar a analgesia multimodal. Juntos somos mais fortes, quando associamos fármacos diferentes, temos melhores resultados”, complementou.

Fisiopatologia

Em seguida, o neurologista com atuação em Dor Gabriel Kubota falou a respeito de “Fisiopatologia aplicada à prática clínica: Mudanças no exame físico do paciente com dor”. Para ele, o objetivo de sua palestra era trazer a abordagem a partir de um aspecto mais prático, com casos clínicos que podem ser desafiadores e desconfortáveis para os especialistas.

Para isso, apresentou a foto de dois pacientes com lesões diferentes no joelho. Em uma, o osso parecia deslocado, enquanto na outra, a região parecia intacta. De acordo com o especialista, a tendência é de que o público creia que a imagem com o possível ferimento seja a do paciente com dor, mas na prática não funciona assim. Isso acontece porque a imagem em que o joelho parecia estar em perfeitas condições, na realidade, pertencia a um paciente com mais lesão tecidual e com mais gravidade.

“Essa é uma das características que mais vemos na prática, a dissociação entre lesão e relato de dor. Fora isso, há também o elemento da dor nociplástica, que se transforma em uma dor crônica associada ao sofrimento emocional. Por isso, aprendemos muito mais nos bastidores do que quando olhamos as publicações e a dor crônica primária permite que possamos expandir as diferentes patologias, e assim, analisar mais casos”, complementou Kubota.

O palestrante relembrou que os profissionais que trabalham com dor precisam, indispensavelmente, trabalhar com exame físico para entender de onde vêm os sintomas de dor – que na maior parte dos casos surgem da inflamação dos sistemas sensibilizadores. Um exemplo dessa sensibilização é a periférica, que acontece quando há um pequeno corte de papel no dedo e ocorre a inflamação neurogênica, causando dor em todo o local, e não apenas na região do corte. No caso de dores crônicas, esse acontecimento para de ser limitado e passa a ser mais regionalizado.

Finalizando, Kubota relembrou pacientes que não sabem dizer especificamente onde estão sentindo dor. “Isso tem fundamento biológico, se entende como um fenômeno multidimensional, sensitivo-discriminativo, afetivo-avaliativo, cognitivo-simbólico. A ativação de diferentes áreas do cérebro vai permitir explorar a dor em diferentes contextos. A dor sai do corpo e vai para a alma, não tem uma localização mais tão bem definida e os relatos são mais difusos.”

Intervenção

Dalmir Camara foi responsável por finalizar as apresentações do bloco. Relatando “Como intervir no processo de cronificação da dor?”, o palestrante relembrou que, atualmente, um em cada cinco (20,9%) habitantes da população dos Estados Unidos vive com dor crônica, o que corresponde a cerca de 51 milhões de pessoas. Deste número, 6,9% possuem dor crônica de alto impacto, com limitações importantes e incapacitantes para a vivência diária. No Brasil, a prevalência varia 23,02% a 76,17%, com uma média nacional de 45,59%.

Em 2020, a Sociedade Internacional de Dor definiu que aquele era o ano de prevenção da dor. Para lidar com essa condição, é preciso analisar alguns tópicos fundamentais, como a alimentação do paciente, otimizando a sua dieta, aumentando o consumo de frutas e vegetais, reduzindo alimentos ultraprocessados e limitando o acréscimo de açúcares; o vício em substâncias, como álcool, cafeína ou tabagismo; se o paciente realiza exercícios físicos regularmente; o sono, o peso e a saúde mental.

“No caso da dor aguda, os principais fatores estão atrelados à duração e frequência. Apesar de existir uma série de estudos, não há fármacos que modifiquem o risco de cronificação. O aumento de estresse está relacionado à transição de dor aguda musculoesquelética para crônica, o que aumenta a intensidade. Além disso, o transtorno de estresse pós-traumático também pode ajudar nesta cronificação”, explicou.

O especialista destacou que terapias de mente e corpo, como meditação, hipnose e terapia cognitiva comportamental são alternativas que podem, mesmo que levemente, reduzir os quadros de dor, além de serem uma maneira para diminuir o consumo de opioides. “Especialistas em dor precisam entender que o tratamento deve ser multidisciplinar, contando com os esforços de diferentes equipes. A diminuição de medicamentos melhora o autocuidado e a jornada do paciente”, finalizou.

Texto: Julia Rohrer

Fotos: Alexandre Diniz