Volta à escola é tema de webinar da APM

A Associação Paulista de Medicina reuniu especialistas renomados para discutir o papel das crianças e dos adolescentes na transmissão do novo coronavírus, o possível retorno às aulas presenciais e os cuidados necessários

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A Associação Paulista de Medicina reuniu, em seu 17º Webinar APM, transmitido pelo YouTube na noite de 9 de setembro, especialistas renomados para discutir o papel das crianças e dos adolescentes na transmissão do novo coronavírus, o possível retorno às aulas presenciais e os cuidados necessários. O encontro foi moderado pelo diretor de Defesa Profissional da entidade, o pediatra Marun David Cury.

O presidente do Departamento de Infectologia da Sociedade Brasileira de Pediatria, Marco Aurélio Palazzi Sáfadi, fez um resumo da situação epidemiológica brasileira atual, com tendência de desfecho grave sobre o sexo masculino, atingindo 58% do grupo, e com prevalência de óbito em raça/étnica parda.

Entre os óbitos pela infecção, 61% apresentavam pelo menos uma comorbidade ou fator de risco para a doença, sendo que 25% dos indivíduos têm faixa etária de 70 a 79 anos. As mortes em menores de 19 anos representam 0,7% desse total. “Em crianças e adolescentes, é um achado consistente que se reproduz desde os primeiros relatos vindos da Ásia”, destacou Sáfadi.

Sáfadi acrescentou que para outros tipos de doenças respiratórias, de acordo com diversas produções científicas, crianças são muito importantes para a transmissão do vírus respiratórios em sua comunidade, como o Influenza. No entanto, para o Sars-Cov-2, essa convicção ainda não existe.

“Pelo contrário, as evidências preliminares ainda necessitam de dados mais consistentes. Parece que, para esse novo coronavírus, há um fenômeno inverso. As crianças menores de 10 anos desempenham um papel menos relevante do que aquele exercido por adultos, particularmente entre adultos jovens. Não foram identificadas como transmissoras importantes do vírus”, explicou o pesquisador.

Diante dessa realidade, ele pontuou os impactos negativos com o fechamento das escolas, sobretudo para aqueles em situação de vulnerabilidade social; são eles: aprendizado interrompido, prejuízo nutricional para crianças que dependem de refeições gratuitas, confusão e estresse para os professores, com incertezas de suas obrigações e de como manter vínculos com os estudantes para apoiar sua aprendizagem, pais despreparados para o ensino a distância, lacunas nos cuidados às crianças para os familiares que precisam trabalhar, aumento da pressão sobre as escolas e o sistemas escolares que permanecem abertos, aumento das taxas de abandono, maior exposição a violência, exploração de menores e isolamento social.

Em seguida, a vice-presidente eleita da Associação Médica Brasileira (AMB) e presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria, Luciana Rodrigues Silva, reiterou dizendo que o espaço escolar é indispensável para as crianças e os adolescentes.

“Porque é lá que passam uma parte importante de seu tempo, onde há desenvolvimento emocional, cognitivo e socialização. Neste período de confinamento, familiares falam sobre as alterações comportamentais das crianças. Tivemos o aumento da violência infanto-juvenil, comprometimento no desenvolvimento intelectual, além da desigualdade social que estabelece condições diferentes de estudo entre ensino público e particular”, informou.

Orientar ou criar outros espaços para desenvolvimento das atividades, por exemplo, em campos abertos, e amparo emocional para elevar a autoestima de crianças e adolescentes foram algumas das ideias apresentadas pela médica.

“E as perguntas que ficam são: será que vale a pena voltar? E quando voltar? Precisaríamos de um declínio efetivo e continuado dos números de infectados e de óbitos e da disponibilidade de leito para terapia intensiva nos municípios para fazermos esse retorno gradual.”

Impacto do fechamento das escolas

O secretário de Educação do Estado de São Paulo, Rossieli Soares da Silva, baseando-se em dados da Unicef, Organização das Nações Unidas e Banco Mundial, em sua exposição, disse que mais de 25% dos estudantes poderão ter um rendimento abaixo de um nível básico de proficiência necessária para participar de forma eficaz e produtiva na sociedade, em razão do fechamento das escolas.

O tempo fora da escola pode levar a perdas de aprendizagem que continuam a se acumular, mesmo com a reabertura. Além da perda de determinadas competências, haverá um prejuízo econômico 2,3 trilhões de dólares para a economia brasileira e 23,8 milhões de crianças e adolescentes da pré-escola ao ensino superior em todo o mundo correrão o risco de não retornar às instituições”, alertou o secretário.

Para os mais vulneráveis, o aumento das desigualdades, pobreza educacional, impactos na saúde mental e no bem-estar de crianças e adolescentes, como risco de gravidez na adolescência, exploração sexual, violência e trabalho infantil, insegurança alimentar e a falta de nutrição adequada, foram outros tópicos mencionados pela autoridade pública.

“A escola é reflexo da comunidade. No mundo inteiro onde as aulas presenciais voltaram, o ponto central não foi de contaminação nas instituições de ensino, porque a contaminação é baixa, as crianças são mais assintomáticas e sofrem menos com a doença, ou seja, não há evidências de que a reabertura das escolas causaria uma proliferação do vírus”, reforçou.

Para isso, segundo ele, o estado desenvolveu pilares de protocolos sanitários setoriais da educação para a reabertura gradual das instituições de ensino de higiene pessoal (cultuando a atenção aos procedimentos de limpeza pessoal), comunicação entre funcionários e estudantes para conhecerem os riscos e os procedimentos de segurança adotados, sanitização de ambientes, monitoramento e distanciamento social.

“Quem conhece sobre educação, sabe a importância da volta das crianças e dos adolescentes para a escola, principalmente as menores de 8 anos de idade. Sabemos que a doença é grave, é um problema sanitário sério, mas as vezes o remédio que dão à doença é pior que o próprio vírus. Então, defendemos o relacionamento socioemocional da criança com o professor, com seu amigo, logicamente respeitando todos os parâmetros que a própria OMS recomenda. Pagaremos um preço muito alto por ter aberto restaurantes, acesso a praias, boates, shopping centers, academia, cursos livres e não ter aberto a educação”, resumiu o presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino de São Paulo, Benjamin Ribeiro da Silva.

Considerações

A partir dos argumentos expostos, o presidente eleito da Associação Médica Brasileira, César Eduardo Fernandes, destacou que as crianças parecem não ser o problema de transmissão da Covid-19 para adultos.

“Muitos equívocos foram cometidos durante a pandemia, entre eles, parece ter sido um erro fechar as escolas. Danos econômicos, na educação e na saúde emocional são outros danos que devem ser levados em consideração. O afastamento do ambiente de ensino traz prejuízos quase que irreparáveis, não há dúvidas de que voltar a escola não seja um grande problema. As perguntas que se devem fazer são quando e de que maneira voltar.”

Em consonância, o presidente da Associação Paulista de Medicina, José Luiz Gomes do Amaral, acredita que se a escola tivesse se preparado para educar sobre a gravidade da infecção, as crianças e os adolescentes seriam uma solução adicional para o enfrentamento do novo coronavírus.

“Temos a exemplo a intervenção das crianças na mudança no comportamento dos familiares com o uso de cinto de segurança, na alimentação saudável, no controle do tabagismo, na responsabilidade do meio ambiente e nas medidas de higiene. Certamente, se estivéssemos começado com a iniciativa de ensinar protocolos práticos de saúde, as praias e os bares não estariam cheios porque elas iriam orientar. E a APM conta com parcerias neste sentido para construção de um time neste projeto”, concluiu.

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