16º Webinar APM apresenta revisões do Cochrane Brasil sobre Covid-19

Nesta quarta-feira, 2 de setembro, a Associação Paulista de Medicina voltou a transmitir, em seu canal no YouTube, o Webinar APM. Desta vez, foi tema a relação entre a Medicina Baseada em Evidências, o Centro Cochrane Brasil e a Covid-19

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Nesta quarta-feira, 2 de setembro, a Associação Paulista de Medicina voltou a transmitir, em seu canal no YouTube, o Webinar APM. Desta vez, foi tema a relação entre a Medicina Baseada em Evidências, o Centro Cochrane Brasil e a Covid-19.

José Luiz Gomes do Amaral, presidente da APM, abriu o evento argumentando que não há pessoa melhorar para moderar um encontro com estes assuntos do que Álvaro Atallah, diretor Científico da Associação e do Centro Cochrane Brasil. “Ele é quem mais se identifica um Cochrane, tanto quanto os escoceses [que fundaram] essa iniciativa brilhante. Neste momento de incertezas e dificuldades que nos cercam, é importante que se resguarde a serenidade e se respeite as ciências e melhores evidências. Sem elas, certamente não alcançaremos os melhores resultados”, introduziu.

Convidada, então, por Atallah a assumir a palavra, Edina Mariko Silva, pesquisadora do Centro Cochrane e professora Associada da Escola Paulista da Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM/Unifesp), iniciou a sua palestra abordando como se faz um bom diagnóstico de Covid-19 a partir dos testes disponíveis.

Para tanto, ela apresentou uma revisão completa do Cochrane, que teve como primeiro autor Jonathan J Deeks. “Ressaltando que essa é uma revisão viva, pois evidências não param de surgir. Todo os dias há novas publicações. Então, essa publicação está programada para ser atualizada rápida e periodicamente.”

O extenso trabalho fez busca nos principais bancos de dados disponíveis, como o Pubmed, sem restrição de idiomas, até o dia 27 de abril. Ao todo, foram captadas 10.965 referências. Dessas, a equipe descartou 9.535 que não tratavam de exames e avaliaram o resumo de outros 1.430.

“A partir daí, foram selecionados 266 artigos com potencial de inclusão na revisão. Depois, houve uma avaliação na íntegra dos documentos, excluindo 172. Ao fim, 54 estudos ficaram para a revisão”, detalhou Edina. Ao todo, os materiais que foram avaliados tratam dos casos de 15.976 participantes (dos quais 8.526 tiveram Covid-19). A maioria dos artigos é asiática, vindos particularmente da China.

Avaliando os diferentes testes sorológicos acerca da sensibilidade (probabilidade de dar positivo no indivíduo doente), os pesquisadores viram que os resultados são problemáticos na primeira semana de infecção, com uma taxa de 30,1%. “Essa sensibilidade baixa traz muitos falsos negativos. Na segunda semana de infecção por Sars-Cov-2, a sensibilidade já aumenta para 72,2%. Na terceira semana, ela é considerada muito boa: a taxa é de 91,4%. Na quarta semana de infecção, sobe para 96%”, listou a especialista.

Por outro lado, segundo Edina, a especificidade dos testes (probabilidade de dar negativo no indivíduo sadio) é alta em todas as fases da infecção, com uma taxa de 98,7%. “Desta forma, os exames são úteis se o teste molecular der negativo em pacientes internados na evolução após duas semanas. Se for para avaliar a resposta imune de um infectado, são mais úteis se aplicados após mais de 15 dias do início dos sintomas.”

Por fim, a professora ressaltou que não há, ainda, evidências da persistência de anticorpos após 35 dias de infecção. Por isso, ainda é desconhecida a eficácia dos testes sorológicos para fazer estudos populacionais.

Debate
Após a palestra, os especialistas discutiram os temas apresentados e debateram os assuntos trazidos pelos espectadores. Um deles, por exemplo, foi o uso de escores em casos de Covid-19. José Luiz Gomes do Amaral destacou que essas ferramentas para estimar a doença de prevalência na população são importantes, mas levantou a dúvida sobre a aplicabilidade dos escores no momento de tratar um paciente individualmente.

“A maioria dos cirurgiões não toma mais decisões clinicamente, mas com exames. O Brasil, se formos ver, não tem tomografia em todos os serviços, por isso existe, por exemplo, o escore de alvarado [para determinar se opera ou não apendicite]. O problema é que muitos escores não foram validados na população. Eles são feitos nos Estados Unidos, com uma população branca, e de repente os aplicam na população brasileira, miscigenada, mas será que vale para o nosso meio? Teríamos que validar”, refletiu Edina.

Álvaro Atallah, provocado por um espectador, trouxe um debate sobre o processo científico do Centro Cochrane. Segundo a pergunta da plateia, as revisões sempre “detonam” os artigos e fazem parecer que nenhuma terapêutica serve. O diretor do Cochrane, então, relatou uma experiência que o fez refletir sobre isso. Há alguns anos, ele, ao traduzir alguns resumos, percebeu que os resultados eram mesmo sempre negativos. De modo que ele resolveu sortear 1.200 revisões e analisá-las.

“Para cerca de 10%, tinha certeza que [o objeto de estudo] era bobagem, não devia mais ser feito. Em cerca de 40% era possível acreditar um pouco, com evidências de nível três, por exemplo. Já outros 40% não tinham nenhum ensaio clínico. E somente uns 5% dos trabalhos não tinham dúvidas que determinada prática realmente funcionava”, lembrou Atallah, que completou: “Tudo vai depender dos estudos primários”.

O presidente da Associação Paulista de Medicina também participou desta conversa. Ele relatou que quando os médicos percebem que fazem tantas práticas não associadas a evidências sólidas, se perguntam se devem parar tudo e se dedicar a outras atividades. “Penso que esta informação que a Medicina Baseada em Evidências nos traz remete a um momento fundamental da Medicina. Ela nos diz: em primeiro lugar, não fazer mal. Quando decidimos realizar algum tipo de intervenção que não está associada a evidências fortes, precisamos lembrar do primum non nocere [primeiro, não prejudicar]”, afirmou.

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