Gilberto Luiz do Amaral – “Proposta surgiu como aumento da carga tributária”

Especialista comenta PL 3.887/20 e fala sobre as necessidades do Brasil além de uma reforma via Constituição Federal

Entrevistas

Em 1992, com o objetivo de congregar estudiosos das ciências jurídica, contábil, social e econômica, nasceu o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT). Naquela década, o Brasil vivenciava grande debate sobre a racionalização do impacto dos tributos na atividade empresarial e na vida dos cidadãos, e a entidade passou a difundir diversos estudos e serviços orientados ao planejamento tributário.

Desde então, o IBPT se dedica a análises e pesquisas do nosso complexo sistema tributário, sendo reconhecido por adotar uma linguagem clara e precisa para comunicar à sociedade uma realidade que pode soar, por vezes, complicada. Nesta edição da Revista da APM, um dos líderes do Instituto – hoje referência na criação de estratégias de mercado para empresas e entidades setoriais – é o nosso entrevistado: o presidente do Conselho Superior e Head de Estudos do IBPT, Gilberto Luiz do Amaral.

Advogado tributarista, contador e professor de pós-graduação em governança, planejamento e direito tributário, além de sua atuação no IBPT, é sócio da Amaral, Yazbek Advogados e do Empresômetro Inteligência de Mercado. Ele apresenta a sua visão, por exemplo, sobre as propostas de reforma tributária que têm sido veiculadas no Brasil nos últimos meses, especialmente o Projeto de Lei 3.887, que substitui o PIS e a Cofins pela Contribuição Sobre Bens e Serviços (CBS).

A proposta tem repercutido na classe médica por representar aumento da carga tributária, que poderia resultar em encarecimento do serviço para a população e fechamento de clínicas profissionais. Amaral também comenta o Simplifica Já, reformas fiscais e administrativas, a carga de tributos para o setor da Saúde e o trabalho do IBPT. Confira a seguir.

Como analisa o Projeto de Lei 3.887/2020, que institui a CBS?
É um bom primeiro passo para uma reforma tributária? Sou totalmente contrário à proposta de instituição da CBS. Não por sua ideia de simplificação, mas pela enorme carga tributária que trará. Foi feita uma calibragem de alíquotas muito alta [estima-se que será de 12%], prejudicando, sobretudo, o setor de Serviços, que envolve Saúde, Educação e outros profissionais. Isso porque mesmo que se permita o crédito de insumos, o maior insumo de uma prestadora de serviço é a mão de obra, o que não gera crédito. Isso impactará fortemente o setor. Principalmente porque acaba com o sistema cumulativo do PIS/Cofins, que hoje é uma garantia para os Serviços. Penso, então, que a proposta surgiu somente como um aumento da carga tributária.

Conhece a proposta do Simplifica Já?
O que acha dessa ideia para o sistema tributário brasileiro? Conheço. É uma proposta interessante. Precisamos fazer, antes de uma reforma tributária, uma simplificação do sistema. Necessitamos eliminar um monte de burocracias e compilar toda a legislação tributária. Desta forma, a gente pode preparar o País para uma reforma tributária mais ampla. Então, creio que o Simplifica Já tem suas inovações, apesar de também ter algumas imperfeições – que serão melhoradas caso a proposta consiga caminhar.

De maneira geral, como seria uma reforma tributária ideal para o País, a seu ver?
Nesse momento, não precisamos de uma reforma tributária constitucional. Ou seja, não precisamos fazer fusão de tributos ou mexer na questão da participação de estados e municípios na arrecadação. A grande reforma tributária que temos que fazer é, justamente, esse enxugamento do sistema. Reduzir o conjunto de legislações e burocracias desnecessárias, clarificando o funcionamento para que população e empresários possam entender a lógica do sistema tributário. Depois, se necessário, fazemos uma reforma. Entendo que o poder Judiciário – e o Supremo Tribunal Federal, em especial – já parametrizou uma série de regras da lógica do modelo atual. Fazer uma mudança nisso, além de provocar a perda de todo esse tempo do sistema tributário nacional contido na Constituição Federal de 1988, também gera risco muito grande para o contribuinte. Porque o setor público sempre quer fazer uma modificação da legislação de tributos gerando uma carga maior. Neste momento, então, sou contrário a uma reforma tributária constitucional.

Pensa que o País poderia se beneficiar de uma reforma administrativa antes de uma reforma tributária?
Uma reforma administrativa é importante. Sendo mais amplo, digo até que uma reforma fiscal deve preceder uma reforma tributária. Nessa reformulação fiscal estaria inserida a reforma administrativa. Precisamos definir melhor o papel dos entes federativos, a distribuição e permissão de gastos públicos e analisar a questão no âmbito do custo do setor administrativo para a máquina pública. Elas [as reformas fiscal e administrativa] são imprescindíveis para que, no futuro, caso o País entenda ser necessário, se faça realmente uma reforma tributária.

Entende que a tributação na área da Saúde é ideal, seja para profissionais e instituições ou para a população que consome esses serviços tão vitais?
Entendo que a carga tributária sobre o setor da Saúde ainda seja elevada. A área paga uma carga tributária embutida no preço dos insumos, que são indispensáveis para a realização das atividades, e acaba não tendo crédito por eles. O que temos que fazer é baratear todos os insumos do setor, principalmente os que vão para hospitais, clínicas e laboratórios. De modo que o custo do serviço fique mais acessível para toda a população e para todos os atores que atuam nesse importante segmento da sociedade brasileira – incluindo aí operadoras e demais serviços que facilitam o acesso da população aos sistemas público e privado de Saúde.

Pode comentar sobre o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação e o trabalho que a instituição desenvolve?
O IBPT está completando, em 2021, 29 anos de atividade com uma folha de serviços muito importante para o País – através de seus estudos sobre carga tributária brasileira, carga tributária sobre bens e serviços, dias trabalhados para pagar impostos e projetos sócio-tecnológicos, como o impostômetro e o [aplicativo] Citizen, a calculadora de impostos do contribuinte. Isso coloca o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação como a principal instituição na formulação de estudos medindo a carga tributária nacional e o impacto no bolso do consumidor e no custo da realização de negócios. Estamos muito felizes pelo que atingimos nesses 29 anos e estamos ampliando nossa atuação, de olho no mercado, consolidando cada vez mais nossas iniciativas. A partir de 2021, passamos a medir a inflação na população brasileira.

Publicada na edição 727 – jul/ago de 2021 da Revista da APM
Fotos: Divulgação