O Decreto 64.880, do Governo do Estado de São Paulo, e a Resolução nº 32, da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo, ambos de 20 de março de 2020, estabeleceram novas normas a serem seguidas pelo médico para o preenchimento da declaração de óbito durante a pandemia do novo Coronavírus (Covid-19).
“A principal delas é que não serão realizadas autópsias por morte natural e de causa desconhecida [no estado de São Paulo]. Ou seja, o corpo não deve ser e não será encaminhado ao serviço de verificação de óbito”, destaca o diretor Social da Associação Paulista de Medicina, Renato Azevedo Junior, ao pontuar as mudanças no questionário.
“A autópsia verbal [fornecida por familiares] entra como uma alternativa viável [ainda que para quadro sindrômico]. Embora seja um instrumento imperfeito, ajuda na determinação de causa do óbito. No entanto, para os casos que já vinham sendo acompanhados pelos médicos, continua sendo papel do especialista atestar o óbito, colocando as causas básicas – desde quando iniciou o processo -, passando pelas intermediárias e pela imediata que resultou no falecimento”, informa Ana Luiz Bierrenbach, epidemiologista que explica em videoaula, em nome da Secretaria Estadual da Saúde de São Paulo, o preenchimento da autópsia verbal.
As mortes não-naturais, com suspeitas de causas violentas, ficarão a cargo das autoridades policiais e do Instituto Médico Legal (IML).
Nos casos de óbito por Covid-19, a Declaração de Óbito deverá ser preenchida pelo médico que assistiu o paciente, segundo as diretrizes do Código de Ética Médica e as orientações das autoridades de saúde e sanitária.
Passo a passo
O diretor da APM pontua quatro importantes passos para o preenchimento do documento, explicitados abaixo.
Em primeiro lugar, nos casos de óbitos confirmados laboratorialmente por Covid-19, o médico deve preencher a declaração como uma morte bem definida, anotando explicitamente como causa terminal a síndrome respiratória aguda grave e como doença básica infecção por coronavírus ou Covid-19. Na primeira linha do bloco V, item 1, o médico deverá escrever síndrome respiratória aguda grave ou doença respiratória aguda e na segunda linha, infecção por coronavírus ou simplesmente Covid-19.
Para um paciente confirmado para Covid- 19 que evoluiu com miocardite e choque cardiogênico, por exemplo, a declaração deverá conter choque cardiogênico, miocardite viral e Covid-19, nesta ordem. Muito importante também é que o médico deve anotar no item II as comorbidades existentes, tais como diabetes mellitus, hipertensão arterial, doença pulmonar obstrutiva crônica, doença coronariana e outras doenças associadas.
O segundo ponto diz respeito aos óbitos com suspeita clínica do vírus sem confirmação diagnóstica. “Deve ser colhido swab nasal (nas duas narinas) e na orofaringe post-mortem, até 24 horas após o óbito, caso não tenha sido colhido em vida. Nestes casos, deve ser preenchido “a declaração como síndrome respiratória aguda grave e, a seguir, aguarda exames”, esclarece Renato Azevedo, que também é vice-presidente da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp).
Em casos de morte sem suspeita clínica do novo Coronavírus, em que o médico conhece a doença preexistente, ou que pelas informações do prontuário ou da família é possível estabelecer um diagnóstico, deve constar morte bem definida. “Por exemplo, para paciente sem suspeita de Covid-19, sabidamente com doença coronariana [por conhecimento prévio do médico, ou por anotações em prontuário] que tem morte súbita, o médico pode preencher a declaração como fibrilação ventricular, infarto agudo do miocárdio”, esclarece o diretor da APM.
No quarto ponto, Azevedo destaca que quando as informações disponíveis não permitem a definição da causa de falecimento, mas não há suspeita clínica de Covid-19, a declaração de óbito deve ser preenchida pelo médico que assistiu o paciente E deve ser preenchido o questionário da autópsia verbal. Assim, na declaração de óbito deve constar ‘informações coletadas da autópsia verbal’.
O vice-presidente da Socesp ainda reforça que o médico nunca deve esquecer de escrever as comorbidades existentes no item II. E reafirma que nenhum caso deve ser encaminhado para autópsia nos SVOs. “Evitem ao máximo colocar morte indeterminada ou indefinida, conversem com os familiares, procurem informações no prontuário. Se mesmo assim não for possível determinar a causa mortis, preencha com o quadro sindrômico e aplique o questionário de autópsia verbal. Por último, nunca deixem de usar equipamentos de proteção individual, que devem ser fornecidos pela instituição em que o médico trabalha”, reitera.
Legislação
A declaração de óbito fornece dados para a saúde pública e é fundamental para o diagnóstico epidemiológico e planejamento de políticas sanitárias, obedecendo as diretrizes estabelecidas pelo Conselho Federal de Medicina e também o Código de Ética Médica, nos seus artigos 21, 83 e 84:
Capítulo III
RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL
É vedado ao médico:
Art. 21. Deixar de colaborar com as autoridades sanitárias ou infringir a legislação pertinente.
Capítulo X
DOCUMENTOS MÉDICOS
É vedado ao médico:
Art. 83. Atestar óbito quando não o tenha verificado pessoalmente, ou quando não tenha prestado assistência ao paciente, salvo, no último caso, se o fizer como plantonista, médico substituto ou em caso de necropsia e verificação médico-legal.
Art. 84. Deixar de atestar óbito de paciente ao qual vinha prestando assistência, exceto quando houver indícios de morte violenta.