Ruy Salvari Baumer formou-se em Administração pela PUC de Campinas e possui pós-graduação em Gestão de Negócios. Além de presidente de uma empresa que fabrica equipamentos de última geração para a área da Saúde, é diretor titular do Comitê da Cadeia Produtiva da Saúde e Biotecnologia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (ComSaúde/Fiesp) – criado para ampliar a comunicação com representantes de todas as áreas da Saúde. Para ele, que quer uma aproximação cada vez maior com a Associação Paulista de Medicina, nada melhor do que conversar com o médico, que está lá na ponta atendendo o paciente, para dizer qual seria o modelo assistencial mais adequado.
Qual a relevância da Saúde para o PIB do País?
Atualmente, representa 9,5% do PIB brasileiro, sendo o maior volume de recursos em um setor no País. Com relação aos anseios da população, nas pesquisas que são feitas, geralmente a Saúde aparece como tópico 1 ou 2 na ordem de expectativas, seja pela importância que tem ou pelas necessidades de melhorias nos serviços.
Quanto a Saúde perde em média por conta da corrupção?
É difícil ter um número exato, pois o crime está presente em todo processo brasileiro. Posso acrescentar que a ineficiência e a burocracia também proporcionam perdas enormes para a área da Saúde, diria até em torno de 30% a 35%. Quando juntamos corrupção e incompetência administrativa, não sei precisar, mas chutarei que representam meio a meio dos prejuízos.
Como trabalhar a cultura do desperdício na Saúde?
O que sempre propomos é que exista um entendimento comum, de como cada uma dessas partes deve participar do bolo, em vez de cada um cuidar do seu pedaço, porque as verbas são finitas. Isso significa conseguir mais resultado com os mesmos recursos, e a simplificação do sistema – diminuindo a burocracia sem perder segurança. Internamente, o setor precisa discutir as melhores maneiras de remuneração, de distribuição de recursos, de modelos de atendimento e de melhoria da eficiência interna.
Qual seria o modelo mais próximo do ideal para a Saúde do Brasil?
Existe um conjunto de exemplos que podem ser usados, dependendo da situação. O que propomos e trabalhamos são melhorias específicas para cada tipo de público, de cultura e de atendimento. Hoje, por exemplo, entendemos que o médico recebe pela entrega do resultado, não porque fez alguma coisa. Segundo, é fundamental ter o acompanhamento da população com o seu clínico geral, para melhor serviço prestado em atendimento básico. Por fim, organizar o sistema público e privado de atendimento por níveis, desde a porta de entrada até a alta complexidade, é necessário para que os usuários não dependam apenas de um hospital central. Poucos são os países que têm um sistema único que atenda 100% da população.
E os elementos fundamentais a esse modelo ideal?
Primeiro, ter como referência aqueles lugares onde a política de Saúde é tomada como uma meta pelos governantes, e que essas experiências boas continuam, independentemente de quem está no governo. Isso é o que transforma a Saúde em política de Estado, e não em política de governo. Em segundo, é preciso estimular a distribuição de recursos para os locais onde o sistema funciona. Em terceiro, precisamos de bons gestores, com capacidade para fazer a administração do sistema.
“Não podemos entender que o sistema depende de quem ocupa o cargo naquele momento. Tem de ser um programa que seja mantido e melhorado”
Acredita que já atingimos o ponto, ao menos no campo de decisões públicas, de enxergar a Saúde como política de Estado? Se não, como podemos chegar lá?
Ainda não, é um dos trabalhos mais desafiantes. Essa questão não se refere apenas à esfera federal, mas aos governos estaduais e municipais. Não podemos entender que o sistema depende de quem ocupa o cargo naquele momento. Tem de ser um programa que, a cada novo representante, seja mantido e melhorado. Isso faz parte de uma mudança de cultura, ainda fraca no Brasil, que ocorrerá com a cobrança por parte da população. Temos de fazer a nossa parte de reivindicar o programa proposto para a Saúde. O brasileiro cobra muito pouco.
Acha que chegaremos ao ponto de encarar a Saúde como um direito?
Temos de entender que a área é um direito, mas também um dever. Ou seja, cabe ao cidadão ser responsável pela própria saúde. Quando temos essa consciência, diminuímos a possibilidade de ter problemas maiores no futuro. Afinal, o foco no mundo hoje é trabalhar mais a prevenção do que a correção.
As entidades médicas e vários atores do setor sustentam que a Saúde padece de subfinanciamento. O que pensa sobre isso?
Há sempre uma discussão de que falta verba ou gestão para a Saúde. Na minha opinião, faltam os dois. O subfinanciamento da Saúde não é um caso exclusivo do Brasil, mas do mundo inteiro. Se compararmos o investimento per capita com outros países muito menores, o Brasil aplica muito pouco em Saúde. Na outra ponta, o que faz você ter mais ou menos resultados com o recurso disponível é a gestão. Melhor gestão aumenta a eficiência, atende mais com menos verba, evita corrupção e perdas.
De que maneira o ComSaúde e os demais agentes do setor podem colaborar para uma mudança de cultura na Saúde?
O principal fator da nossa existência é unir todos os participantes para discutir propostas comuns, ou seja, fomentar a interlocução do setor. Ajudá-los a alcançar os objetivos com relação ao Governo e à busca por recursos. Internamente, colaborar com a ampliação do diálogo entre todos os atores envolvidos na discussão, seja para terem uma boa convivência ou para atingirem um resultado de ganha/ganha, oferecendo um serviço de saúde melhor.
O que o ComSaúde tem feito de prático para mudar a realidade do setor?
Temos vários focos de trabalho. O primeiro, já citado, é fazer os representantes da Saúde conversarem entre si. O segundo é trabalhar em relação às propostas de melhorias nas políticas existentes, legislação, parte regulatória e econômica. No terceiro ponto, temos atuado próximo às universidades, centros de pesquisa, hospitais e empresas, para acelerar a inovação no Brasil. Além disso, incentivamos a promoção de tecnologia médica, seja levando conhecimento nosso para fora ou trazendo empresas estrangeiras para criar parcerias com as brasileiras.
Como a APM e o ComSaúde podem unir forças em prol de uma assistência digna?
A Associação precisa ficar ainda mais próxima do Comitê para, juntos, levarmos propostas de melhorias para o sistema. Nada melhor do que conversar com o médico, que está lá na ponta atendendo o paciente, para dizer qual seria o modelo assistencial mais adequado. Os outros profissionais da Saúde também precisam se aproximar mais de nós.
RAIO-X
PROFISSÃO – Administrador de empresas
ESPECIALIZAÇÃO – Gestão de Negócios
OCUPAÇÃO ATUAL – Diretor titular do Comitê da Cadeia Produtiva da Saúde e Biotecnologia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo – ComSaúde/Fiesp
Matéria Publicada na Revista da APM – Edição 695 – dezembro 2017