Wilson Pollara – Por uma Saúde mais acessível em São Paulo

Desde janeiro, o médico graduado pela FMUSP e ex-presidente do Colégio Internacional de Cirurgiões encara o desafio de melhorar a assistência aos paulistanos

Entrevistas

Desde 1998, Wilson Modesto Pollara exerce cargos administrativos na Saúde, como a coordenação geral de Cirurgia no Instituto do Câncer do Estado de São Paulo, a direção executiva do Instituto Central do Hospital das Clínicas da FMUSP e a participação no Conselho Gestor dos Hospitais Camilianos de São Paulo. Na posição de secretário municipal de Saúde da nova administração da capital paulista, enxerga problemas no Sistema Único de Saúde (SUS). Nesta conversa com a Revista da APM, Pollara fala sobre como a sua gestão está tratando as dificuldades de oferecer atendimento de qualidade aos munícipes, as ações para controlar e enfrentar arboviroses, a distribuição de remédios em São Paulo e, entre outros temas, a situação difícil dos hospitais locais. Confira:

Com o que a atual gestão se deparou ao assumir a Secretaria? E quais foram as primeiras ações adotadas?

  Encontramos os problemas crônicos do SUS: filas de espera para exames, pacientes aguardando mais de um ano, farmácias sem remédios e pessoas sem vagas em hospitais. Começamos a atacar pontualmente as coisas. Primeiro, foram os exames – uma campanha do prefeito. Foi feito o Corujão da Saúde para os exames, que tinha um prazo de 90 dias. Em 80, conseguimos zerar a fila, com a ajuda de 45 hospitais particulares, que fizeram exames a preço da Tabela SUS. Edson Hatakeyama Já os remédios, em setembro passado a gestão anterior parou de comprá-los, com os itens ficando em falta nas farmácias. Reportagens nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) mostraram pessoas sem remédios.

Agora, 95% das farmácias estão abastecidas. Temos um site chamado “Aqui tem remédio”, no qual a pessoa pode ver onde está o remédio que ela precisa, seja em uma farmácia popular ou em uma UBS. Conseguimos isso por meio da melhoria da logística. Mudamos a entrega, de caminhões grandes uma vez por mês para veículos pequenos, que rapidamente fazem entregas diárias. Mudamos a situação para o munícipe.
  Agora, estamos começando a questão do Corujão das Cirurgias. Um hospital de cada uma das cinco regiões da cidade irá se dedicar às cirurgias. Serão 1.700 procedimentos, que levarão aproximadamente cinco semanas, dia e noite. Primeiro, deverão ser realizadas cirurgias gerais e ginecológicas com internação. Em seguida, cirurgias ambulatoriais sem internação. Depois, urológicas que precisam de um equipamento específico que nem todos os hospitais possuem. Por fim, as cirurgias ortopédicas, pois precisamos negociar com fornecedores as próteses metálicas, que são caras. Os hospitais serão públicos, que têm um grande ente por trás.

A entrega gratuita de remédios em farmácias privadas que o senhor pretendia foi iniciada?

  Nosso objetivo era colocar os remédios adequados nas farmácias e informar a rede privada que o paciente retiraria. Mas os conselhos e sindicatos farmacêuticos apresentaram resistências. Eles encararam isso como privatização do SUS. Decidimos não enfrentar, pois a população estava sem remédios e a discussão poderia durar meses. Então, passamos a usar as farmácias populares para distribuir. Não há a intenção de enfrentamento político, deixando a população em risco, sem medicação. Vamos esperar para tentar discutir isso novamente. Essa parceria seria o melhor caminho. A logística é muito cara, gastamos demais fazendo os remédios chegarem à população. Compramos eles mais baratos, sim, mas a fortuna é para levá-los aos pacientes.

Quais as maiores dificuldades que a sua gestão encontra para sanar os problemas?

  A maior dificuldade é estrutural – não a de criar leitos e construir hospitais, mas a estrutura logística. De como o paciente tem que se mover dentro da rede. As pessoas não são informadas como deveriam sobre a maneira adequada de se transferir para o atendimento. Na UBS, por exemplo, teremos agora três funções. A unidade será responsável por uma população e irá informar as necessidades dela. A partir disso, criamos uma ação de acordo com as demandas. E os agentes comunitários informarão onde cada pessoa deve ser atendida, para cada doença.

“Os médicos muitas vezes são culpados por situações que não são responsabilidade deles”

O que os médicos podem esperar da sua administração?

  Eu, como médico, quero dar condições boas de trabalho para estes profissionais. Os médicos muitas vezes são culpados por situações que não são responsabilidade deles. Eles têm de ter estrutura adequada para poder trabalhar. A minha obrigação é, justamente, criar um ambiente adequado para os médicos exercerem sua profissão, com materiais, recursos tecnológicos e cada paciente no lugar correto. Não vou colocar um paciente grave na frente de um médico em um local em que ele não tenha condições tecnológicas de atender. Esse é o grande sofrimento do médico. Ele sabe o que tem que fazer, mas muitas vezes não consegue, pois o local de trabalho não tem as condições necessárias. O erro é colocar o paciente naquele local. Já temos 712 médicos concursados sendo convocados. Além disso, também programamos a contratação de mais 800.

Como é a relação da administração municipal com o governo do estado e com a União para organizar ações de saúde complementares e não redundantes para a população de São Paulo?

  Nunca tivemos em um período tão bom. Lembrando que eu era secretário- adjunto do David Uip [atual secretário Estadual da Saúde de São Paulo]. Temos uma integração perfeita com o estado. Da mesma forma, o ministro da Saúde, Ricardo Barros, é uma pessoa muito pragmática e prática. Ele está fazendo uma gestão muito benéfica e profícua no Ministério da Saúde e está muito perto de todos nós, de tal forma que este é um período que eu nunca tinha presenciado, de muita integração entre os entes.

Observamos que os hospitais paulistanos estão sofrendo com sucessivas crises. Como enxerga essa questão?

  O problema é que os hospitais atendem mais do que estão contratados para receber. Eu contrato eles para 200 cirurgias por determinado orçamento. Eles abrem as portas para 500 pessoas e fazem os 500 procedimentos. Depois, vêm nos cobrar. O problema está na logística. Temos que dizer ao paciente onde ele deve ir e onde estão os recursos para o atender. Outra coisa: não podemos continuar com o desperdício. Muitas vezes o hospital não utiliza a capacidade instalada do local, de tal forma que o orçamento que existe para sustentar aquela estrutura não chega porque não está programado, e não porque não existe. Por exemplo, se eu tenho um hospital onde a equipe de Urologia custa R$ 70 mil, mas realiza 3 cirurgias apenas, é desperdício. Temos que fazer o que está combinado e contratualizado. Se o contrato com o hospital é de 200 cirurgias, a Secretaria irá pagar 200. Isso tem acontecido com a Santa Casa, o Hospital São Paulo etc. O doente tem que ir a uma UBS, que irá ligar para a regulação e, aí sim, dizer onde há recurso e para onde o paciente deve ir.

E como está organizada a Estratégia Saúde da Família e a atenção básica em São Paulo?

  Hoje, temos 455 UBSs na cidade. Destas, 280 atuam no modelo Estratégia Saúde da Família. As demais funcionam no modelo tradicional, com pediatra, ginecologista e clínico geral. Estamos realizando o complemento dessa cobertura primária para toda a população dependente do SUS (que exclui quem tem convênio médico). Hoje, 68% dessas pessoas estão cobertas. O plano é fazer com que o número chegue a 100%, tanto trocando o modelo das UBSs para os novos como aumentando as unidades.

Em termos de doenças como dengue, zika, chikungunya e febre amarela, como a Secretaria está atuando para diminuir o risco de proliferação e epidemias?

  A única estratégia é o combate ao mosquito. Hoje, tivemos controle quase total de todas elas, independente de vacinas no município. Então, estamos visitando quase todas as residências da cidade, fazemos campanha e deixando as pessoas conscientes. O mosquito não pode nascer, temos que ir ao criadouro. Tem que colocar tela na janela, utilizar a raquete etc. A população aderiu às informações que passamos e houve um ótimo resultado. Em 2015, foram 115 mil casos de dengue e, em 2016, 16 mil. Já neste ano, foram 300 casos. Em agosto e setembro devemos voltar a incentivar as campanhas. O trabalho tem de ser feito antes do verão e das chuvas, antes das larvas se formarem.

Entrevista publicada na Revista da APM – edição 689 – junho 2017
Fotos: Edson Hatakeyama