Na última quarta-feira, 8 de junho, a Associação Paulista de Medicina sediou mais uma edição da Tertúlia Acadêmica da Academia de Medicina de São Paulo. O evento teve palestra sobre o tema “O Associativismo Médico e o Exercício da Medicina no Brasil – Rumos e Perspectivas”, pelo presidente da Associação Médica Brasileira, César Eduardo Fernandes, de forma híbrida, com convidados participando presencial e virtualmente.
Fernandes recorda que se viu diante de um dilema ao ser convidado para participar da tertúlia: trazer um tema confortável e recorrente de sua rotina ou discorrer sobre uma questão desafiadora, contudo interessante, para a classe médica? Neste sentido, conta que escolheu a segunda opção, indicando a necessidade de se discutir sobre a situação atual em que a profissão e o associativismo médico se encontram, relembrando o seu contexto histórico e pontuando as principais perspectivas para o futuro.
“É sempre válido relembrar de onde a gente veio e para onde a gente vai. Em 1829, houve o surgimento da primeira sociedade médica, que tinha como objetivo debater assuntos relacionados à saúde e à doença. Era a Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro, mas ainda não se falava sobre o exercício profissional, isso foi sendo incorporado com o tempo. A situação passou a mudar a partir do final da década de 1920, com o surgimento do Sindicato Médico Brasileiro, também no Rio de Janeiro, no intuito de combater pessoas que exerciam a Medicina indevidamente e sem embasamento, os chamados charlatães do ofício”, explicou.
Foi diante deste cenário que médicos paulistas e de outras capitais ao redor do País passaram a criar seus próprios sindicatos, voltados, majoritariamente, para questões políticas focadas nos interesses da profissão. De acordo com o presidente da AMB, o advento da Associação Paulista de Medicina foi um pontapé para a ascensão do associativismo médico, especialmente quando a instituição passou a ganhar alcance estadual e não apenas municipal.
Associativismo médico na atualidade
Dentro deste contexto, o palestrante destacou a história da instituição a qual preside, a Associação Médica Brasileira. A fundação da AMB ocorreu em 1951, a fim de defender o exercício da Medicina e realizar um resguardo para que, desde aquele momento, a população brasileira pudesse contar com uma assistência de qualidade no setor de Saúde.
“A formação da AMB foi realizada por Jairo Ramos, em conjunto de Alípio Neto e Hilton Rocha. Juntos, eles realizaram o aperfeiçoamento da cultura científica e contribuíram para a promoção da solução de problemas sociais. Em janeiro de 1952, a AMB lançou o órgão informativo social, chamado Boletim da AMB (BAMB), publicado pela primeira vez pela Revista da APM, demonstrando que sempre houve um vínculo histórico entre as entidades”, recapitulou.
No entanto, apesar da força das sociedades médicas, atualmente o associativismo está enfraquecido e fragmentado. César Fernandes destacou que cada sociedade médica vive sua própria realidade, imaginando que não há necessidade de integração. Conforme enfatizou, tal fragmentação tende a ser destrutiva, de modo que é fundamental ter grandes lideranças que contribuam na luta para reverter uma situação que é altamente preocupante.
Outro fator que aflige o âmbito do associativismo médico é a baixa adesão de médicos associados – que vem diminuindo ano após ano. Além disso, o desinteresse do jovem médico em participar do movimento, visto que a média etária de médicos associados no Brasil é de 50 anos, também representa um grande problema em relação à comunicação com os recém-formados.
Durante a apresentação, um dos principais questionamentos foi em relação a como chamar a atenção destes jovens médicos e trazê-los para a participação associativa. Conforme o palestrante indicou, é necessário entender suas aflições e necessidades, para assim ser capaz de conversar com eles e trazer suas participações para o campo em discussão.
“Nós temos um modelo de adesão associativa ultrapassada e precisamos modernizá-lo a ponto de trazer o jovem médico de novo com a gente. Infelizmente, esse jovem médico não tem noção do trabalho feito em prol dele, desconhecendo a importância e o impacto da representação associativa na defesa dos interesses da classe médica. Por isso, nós temos que encontrar uma maneira de falar com eles e trazê-los para o movimento associativo, uma vez que futuro deste movimento está em suas mãos”, detalhou.
Ações da AMB
Dentre os principais destaques da palestra, Fernandes salientou a importância da Associação Médica Brasileira e de suas Federadas para o movimento associativo atual. A AMB é responsável por defender o interesse dos médicos no mercado de trabalho através de sua Defesa Profissional; se preocupa com uma formação de qualidade, realizando uma fiscalização rigorosa de faculdades de Medicina; cria projetos de diretrizes que auxiliam a orientação das práticas clínicas; agrega um Departamento Científico que conta com 54 Sociedades de Especialidade; além de ser a responsável pela emissão de títulos de especialista, conforme indicado pela Lei nº 8.516/15.
Ademais, a AMB possui o Núcleo de Atuação Parlamentar, em Brasília, que visa à interação com parlamentares e autoridades, monitorando diariamente o que acontece na Câmara e Senado, contando com assessoria, advogados e uma sede própria. Também há o Núcleo de Proteção ao Médico, que fornece assessoria jurídica e consultoria de comunicação para todas as especialidades que se sintam invadidas. O presidente da entidade destaca que tais ações são trabalhos para que o associativismo volte a ganhar força e reconhecimento.
“Pesquisas de dois anos atrás apontam que havia cerca de 500 mil médicos no Brasil. Então, não nos falta médicos, o que nos falta é qualificação e redistribuição desses profissionais pelo País. Desta forma, nós criamos o Progeb, que visa à criação de cursos para o médico generalista, trazendo todas as sociedades de especialidades para dar aulas nestes programas e despertar o interesse não apenas na especialização médica, mas na importância da adesão associativa”, explicou.
A reunião foi concluída com César Fernandes frisando a necessidade de haver um exame obrigatório de proficiência para os médicos, além de um controle rigoroso de programas de residência em Medicina. “Precisamos integrar o médico jovem e interagir fortemente com a sociedade civil. Aumentar a representatividade junto à população e às instâncias governamentais. Atualmente, a AMB conta com apenas 6% da participação de médicos ao redor do Brasil e esse é um problema de todos nós. Por isso, temos que nos unir para uma maior e melhor execução da Medicina em prol da população brasileira”, encerrou.
O responsável pelo fechamento do encontro foi o presidente da APM e da AMSP, José Luiz Gomes do Amaral, que participou do evento virtualmente e reforçou a necessidade de se levar a sério os desafios destacados pelo palestrante. “Precisamos ouvir os jovens para saber exatamente o que eles têm pensado. Nós já realizamos várias tentativas aqui na APM de fazer isso por diferentes caminhos. É muito difícil convencer os médicos a fazerem parte do associativismo em um momento de tanta polarização, inapropriada para conseguir algum resultado. No entanto, a discussão que tivemos aqui hoje é fundamental para nos conduzir a um bom resultado e termos os médicos unidos, pois assim seremos mais fortes e lembrados pelas atitudes que tomarmos diante desta situação de crise” concluiu.
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Fotos: Marina Bustos