A Associação Paulista de Medicina realizou, na noite da última quarta (25), mais uma edição de seu webinar. O tema escolhido para debate foi “Inteligência artificial na prática médica”, com apresentação de José Luiz Gomes do Amaral, presidente da APM, e transmissão ao vivo pelo canal da entidade no YouTube.
Moderado por Antônio Carlos Endrigo, diretor de Tecnologia de Informação da Associação, e Jefferson Gomes Fernandes, coordenador do Programa de Educação em Telemedicina e Saúde Digital, o evento contou com palestras dos especialistas Cézar Taurion, Marcelo Félix e Juliana Hasse.
“O tema é de extrema relevância, e com certeza fará parte da nossa vida no âmbito assistencial. Precisamos acompanhar todas as evoluções e impactos que estão acontecendo e ainda irão acontecer. Temos nesta reunião três ótimos especialistas, que irão abordar sobre a regulamentação, projetos de lei e posicionamento em relação à prática”, ressaltou Endrigo.
Inteligência artificial na Saúde
Iniciando as apresentações, Cézar Taurion – investidor, mentor de startups e membro do conselho de inovação de diversas empresas e associações (ABINC e AMB) – apresentou em sua exposição o tema “A inteligência artificial aplicada à Saúde”, ressaltando a importância da prática para a sociedade em geral.
“Alguns pesquisadores dizem que a inteligência artificial será tão importante quanto a eletricidade, capaz de mudar e moldar a nossa sociedade. Concordo com esse pensamento, mas precisamos ter uma visão prática e realista em relação a isso”, informou.
Taurion enfatizou que no ciclo de evolução da tecnologia, é possível reconhecer duas curvas, com características muito distintas. “Em uma das curvas, observamos muita emoção e pouca informação. Quando não temos as informações necessárias, a emoção é a parte que nos domina, criando expectativas irreais. No outro lado, a racionalidade predomina, e conseguimos ter uma visão clara de quando e como colocar em prática determinadas tecnologias.”
De acordo com ele, estamos começando a trilhar a segunda curva com a inteligência artificial, que tem nos ensinado bastante. “Embora tenha ganhado força recentemente, o termo é antigo, surgido em meados de 1950. É algo que vem se consolidando ao longo de muitas décadas, mas nos últimos anos, tivemos essa erupção e verdadeiro furor da inteligência artificial. Por duas razões práticas, a capacidade computacional imensa, recurso que não tínhamos antigamente, e pesquisas e estudos, quando finalmente começamos a perceber como
poderíamos trabalhar com algoritmos sofisticados. A AI não é inteligente, apenas exibe comportamento que parece ser inteligente.”
O especialista afirmou que é possível categorizar as distinções entre seres humanos e máquinas: os eletrônicos são bons em cálculos e reconhecimento de padrões, já os humanos se destacam na percepção, empatia, compreensão e resolução de problemas. “Se tirarmos as partes robotizadas das tarefas humanas, seria ótimo, pois nos concentraríamos no comportamento humano e, com isso, seria inevitável não perceber a real importância da IA. A prática não surgiu para substituir os médicos, mas sim para tirar o robô de dentro do médico, realizando as tarefas repetitivas e constantes, que podem ser robotizadas.”
Ainda segundo Cézar Taurion, embora tenhamos a clara percepção de que a inteligência artificial é uma ferramenta útil, também podemos ter a certeza de que não irá substituir o médico, apenas modificará a atividade. “Podemos e devemos olhar a prática médica de outra forma, pois vemos um grande impacto da inteligência artificial em diversas áreas, do maior ao menor grau”, completou.
Entre os desafios ainda enfrentados com a tecnologia, o palestrante salientou que o algoritmo gera uma interação de acordo com os dados. Por outro lado, com diferentes equipamentos, o algoritmo apresenta outro nível de resposta, levando ao desafio de identificar quais ajustes médicos estão embutidos nos algoritmos da prática. “Outro aspecto fundamental e essencial para o profissional de Medicina daqui para a frente é sua formação. É preciso entender, desde a academia até sua evolução profissional, que a tecnologia fará parte de seu dia a dia. O conhecimento da inteligência artificial é crucial para entender como o dispositivo funciona, suas potencialidades e, principalmente, suas possíveis limitações”, finalizou.
Desenvolvimento na área
Em seguida, Marcelo Félix – especialista em Radiologia, Tecnologia de Informação e inovação no segmento da Saúde – trouxe sua visão sobre o tema “O médico como protagonista do uso e do desenvolvimento da AI na Saúde”. Em sua fala, afirmou que o papel do médico na inteligência artificial é realmente crucial, pois quando se começa a estudar e entender sobre o assunto, como em toda nova tecnologia, existe um paradoxo entre o posicionamento de usuário e desenvolvedor.
Para ele, na maioria das vezes, as equipes técnicas das empresas de tecnologia que lidam com inteligência artificial usam a prática de maneira laboratorial, não levando em conta o conhecimento médico na predominância e prevalência de doenças. “O papel do clínico na implementação de AI na Saúde é de liderança, pois se um especialista com conhecimento técnico não soube liderar, a prática não dará certo”, destaca.
Ainda segundo o especialista, não sabemos qual será o papel do profissional, mas a melhor coisa que os profissionais médicos devem exercer é a Medicina. “A parte da inteligência
artificial irá virar mainstream, entretanto, quem irá fazer a gestão das novas tecnologias deve ter o conhecimento de diversas áreas da Medicina, sendo elas a clínica assistencial, pesquisa clínica, estatística clássica, aprendizado estatístico, lógica de programação e user experience”, acrescentou.
Leis e regulamentação
Finalizando as apresentações, Juliana Hasse – advogada especialista em Direito médico e de Saúde – ficou responsável por apresentar a evolução e expectativas para a regulamentação da prática na Saúde. Em sua exposição, disse que a inteligência artificial é um assunto que caminha de braços dados com a Medicina, e que não consegue ver a prática como algo não associado à área médica.
“Podemos ressaltar o conjunto da Medicina com a inteligência artificial como o uso de computadores que têm a capacidade de analisar um grande volume de dados, seguindo algoritmos definidos por especialistas capazes de propor soluções para problemas médicos. Temos um sistema informatizado, capaz de produzir e reproduzir alguns comportamentos humanos na realização de tarefas, sem a necessidade de ocupar o lugar do médico. A AI na Medicina já é uma realidade, e não podemos deixar de reconhecer que a contribuição dessas tecnologias otimiza tarefas e melhora as avaliações”, complementou.
Um dos principais tópicos citados pela especialista é o prontuário eletrônico. Aliados aos algoritmos, conseguem trazer a avaliação de uma série de itens de histórico em Saúde, identificando riscos e ajudando a formular terapias mais humanizadas, o que gera uma grande análise em comparação a imagens e suporte para diagnósticos. “Outro grande exemplo da inteligência artificial é a Telemedicina, que nada mais é do que usar a prática médica em um atendimento remoto, sendo possível a realização de diagnósticos e emissão de laudos a distância.”
A advogada também mencionou que a inteligência artificial será uma das grandes tecnologias utilizadas no setor da Saúde. “Temos um suporte muito grande no diagnóstico, sendo mais preciso, pois tem uma alta capacidade de avaliar grande volume de dados e de criar padrões seguros e menores margens de erro. Além disso, se observa redução nos custos da Saúde, otimização de resultados e direcionamento do médico para a questão de humanização junto ao paciente.”
Juliana Hasse ainda ressaltou os riscos da prática e princípios éticos estabelecidos. “É preciso levar em consideração as premissas essenciais, principalmente na questão do sigilo entre médico e paciente, algo que é sagrado na Medicina. Temos o Projeto de Lei 21/2020 em tramitação no Senado, que traz uma série de princípios, direitos, deveres e instrumentos de governança para a inteligência artificial. Apresenta em seus fundamentos essenciais o respeito aos direitos humanos e valores democráticos, igualdade, não discriminação, livre iniciativa e, principalmente, a privacidade de dados.”
Por fim, ela enfatizou que nosso grande desafio é fazer com que todas as regulamentações acompanhem os avanços vistos ao longo dos anos: “A inteligência artificial está transformando sociedades, setores econômicos e o mundo do trabalho. Esse avanço é inevitável, mas precisamos tentar trazer segurança, por isso se torna necessária e apropriada uma legislação sobre a matéria, tornando obrigatórios os princípios consagrados e disciplinando deveres e direitos”.
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